Não seja você o palhaço Dessa comédia. O brasileiro acha que tudo é engraçado, mas será que realmente ajuda sempre levar as coisas na brincadeira?



O processo vai dar em pizza, juiz Lalau, imagens sacras vestidas com roupas sensuais, vadias se masturbando com crucifixos, mensalão, petralhas, charges etc.
   Temos que acabar com isso, há uma tendência exagerada de “ludicizar” (*) o dia-a-dia. Quanto menos encaramos com seriedade os acontecimentos importantes, mais tendemos a acreditar que somos meros expectadores e que é normal achar engraçadinho o que de ruim ocorre no palco do quotidiano brasileiro. Não somos expectadores de uma comédia, na verdade, queiramos ou não, seremos sempre atores. E como atores sociais, devemos entender e transmitir os acontecimentos na sua forma original, e permitir-nos as reações adequadas para cada um deles. A ludicização é extremamente nociva e serve como um tipo de filtro que dificulta nossa percepção, impede que outras pessoas percebam nossa real indignação e torna praticamente impossível uma reação à altura do que está ocorrendo no país.

“Você leva tudo a sério!”. Quem já ouviu essa acusação?
No ano passado, em uma manifestação chamada de parada Gay, algumas imagens sagradas para a religião católica foram exibidas com vestes e poses sensuais, em volta havia muita gente sorrindo, dançarinos seminus e gente com trejeitos engraçadinhos. A intenção que se escondia por traz do ato em si obviamente era ridicularizar o cristianismo.
Se isso fosse realizado de outra forma que não a lúdica, a população católica reagiria com indignação. Porém, esse sentimento estrategicamente instigado no brasileiro, para que não reaja com seriedade ao que é imposto com “bom humor”, mais uma vez foi eficaz. Os organizadores da manifestação debocharam a seu bel prazer da religião católica, e não houve reação, por parte da justiça, dos fieis e muito menos da igreja. Todos foram ludibriados pelo lúdico.
O único que ousou reagir publicamente foi um pastor evangélico - Silas Malafaia - contra ele logo irromperam várias acusações de mal-humorado, fundamentalista, incitação ao ódio etc. O deputado Bolsonaro é outro que vez por outra reage com seriedade, é assim que deve ser.
Quando nas rodas de amigos dizemos que o processo tal, ou a CPI tal vai dar em pizza, sem que percebamos, já atenuamos em nossa mente a indignação que aquela situação nos causaria se fosse usada a maneira correta para descrever o fato. Que seria algo como: Fizeram um lobby no local tal e decidiram enganar a sociedade abafando o processo. Ou, “os envolvidos tem muita influencia e usaram o corporativismo para não sofrer as consequências dos seus atos”. Contudo, como em nossa mente foi introduzida uma única palavra – pizza - o significado real, mais amplo, se perde no simplismo, e as reações que seriam causadas também vão junto.
Sutilezas como representar casos sérios com termos engraçados ou distorcer a representação do real usando “quase-sinônimos” já vêm surtido efeito negativo-minimizador há algum tempo em nosso país. Por exemplo, trocar invasão por ocupação ou roubo por expropriação. Em uma sociedade sub-intelectualizada como a nossa esse tipo de artifício tende a ter mais êxito.
Pelo simples fato de estamos vendo “de dentro” a desconstrução que aqui fazemos pode soar como algo estranho, desnecessário. Mas DEFINITIVAMENTE não é. As categorias e significados, quando desenvolvidos corretamente na linguagem e raciocínio, são sobremaneira importantes para a condução inteligente do quotidiano de uma sociedade.
Manifestantes comandados pela esquerda usam bastante a cultura lúdica do brasileiro também para atenuar a reação dos órgãos de segurança. Quando interrompem o direito de ir-e-vir do restante da população, vandalizam ou “ocupam” alguma instituição pública, quase sempre há manifestantes aparentemente bem-humorados, com “caras pintadas”, máscaras etc. Dando a impressão de que é uma manifestação bem humorada, inteligente, “pacífica”. Contudo, quando impede o direito de ir-e-vir dos outros, ou destrói o patrimônio alheio, uma ação, seja individual, coletiva, bonitinha ou risonha, jamais poderia ser considerada pacífica.
Temos visto cada vez mais as revistas online, grupos no facebook e sites que se opõem aos desmandos ocorridos em nosso país representar fatos reprováveis por meio de charges, caricaturas engraçadas, ou textos com grande pitada de “bom” humor.
Embora a nossa cultura cada vez mais propicie isso, que chamamos aqui de sub-representação lúdica, acreditamos que na verdade é uma prática nociva e não tão inteligente quanto aparenta, acaba atenuando as próprias conclusões da sociedade e, por fim, desestimula o confronto. Quase sempre o ato de rir da "piada" se torna a única reação. Chegou a hora de representar o dia-a-dia com exatidão e seriedade, de dizer o que realmente achamos, sem rodeios e maquiagens para “doer menos”. Se você está indignado, expresse sua indignação com as palavras e gestos certos. Se isso for feito coletivamente será um grande aditivo para uma mudança real em nosso país.
Por exemplo, se você quer dizer que odeia a proteção que Dilma fornece para Nicolás Maduro, faça isso de forma bem clara, pode dizer apenas: “Eu odeio a atitude de Dilma em relação ao presidente da Venezuela”. Isso, de forma coletiva, surtirá muito mais efeito do que centenas de cartazes complicados e bem humorados postados nas redes sociais.
Enquanto estivermos representando e interpretando com bom humor as situações que deveriam gerar em nós sentimentos de grande repulsa e indignação estaremos convergindo para a falência moral de nosso país, cuja cultura imposta tem cada vez mais a propriedade de fazer com que transformemos falcatruas em comédias, atores em espectadores e malfeitores em simples palhaços, sempre nos induzindo a achar graça de nossa própria desgraça.
Robson A.D.S. Escreve para Revista Sociedade Militar - http://sociedademilitar.com.br

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