Sarney anula atos secretos, mas nomeados não perdem cargos

ANULAÇÃO SEM EFEITO IMEDIATO

Na véspera de CPI e Conselho, Sarney cancela atos secretos, mas mudanças ainda demoram

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), anunciou ontem a anulação dos 663 atos administrativos secretos baixados nos últimos 14 anos, mas a medida não terá efeito prático imediato e criará complicações administrativas e até situações embaraçosas para os senadores. A hipótese de ressarcimento de valores já pagos a servidores contratados ou promovidos por atos secretos também é quase nula.

A análise política da decisão é que Sarney pretendeu, assim, invalidar os termos da representação do PSOL contra ele no Conselho de Ética, que será instalado hoje, assim como a CPI da Petrobras, que também terá seus integrantes confirmados hoje. O PSOL pede a responsabilização de Sarney - que preside a Casa pela terceira vez - pelos atos secretos. ) - Por Maria Lima, Chico de Gois, Leila Suwwan e Adriana Vasconcelos

Levantamento feito pelo GLOBO mostra que 86% dos atos secretos referem-se a movimentação de pessoal, seja nomeação (243 atos), exoneração (104), dispensa e/ou designação (165) e alteração de cargos (56). Esses deverão ser revalidados por uma comissão, por tratarem de direitos trabalhistas já adquiridos. A triagem será feita pela comissão, que terá 30 dias para analisar cada ato secreto.

Na chegada ao Senado ontem, perguntado se determinara a anulação seguindo recomendação do Ministério Público, Sarney foi taxativo:

- Não! Foi uma decisão minha. Estava esperando concluir o levantamento de todos os atos. Agora que foi concluído, fiz a anulação. Estão todos nulos. Se vai haver devolução de dinheiro, as providências serão tomadas pela parte jurídica.

Mas a avaliação do setor jurídico da Casa é que dificilmente a anulação resultará na devolução de dinheiro recebido.

- Sarney tomou uma providência cobrada pela imprensa. Todo ato do presidente do Senado é político. Mas tem que ter respaldo jurídico - disse o 1º secretário , Heráclito Fortes (DEM-PI).

José Nery (PSOL-PA) disse que é inócua a tentativa de Sarney de tentar esvaziar a investigação no Conselho de Ética, e adiantou que o PSOL deve refazer a representação para incluir novas denúncias. Por exemplo, se Sarney mentiu ao dizer que nada tem a ver com a Fundação José Sarney e supostos desvios de recursos da Petrobras, além de suposta conta não declarada no exterior.

- O fato de cancelar os efeitos dos atos não o exime de participação ou envolvimento no crime - disse Nery.

- Factoide é uma maneira elegante de dizer o que significa o ato do presidente Sarney. Fica parecendo não anulação, mas embromação - criticou Cristovam Buarque (PDT-DF).

- Essa tentativa de conserto não apaga o crime cometido - disse Demóstenes Torres (DEM-GO).

Os outros 14% dos atos secretos tratam de liberação da hora extra até o valor da concessão do restaurante do Senado. São 16 os atos dedicados à criação de comissões, sem contar os que as prorrogam, modificam sua composição ou as tornam permanentes. Com a anulação, algumas podem deixar de existir, mas dificilmente serão recuperadas gratificações.

A anulação de alguns atos cria dificuldades para o setor de recursos humanos ao invalidar, por exemplo, a tabela oficial de cargos efetivos, que distribui e organiza o número de vagas na Casa. Além disso, pelo menos três aumentos do valor do auxílio-refeição - um deles para terceirizados - ficam na berlinda. O mais recente fixou o valor em R$638 mensais, em novembro de 2008. Os senadores também enfrentariam o constrangimento de ter de revalidar a verba indenizatória de R$15 mil mensais.O Globo

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