Mais um escorregão de Dilma

MAIS UM ESCÂNDALO QUE O LULISMO TENTA ABAFAR



A ofensiva do presidente Lula em defesa de José Sarney não começou quando o foco dos escândalos no Senado passou a se concentrar no seu nome, em junho último. Começou antes mesmo que o senador pelo Amapá se lançasse candidato a presidente da instituição pela terceira vez, em janeiro, contra um pretendente petista que parecia ter o apoio do Planalto. E não se limitou a apelos do tipo do político que "tem história suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum". Editorial do O Estado de S. Paulo

É a dedução inevitável a tirar da revelação da ex-secretária da Receita Federal Lina Maria Vieira de que, no final de 2008, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, lhe pediu para "agilizar" a auditoria do Fisco nas empresas da família Sarney, iniciada em 2007 e intensificada havia pouco por ordem judicial. Os negócios do clã são conduzidos pelo primogênito do senador, Fernando Sarney, indiciado pela Polícia Federal por diversos delitos penais. A Receita responde ao Ministério da Fazenda.

Lina Maria, demitida no mês passado do cargo que exercia há 11 meses, depois de considerar irregular uma operação contábil da Petrobrás endossada pelo governo, disse à Folha de S.Paulo que, numa conversa rápida para a qual tinha sido chamada pela chefe do gabinete da ministra, Erenice Guerra, Dilma lhe perguntou "se podia agilizar a fiscalização do filho de Sarney". A secretária, que teria se limitado a responder que ignorava a auditoria e iria verificar, entendeu que Dilma lhe pedira para "encerrar" a devassa. A ministra nega não apenas ter feito a solicitação, mas que o próprio encontro tivesse ocorrido. O duplo desmentido parece tão crível como a sua alegação de que não tinha conhecimento da inclusão de um fictício doutorado em economia pela Unicamp no seu currículo oficial. Ou a sua versão, contra todas as evidências, de que a Casa Civil não vinha preparando um dossiê sobre os gastos com cartão corporativo da Presidência da República, no período Fernando Henrique, depois da divulgação do formidável crescimento dessas despesas no governo Lula.

A negativa não se sustenta por uma série de razões. Em primeiro lugar, conforme o noticiário, não foi a ex-secretária da Receita quem tomou a iniciativa de relatar a ingerência; apenas a confirmou. Segundo, ela se recorda de que a ministra estava apressada e de como estava vestida. Terceiro, nenhum dos políticos governistas que saíram em defesa de Dilma repetiu a história da inexistência do encontro. Preferiram dizer que ela não havia feito nada de errado porque o verbo "agilizar" não poderia ser interpretado como sinônimo de encerrar. Na realidade, é a única interpretação possível. Não se tratava, com efeito, de uma fiscalização que se arrastasse por uma eternidade. Além disso, o pedido se seguiu a um ofício encaminhado à Receita por um juiz federal do Maranhão, determinando o aprofundamento da auditoria, sob pena de prisão da cúpula da Receita, o que levara o órgão a montar uma equipe especial de fiscais. Por fim, a demanda da ministra praticamente coincide com a entrada de Sarney na disputa pelo comando do Senado, na contramão do que dissera várias vezes a Lula.

Nesse ponto, as peças se encaixam. Já à época era voz corrente que o que mais pesou na decisão de Sarney foi o intento de proteger o filho Fernando dos desdobramentos da Operação Boi Barrica da Polícia Federal - um dos quais, precisamente, foi a ordem judicial dada à Receita. Com a sua característica visão do que pode o poder, imaginou que a sua volta à presidência do Senado inibiria a ação de ambos os organismos, quando não do próprio Judiciário. E com toda a probabilidade ele deve ter mencionado a Lula as suas inquietações com a devassa do Fisco nas empresas da família.

O prestimoso presidente, de seu lado, há de ter feito saber à ministra, a quem ungiu como sucessora em potencial, até que ponto estava solidário com as aflições do cacique político de cujo partido espera o apoio uníssono à sua candidatura. Ágil, ela captou a mensagem. O fato de não ter sido bem-sucedida ajuda a entender o que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse à secretária da Receita ao demiti-la: a ordem "veio de cima". E o que ela quis dizer quando, já demitida, falou contra a "ingerência política na administração tributária". Mais um escândalo, enfim, que o lulismo tentará abafar.


"ELA SABE QUE FALOU COMIGO", REITERA LINA
A ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira reiterou ontem que esteve no gabinete de Dilma Rousseff (Casa Civil) e que a ministra lhe pediu para encerrar logo o processo de investigação nas empresas da família Sarney.

"Ela sabe que eu estive lá e sabe que falou comigo. A Erenice [Guerra, secretária-executiva da Casa Civil] também, porque esteve no meu gabinete para marcar. Não custava nada ela ter dito a verdade. Qual a dificuldade? Na minha biografia não existe mentira."

Ela afirmou que confirmou o encontro à Folha porque foi procurada pela reportagem. "Não preciso disso, estou passando um momento muito difícil por causa da entrevista. Não tenho costas quentes, não tenho ninguém para me defender. Não sou candidata a nada, não preciso de palanque."

Lina disse que "Erenice pediu o encontro e que era para ser sigiloso", por isso não foi acompanhada de assessores. "Estive lá, antes a chefe de gabinete dela foi ao meu gabinete, agendou isso para ser uma coisa informal, que não constasse nem da minha agenda nem da dela. Eu cheguei pela garagem, entrei sem identificação, conversei com ela e voltei."

Lina está de mudança para o Rio Grande do Norte. Foi demitida em 9 de julho pelo ministro Guido Mantega (Fazenda). Folha de S. Paulo


ABRAÇO DE LULA E DO PT SALVARAM SARNEY
O presidente do Senado, José Sarney, venceu o primeiro round da luta que trava com a oposição para manter o mandato e o cargo. A vitória deu algum alento para Sarney, nos rounds seguintes. Mas a oposição, também é certo, não se quedou nocauteada. Ela também ganhou fôlego para se manter na competição, sobretudo quando a base aliada ameaça desagregar-se, na medida em que se aproximam as eleições presidenciais de 2010.

Antes das dificuldades que a candidatura Dilma Rousseff (Casa Civil) passou a exibir, nos últimos dias, o que importa no momento é fazer a exumação das vitórias obtidas por José Sarney, semana passada. A bem da verdade, um fato está relacionado ao outro.

O presidente do Senado esteve com um pé fora do Congresso para o qual foi eleito, pela primeira vez, no final dos anos 50, na condição de um político com ideias modernizantes. Dias atrás, estava prestes a sair pela porta dos fundos identificado com o que de mais atrasado sobrevive na política brasileira. Coisas como o nepotismo e patrimonialismo.

A boia em que Sarney está com as mãos chama-se Lula. O presidente e o PT conseguiram transformar descalabros de gestões do Senado em "enfrentamento político com a direita". Não era mais a edição de atos secretos ou a nomeação do namorado da neta o que estava em jogo.

O argumento que conta, nas tropas do governo, é que a oposição não estaria interessada em saber se Sarney empregara a neta ou decretara atos secretos. Mas apenas empenhada em dividir a aliança que o governo tenta construir para as eleições presidenciais de 2010. É a eleição que vai decidir se o povo quer mudar ou se quer mais oito anos de PT no comando de uma política que, pelo menos da ótica petista, é diametralmente oposta à do partido na oposição. Por exemplo, na extensão da intervenção estatal na exploração do Pré-Sal.

Impulsiva, boa parte da bancada do PT no Senado deu mostras de que ficaria contra Sarney. Lula achava e acha que isso é um erro monumental. Desde o início o presidente enxergou na disputa do Senado um round da sucessão presidencial, uma tentativa de rachar a base de sustentação que ele quer transformar em coligação eleitoral do PMDB ao PCdoB - em 2010.

O fato é que o PT parou de flertar com a oposição. Salvo uma ou outra exceção, a maioria dos petistas do Senado que pedia o afastamento de Sarney, em público, reservadamente sucumbiu aos argumentos lulistas. O partido passou a se reunir mais e aos poucos foi saindo, a seu jeito, da posição original. Só o movimento do PT no Senado pareceu permanecer parado (para usar uma expressão grata ao senador Marco Maciel, DEM-PE). Mas na realidade já estava literalmente rachada - 6 a 6 ou 7 a 5, dependendo do humor de Paulo Paim (RS). Como "único senador a viver do salário mínimo", segundo reza a lenda do Senado, o gaúcho seria o menos ameaçado pelo escândalo na campanha. Mesmo a contragosto, Lula até perdoou o líder Mercadante, por entender que ele procurava se preservar para disputar a reeleição.

Na eleição para a presidência do Senado, em fevereiro passado, Lula já desempenhara um papel fundamental para a vitória do senador José Sarney, contra um candidato do PT, o senador Tião Viana (AC). "O sr é um ex-presidente da República e terá o meu apoio e garanto que terá o apoio do PT", comprometeu-se.

Enquadrado o PT, se estabeleceu a lógica do enfrentamento político-partidário. Sarney, que poderia sair, sentiu-se revigorado. Prevalecera a tese de que a oposição, especificamente o PSDB, pedia seu afastamento por motivos políticos-eleitorais e não por causas éticas e de procedimentos legais. Mais uma vez venceu o argumento segundo o qual todos os senadores, algum dia, também cometeram um ou outro pecadilho.

Sarney e parte de sua família pensaram no afastamento do patriarca, porque ele estava perdendo sustentação política. Foram os abraços de Lula e do PT que o levaram à tona. São eles os responsáveis pela situação que se estabelecer no Senado da República. O risco é que todos afundem juntos.

Tocaia grande
Sarney tem em mãos um ofício, feito durante uma de suas passagens pela presidência do Senado, subscrito pelos partidos políticos, pedindo a nomeação de Agaciel Maia para diretor-geral do Senado. Política - Por Raymundo Costa Valor Econômico -


LULA PARALISOU O SENADO E AINDA DESMORALIZOU SEU PARTIDO
E impede que se viabilize uma solução, que é o afastamento de Sarney. Agora, com esse bate-boca, culpam a tropa de choque, mas é preciso culpar o chefe da tropa, que é Lula, o responsável direto pelo que está acontecendo - Por Roberto Freire, presidente do PPS

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