Afastado por corrupção diz que recebeu ajuda de Toffoli

Em grampo, ex-ministro Silas Rondeau conta que defensor foi indicado por advogado-geral . Segundo relato gravado pela PF, Toffoli ajudou a escolher possível adversário da AGU nos tribunais; ele diz não se lembrar de ter dado sugestão

Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o Supremo Tribunal Federal, o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, ignorou o princípio de uma lei federal e ajudou na defesa de um ex-ministro afastado do cargo e denunciado à Justiça por corrupção e formação de quadrilha. Quem afirma isso é o próprio ex-servidor, Silas Rondeau (Minas e Energia), em conversa gravada pela Polícia Federal. Na foto: Silas Rondeau, em cerimônia no Paraguai, em 2007 - Por Andréa Michael

"Quem me deu o nome [do advogado] foi o Toffoli e foi aprovado pela Erenice [Guerra, secretária-executiva da Casa Civil] e pela própria [ministra] Dilma [Rousseff]", afirma Rondeau em 14 de maio de 2008, um ano depois de ele ter sido exonerado do cargo e dois dias após ter sido formalizada a denúncia contra ele no Superior Tribunal de Justiça.

De acordo com a lei 9.028/ 1995, a AGU só pode participar da defesa de autoridades "quando vítimas de crime quanto a atos praticados no exercício de suas atribuições" -por exemplo, um funcionário público que foi alvo de assédio moral por parte de um superior ou que, diante de uma tentativa de suborno, recusou a oferta e resolveu levar o caso à Justiça.

Ao contrário, por lei, em casos como o de Rondeau, a AGU é encarregada de processar o agente público para reaver o dinheiro desviado do erário. O órgão, aliás, já está analisando mais de 200 volumes de processos enviados pelo Tribunal de Contas da União e pela Controladoria-Geral da União para pedir ressarcimento por supostos prejuízos aos cofres públicos no caso que envolve o ex-ministro - a PF acusa Rondeau de receber propina de R$ 100 mil em troca de favorecimento em obras federais.

Ou seja, se Silas falou a verdade nos diálogos interceptados pela polícia, Toffoli ajudou um ex-servidor a escolher o advogado que a AGU possivelmente irá enfrentar na Justiça.

Procurado pela Folha, Toffoli, que será sabatinado hoje pelo Senado sobre a ida ao STF, declarou não se lembrar de ter conversado com o ex-ministro. Ao ser confrontado com o conteúdo da escuta obtida pela PF com autorização da Justiça no âmbito das investigações da Operação Boi Barrica (rebatizada de Faktor), o ex-ministro afirmou "que jamais procuraria o advogado da União para resolver uma questão pessoal".

No diálogo, porém, ele diz a um advogado que atende diretores da estatal Eletrobrás que "a decisão foi tomada no gabinete do quarto andar [do Palácio do Planalto]" e que o defensor indicado por Toffoli e chancelado pela Casa Civil era "pessoa da confiança do governo".

O ex-ministro prossegue e dá o nome de quem teria sido indicado por Toffoli: José Gerardo Grossi. Em 2006, Grossi tinha sido nomeado por Lula ministro efetivo do Tribunal Superior Eleitoral. Naquele ano, Lula disputou a reeleição.

"Nem sabia quem era [Grossi]. Se era novo, se era velho e tudo mais. Fui lá, gostei", diz Rondeau, na escuta. O ex-ministro levou adiante o conselho dos ex-colegas de primeiro escalão e assinou contrato com Grossi em 5 de junho de 2007.

A história do grampo
As primeiras acusações contra Rondeau foram resultado da Operação Navalha, que, em 17 de maio de 2007, prendeu 46 pessoas acusadas de desviar recursos públicos em projetos de eletrificação rural, saneamento e manutenção de ferrovias. Uma semana após a operação, o ministro foi "exonerado a pedido" pelo presidente Lula.

Quando foi denunciado na Navalha, em maio de 2008, Rondeau já era alvo de outro inquérito da PF - desta vez, destinado a apurar tráfico de influência em órgãos públicos e outros ilícitos, também com o envolvimento do empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), de quem Rondeau é amigo e aliado político.

Nessa investigação, chamada inicialmente de Boi Barrica, a PF grampeou os telefones do ex-ministro. Entre as conversas interceptadas está a que Rondeau fala sobre Toffoli. Há também um diálogo com Erenice sobre a permanência de Grossi como defensor do ex-ministro. Os diálogos mostram que o governo continuou dando suporte a Rondeau mesmo um ano depois de ele ter sido afastado do ministério.

Em e-mail enviado ontem à Folha, a assessoria de imprensa da Casa Civil negou ter feito qualquer tipo de sugestão ao ex-ministro. No grampo de 14 de maio de 2008, porém, Erenice é explícita ao tratar da defesa do ex-colega. "Acho que você fica com o Grossi." Rondeau estava apreensivo, pois havia sido denunciado dias antes, mas foi consolado por ela: "Querido, eu não [me] esqueci de você". Foto de Tuca Vieira - Folha Imagem - Folha de S. Paulo


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