Confecom: Eles querem banir a liberdade

Sob os auspícios do governo federal, realizou-se na semana passada, em Brasília, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Era para ser uma iniciativa relevante porque, entre outros assuntos, poderia ser discutido ali o aperfeiçoamento da lei de radiodifusão, que existe há quase meio século e não corresponde integralmente à realidade de uma sociedade democrática e moderna como a brasileira almeja ser. Nas brechas da velha legislação, prosperaram oligopólios que impedem a competição e entravam a circulação de informações e opiniões. Mas, desde a sua etapa preparatória, a Confecom foi se metamorfoseando em equívoco, para dizer o mínimo, de qualquer ângulo que se olhe. Revista Veja

Ao final, seus participantes, compostos na maioria de sindicalistas, ideólogos de partidos de esquerda e agitadores de organizações socialistas, formalizaram propostas estapafúrdias, a ser enviadas ao Congresso, de "democratização dos meios de comunicação" e "controle social da mídia". Como na novilíngua esquerdista os conceitos têm significado oposto, leia-se "solapamento dos meios de comunicação livres", em lugar de "democratização", e "controle ideológico", em vez de "controle social". Ou seja, a Confecom transformou-se em outra tentativa do PT e adjacências de amordaçar a imprensa, impedindo-a, assim, de cumprir o seu papel de fiscalizar o poder. Um traço revelador, aliás, da tentação tão insana quanto autoritária de permanecer para sempre no comando do país. Foto: Encerramento da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães

Entre as proposições mais preocupantes, estão a formação de um Conselho Federal de Jornalismo, espécie de "tribunal da mídia" para julgar e punir jornalistas; a "participação popular" no processo de produção do noticiário; e a redução do limite de 30% para 10% de participação estrangeira em empresas de comunicação. Na prática, isso resultaria na formação de sovietes dentro das redações e de um retrocesso na capitalização de jornais, revistas e emissoras. Felizmente, o presidente Lula sempre que pode se mostra contra qualquer impedimento à liberdade de informação, opinião e expressão no Brasil. Disse ele na abertura da malfadada conferência, contrariando muitos de seus companheiros: "Meu compromisso com a liberdade de imprensa é sagrado. Ela é essencial para a democracia. O estado democrático só existe, se consolida e se fortalece com uma imprensa livre". Assim seja, com o enterro do entulho autoritário, socializante e retrógrado produzido na Foto: Renato Araújo/ABr



O MODELO É O GRANMA DE FIDEL
Encontro sobre comunicação patrocinado pelo governo mostra que tipo de imprensa a esquerda quer para o Brasil. O resultado é uma aberração – Por Laura Diniz da Revista Veja

Não se pode dizer que ela foi de todo inútil. A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em Brasília sob o patrocínio do governo federal, serviu para mostrar a cara da imprensa com que sonham os representantes formais da esquerda no Brasil. E a cara é de arrepiar. Formada por representantes do governo, sindicalistas e ONGs ligadas ao PT, PSOL e PCdoB, a Confecom nasceu em torno da salutar ideia de discutir propostas para revitalizar leis do setor que há muito caducaram. Mas, no fim de quatro dias de discussões (que incluíram até uma proposta de "diminuir a interferência da mídia no extermínio da diversidade da fala nacional"), o que resultou do encontro foi um funesto documento que revela quão vigorosamente os impulsos totalitários correm na veia da maioria de seus signatários.

Entre as mais soviéticas propostas aprovadas pela Confecom está a criação de um observatório de "conteúdos midiáticos", reencarnação do já rechaçado Conselho Federal de Jornalismo que o governo tentou impor há alguns anos a pretexto de coibir erros da imprensa, mas com o mal disfarçado propósito de submetê-la a censura prévia. Na versão apresentada pela Confecom, o conselho natimorto vira uma espécie de tribunal cuja atribuição é julgar jornalistas nos casos em que seus textos não atendam a determinados critérios de qualidade – critérios esses a ser definidos pelos Torquemadas do tal observatório. É mais uma tentativa, em nova embalagem, da já manifestada pretensão petista de controlar os meios de comunicação – processo que, se não ocorrer pela coerção legal, tem também a chance de se dar via coerção financeira. Assim, outra resolução aprovada pela Confecom é a redução, de 30% para 10%, do limite máximo de participação acionária de empresas estrangeiras em empresas de comunicação brasileiras. "Isso mostra o que a imprensa representa para esses segmentos: uma inimiga, organizadora social da burguesia e uma classe a ser combatida", resume o cientista social Demétrio Magnoli.

Para a turma da Confecom, enfim, a imprensa (ou a "mídia", segundo o termo apropriadamente monolítico adotado por seus participantes) opina demais, fala demais e, quem sabe, existe em demasia. Opinião semelhante tinha Fidel Castro quando aboliu todos os jornais em Cuba e estabeleceu que o Granma, a publicação oficial do Partido Comunista que hoje supre a falta de papel higiênico na ilha, seria o único a circular no país. Na fala cínica de Fidel, a existência de mais de um jornal era um desperdício de recursos. As propostas da Confecom formam apenas mais uma pequena nuvem a turvar o horizonte da liberdade de imprensa na América Latina. A atmosfera anda bem mais pesada em outros países. Na Venezuela de Hugo Chávez, só neste ano foram fechadas 34 emissoras de rádio e TV. Na Argentina de Cristina Kirchner, o governo promove uma perseguição ao grupo editorial Clarín, disfarçada de contencioso fiscal. No Equador de Rafael Correa, jornais e revistas podem se tornar reféns de concessão estatal, renovável a cada ano.

No Brasil, felizmente, o presidente Lula tem-se declarado um defensor incondicional da liberdade de imprensa. Por isso também, as bobagens da Confecom dificilmente terão consequência prática. Enquanto Lula resistir aos liberticidas, o máximo a que os participantes dessas Confecons poderão aspirar é mais um dinheirinho público para seus convescotes (o custo deste para o bolso dos trabalhadores: 8 milhões de reais). De caráter meramente propositivo, o relatório produzido pelo encontro será agora enviado ao Congresso a título de subsídio para os parlamentares. Espera-se que eles reservem ao documento destino tão nobre quanto o dado pelo povo cubano à imprensa oficial da ilha.

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