O Brasil é mesmo um país de todos

Cedemos a tudo e a todos, como no episódio de Honduras, em que Zelaya usou nossa embaixada como se fosse sua casa.

Realmente, o Brasil – acompanhando aqui o slogan do governo federal – é um país de todos. Isto é, de todos os vizinhos da América Latina. Especialmente a do Sul. Pois é uma verdadeira festa o que está acontecendo. Os "hermanos" de língua espanhola, e agora não são só os argentinos, têm deitado e rolado sobre o Brasil ultimamente.

Nunca antes na história desse país fomos tão submissos aos interesses de terceiros. Sob o aparente manto da busca de liderança – e de popularidade internacional – para o nosso atual presidente, tudo é concedido, tudo é concordado. Se lá fora alguém ronca mais grosso ou bate o pé com força, o Brasil cede e se torna, cada vez mais, de todos. Por Paulo Saab

Nem é preciso me alongar muito no assunto. Estou certo de que a memória do leitor está em dia.

A Argentina, desde o primeiro mandato de Lula, tem imposto ao Brasil restrições de entrada de produtos brasileiros, com enormes prejuízos para a indústria nacional. Recentemente, o ministro Miguel Jorge conseguiu – e olhe que "acalmar" os barbudinhos do Itamaraty não é fácil – criar também alguns embaraços aos produtos importados da Argentina, mas o quadro ainda não mudou.

Nossos vizinhos mandam e fazem o que querem em nome de um suposto benefício à indústria daquele país, quando, na verdade estão importando mais da China, da Itália e de outros países, em detrimento do Brasil.

A Bolívia sapateou em cima das empresas brasileiras ali instaladas, usando desde nacionalização a confisco, tomada de plantas com o exército e outras medidas de força para impor ao Brasil condições para o seu gás e se apropriar do que não era deles. Conseguiram, obviamente, e ainda agora seguem impondo aumentos aos produtos naturais que nos enviam, com o consentimento explícito do governo brasileiro.

Até mesmo o Equador andou dando uma de esperto em cima de empresas brasileiras que lá operam. E, lógico, conseguiu o que queria.

O Paraguai nos humilhou na campanha eleitoral, quando Itaipu foi a bandeira do estardalhaço. O governo, que prometeu apertar o Brasil na sociedade, venceu (sim, falo daquele ex-bispo que tem um monte de filhos) e, indo a campo e encontrando somente salamaleques tupiniquins, arrancou uma grana preta do povo brasileiro, forjando um novo acordo – melhor para o Paraguai – na sociedade de Itaipu, onde entramos com tudo e mais os ônus – e eles, com o recebimento de benesses por estarem na fronteira. Veja-se: não quero ser e nunca fui xenófobo. Somente pretendo ser justo.

Da Venezuela nem gosto de falar. O fanfarrão Hugo Chávez praticamente abriu uma sucursal em Brasília, lugar onde parece se sentir mais à vontade do que em sua casa. Manda onde quer, quando quer e como quer. O ditador fez até com que o Brasil engolisse Manuel Zelaya, o deposto candidato a ditador de Honduras, e o hospedasse em nossa embaixada, em um episódio muito conhecido e ainda em aberto. Agora, está ingressando no Mercosul só com a cara de pau e a aquiescência complacente do governo petista. Mesmo rasgando os estatutos do bloco – porque se trata de um ditador, com uma atitude de fechamento total da liberdade naquele país.

Só falta agora o Uruguai acabar roncando em cima do sul brasileiro. É só esperar um pouco mais para ver...

Daria para desdobrarcada um desses temas e ampliá-lo. Mas não convém abusar da paciência do leitor em fim de ano, cansado e muitos já desesperançados, ao ver os rumos que a América Latina está tomando.

Nunca antes na história desse país, repita-se, um slogan de governo coube com tanta precisão no cenário internacional. No caso interno, a conversa é bem diferente. O Brasil de todos a que se faz referência é o dos companheiros privilegiados e de quem recebe o que o governo suga da sociedade – e distribui não como política para beneficiar o país, mas em caráter eleitoral.
Diário do Comércio

Paulo Saab é jornalista e escritor

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