Itamaraty se nega a abrir suas despesas no exterior

ESSE DESGOVERNO É UMA TREMENDA “CAIXA-PRETA”

Para manter caixa-preta, ministério alega até rede elétrica precária em países pouco desenvolvidos

Antiga caixa-preta do Executivo, o Ministério das Relações Exteriores resiste a abrir suas contas e demonstrar seus gastos no exterior. Pouco ou quase nada do que fazem os 210 postos diplomáticos do Brasil no exterior — entre embaixadas, consulados e escritórios — está disponível no Sistema Informatizado de Administração Financeira (Siafi), do governo federal.

Essa histórica resistência do Itamaraty foi reforçada no fim do ano passado. Em 9 de dezembro, o ministério emitiu nota técnica orientando a liderança do governo na Câmara a barrar projeto que tenta abrir as contas da diplomacia brasileira. Por Evandro Éboli

A proposta do deputado Manoel Júnior (PMDB-PB), que está na Comissão de Relações Exteriores, obriga todas as embaixadas e consulados e escritórios a prestar contas ao Siafi. O GLOBO teve acesso ao documento do Itamaraty. Para evitar dar transparência a esses gastos, o ministério recorre a uma série de argumentos, desde falta de pessoal até a impossibilidade de usar internet, devido à insuficiência da rede elétrica em países pouco desenvolvidos.

Documento desfia uma coleção de desculpas O Itamaraty alega, ainda, ter um acordo com o TCU para que a disponibilização desses dados no Siafi se dê gradativamente.

Diz que as “dificuldades são muitas”, o que requer “necessidades extraordinárias de recursos humanos e materiais”.

Os diplomatas dizem que a tarefa requer treinamento específico para evitar erros na operação do sistema; que não há lotação adequada nos postos a serem incluídos no Siafi; que funcionários estrangeiros contratados para trabalhar nesses postos não têm conhecimento suficiente de português e de legislação contábil; e até que há problemas de fuso horário. “É um problema adicional, na medida em que o Siafi tem um horário de fechamento que obrigaria o funcionamento dos postos em horários fora do expediente”, diz o documento. Por fim, o Itamaraty alega que o Siafi não registra todas as moedas estrangeiras, apenas dólar americano, libra esterlina e iene.

Há outros obstáculos, segundo o Itamaraty: a operação online exigiria rede elétrica confiável e pleno funcionamento da internet, exigências não atendidas nos postos localizados na maioria dos países africanos, em postos de fronteira ou no interior de países da América Latina, da Europa menos desenvolvida (antigo Leste Europeu e novas repúblicas), no Cáucaso, no Oriente Médio e no Extremo Oriente. Na nota, o ministério diz que há dez postos no exterior já no Siafi: cinco embaixadas (Buenos Aires, Santiago, Pretória, Londres e Tóquio) e cinco consuladosgerais (Buenos Aires, Miami, Nova York, Londres e Tóquio).

Treze postos no exterior serão ligados ao Siafi O Itamaraty diz ter um cronograma para integração dos 13 postos ao Siafi em dois anos: seis em 2010 (Madri, São Francisco, Houston, Chicago, Boston e Nova York), e seis em 2011 (Haia, Bruxelas, União Europeia, Organização dos Estados Americanos, Atlanta e Barcelona).Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) detectaram falhas em postos do Brasil no exterior: falta de planejamento e metas, carência de cargos de chancelaria, ineficiência do mecanismo de remoção de servidores ao exterior, postos com excessivo número de contas bancárias, passivos elevados junto ao INSS. Para o deputado Antônio Carlos Pannunzio (PSDB-SP), integrante da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, a argumentação do Itamaraty não convence: — Dizer, em plena era da informática, ser difícil prestar conta por causa da dificuldade de conversão da moeda, ou que há problemas de energia, é tremenda desculpa esfarrapada. O Globo

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