"Marxismo latino" assombra "Tea Party"

Movimento conservador vê América Latina como exemplo negativo de intervencionismo e teme que Obama repita modelo nos EUA. Entre os disseminadores da mensagem está a brasileira, que equipara Lula a Chávez.

Para muitos partidários do movimento conservador "Tea Party" nos EUA, há um fantasma que assusta quase tanto quanto o governo Barack Obama. É a América Latina, que veem como exemplo de região dominada pelo intervencionismo, no melhor cenário, e por ditadores marxistas, no pior.

O movimento, uma rede de ativistas de direita, agitou o país na última semana com a reunião de vários grupos em uma convenção nacional em Nashville. Por Andrea Murta

No encontro, participantes disseram à Folha que "se identificam" com a América Latina, pois "também nos EUA há hoje uma ameaça de socialismo". O termo é alusão a algumas propostas do presidente democrata, como aumento de impostos a famílias ricas e criação de uma agência governamental para oferecer seguros de saúde. Entre os que espalham a mensagem está Ana Puig, codiretora da organização Patriotas da Mesa da Cozinha. A ativista, que nasceu no Brasil e se mudou para os EUA em 1986, discursa dizendo que "o que está ocorrendo aqui é exatamente o que ocorreu na América Latina - a implementação do marxismo do século 21".

Ela era esperada para a palestra "Paralelos entre o governo atual e ditadores marxistas da América Latina" na Convenção Nacional do "Tea Party", mas desmarcou de última hora. Em eventos similares, porém, Puig afirmou que "líderes latinos [com exceção apenas de chilenos e colombianos] foram eleitos com as mesmas táticas" que os obamistas usam hoje, como "infiltração do sistema educacional, ideologia da luta de classes, lavagem cerebral por meio da mídia e promessas para os pobres".

Uma vez eleitos, diz a brasileira, tais líderes promovem mudanças socialistas e tentam se perpetuar no poder. Ela apresenta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um dos "marxistas", ao lado de Hugo Chávez (Venezuela) e dos irmãos Castro (Cuba), entre outros. "Se não nos unirmos, vamos criar nossa própria "república de bananas" nos EUA."

"É a típica direita com mania de conspiração", disse à Folha o analista Peter Hakim, presidente do "think tank" Diálogo Interamericano. "O que é comum nessas mensagens é que: 1) há um grande senso de urgência; 2) o que está realmente sendo defendido nunca fica claro; 3) ou você está conosco, ou contra nós (assim Brasil e Cuba ficam iguais); 4) nenhum crime é grande demais para o inimigo; e 5) o inimigo é claro", afirma. Mas nem todos os argumentos são conspiratórios. É o caso da fala de Bruce Donnelly, criador da organização SurgeUSA, simpatizante do "Tea Party". "Vivi no Brasil durante os governos de José Sarney e Fernando Collor, com todos aqueles planos econômicos. Vi que, mesmo bem intencionado, um governo pode criar o caos com o intervencionismo." Folha de S. Paulo


ENTREVISTA COM JOE BAGEANT, CONSERVADOR JOE BAGEANT
“Aqui ou votamos na esquerda ou na esquerda radical"

O conservador purista Jim Linn, 48, encarnou o revolucionário americano Samuel Adams na Convenção Nacional do "Tea Party" para deixar claro que é hora de "os patriotas defenderem a Constituição". O ativista da Louisiana diz que, ao votar no republicano John McCain em 2008 optou "pelo menor de dois males" -e ficou deprimido por semanas. "Esse é o problema nos EUA, ou votamos na esquerda, ou na esquerda radical", afirma. (AM)

FOLHA - Por que o sr. está vestido de Samuel Adams [revolucionário americano considerado um dos fundadores da nação e que foi um dos participantes da Festa do Chá de Boston em 1773, cujo nome inspira o movimento "Tea Party" atual]?

JIM LINN - Porque Samuel Adams disse: "Se, em algum momento, homens vaidosos e gananciosos ocuparem o governo, nosso país vai precisar de seus patriotas para prevenir sua ruína". Este é o momento, nós somos os patriotas, e agora é a hora de defender a Constituição e nossa cultura judaico-cristã.

FOLHA - O multiculturalismo é um problema?
LINN - Sim. Vejo o que está acontecendo com o resto do mundo -a islamização- e vejo a Europa lutar em vão contra essa onda. Acho que isso poderia ocorrer aqui, especialmente porque estamos deixando todo mundo entrar [imigrantes]. E tudo o que o presidente Barack Obama está fazendo é contrário aos valores da maioria dos cidadãos da América.

FOLHA - Qual o caminho para defender esses valores?
LINN - Eu represento uma organização chamada "Caia Fora da Nossa Câmara" ("Get Out of Our House"), um plano apartidário para expulsar os políticos de carreira de nosso sistema. Todos os deputados pegam dinheiro de lobistas e não representam as pessoas e são os primeiros que devem cair fora. Tenho votado em republicanos há 30 anos, mas não sei como vou votar na próxima eleição, talvez em um independente. É preciso agora definir quem são os reais candidatos conservadores e ajudá-los a se eleger.

FOLHA - O sr. votaria em Sarah Palin [a ex-candidata a vice republicana] ? LINN - Não estou convencido sobre ela ainda. É cedo para falar sobre uma campanha presidencial, temos que nos concentrar nas legislativas [em novembro]. Não gosto do fato de ela apoiar McCain no Arizona. É politicagem? Eu sou um purista, acredito na defesa da Constituição a qualquer custo. Há um vácuo enorme na direita, pois esquerdistas se apropriaram dos dois partidos [Democrata e Republicano]. É esse vácuo que o movimento "Tea Party" tem que ocupar. Por Andrea Murta - Folha de São Paulo

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