“Enquanto eu estiver trabalhando, das oito da manhã às dez da noite, não terei candidato, mas depois do expediente vou para o palanque”, disse duas vezes neste mês o presidente que nunca trabalhou das oito da manhã às dez da noite, aparece no local do emprego só de vez em quando, passa a maior parte do tempo fora de Brasília, ficou longe do gabinete no Planalto mais de um ano dos quase oito de governo, não desce do palanque desde o dia da posse, tem candidata desde 2007, faz um comício por dia há dois anos e agora se dedica em tempo integral à campanha de Dilma Rousseff.
Deveria ter evitado a reprise da fantasia, soube no fim de semana. Intrigado com a dupla menção a esse misterioso “expediente”, o deputado Paulo Bornhausen, líder do DEM na Câmara, resolveu desvendar o enigma com um pedido de informações encaminhado no último sábado à chefia da Casa Civil. O parlamentar quer saber da ministra Erenice Guerra quantos dias por semana, e quantas horas por dia, o chefe de governo dedica ao serviço da nação. Por Augusto Nunes - Veja Online
“É preciso que o Palácio do Planalto esclareça qual é o expediente do presidente Lula, para que a própria Justiça tenha um parâmetro para verificar se ele faz campanha em horário de trabalho”, lembra Bornhausen, interessado em conhecer sobretudo “os horários de início e término da jornada de trabalho?”. Melhor amiga de Dilma Rousseff, Erenice é bastante inventiva. Inventou, por exemplo, um dossiê destinado a transformar Fernando Henrique e Ruth Cardoso em campeões da gastança. Também inventou álibis para que Dilma pudesse jurar que jamais conversou com Lina Vieira. Vai tentar agora inventar o expediente que não há.
Lula acha que existe, e que pode fazer o que quiser depois de cumpri-lo. Já no crepúsculo do segundo mandato, ele nunca entendeu que o chefe do Poder Executivo ─ diferentemente de um torneiro-mecânico ─ não obedece a turnos, não trabalha em meio período, nem é liberado no fim da tarde para brincar de cabo eleitoral. Nunca entendeu que o presidente, do momento da posse à hora do adeus, encarna todo o tempo uma instituição. E é tarde para compreender que continua a ser presidente mesmo quando entrega o cargo ao vice para sair de férias, para sair pelo mundo ou para sair por aí com um isopor na cabeça.
Acreditar que só se é presidente durante parte do dia é um equívoco de bom tamanho. Insistir na crendice depois de consumado o sumiço do expediente é uma agressão à sensatez ─ e uma afronta à lei. Já faz muito tempo que Lula não despacha com ministros, não consegue lembrar o nome de muitos deles, não examina documentos, estudos ou relatórios, não lê a papelada que assina, não consulta quem entende do assunto para tomar qualquer decisão, não se interessa por questões administrativas.
Se a legislação em vigor valesse para todos os brasileiros, o presidente da República não escaparia da demissão por abandono de emprego.
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