Analistas: libertações são sinal de fraqueza do regime cubano

Cubanos deportados para a Espanha concedem entrevista coletiva organizada por ONG, em Madri.

LUÍS EDUARDO GOMES - Notícias Terra
O governo Raúl Castro aceitou na semana passada, depois de negociações mediadas pela Igreja Católica, libertar 52 presos políticos e extraditá-los à Espanha. Analistas ouvidos pelo Terra afirmam que a libertação dos dissidentes em Cuba pode ser um sinal de enfraquecimento do regime comunista.
"O próprio aparecimento do Fidel, que veio a publico dar entrevista, só para dizer que a revolução está viva, isso já é uma prova de que o regime pode estar sofrendo a abalos em sua base", diz Marcelo Coutinho, pesquisador do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos da UFRJ.
"Há um segmento, ainda que pequeno, que possa se valer desse processo. Evidente que é preciso lembrar sempre que é um regime muito forte, mas existem pequenos buracos", afirma Coutinho. Esses segmentos seriam formados, em grande parte, por familiares de presos políticos e jornalistas independentes.

Coutinho acredita que, embora ainda pequenos, esses grupos opositores podem ganhar força rapidamente e ter impacto na mudança do regime. "A revolução cubana começou com uns poucos gatos pingados sob a liderança de Fidel e cresceu em semanas até se consagrar. Pode acontecer o mesmo, em sentido contrário", afirma.

O professor também argumenta que com o objetivo de impedir o crescimento desses grupos opositores, o regime cubano se viu na necessidade de abrir o diálogo com a Igreja Católica. Segundo ele, a Igreja, que historicamente mantém uma posição de neutralidade, dava sinais de articulação com famílias de presos políticos e grupos dissidente. "Não interessa ao regime ter a Igreja como opositora, pois já havia articulações de setores com a igreja e setores internacionais", disse Coutinho. "Tendo em vista a vulnerabilidade (do regime), isso foi algo a ser evitado", concluiu.

A professora Silvia Miskulin, Pós-doutoranda em História na USP, lembra que a libertação dos presos decorre diretamente das pressões de organismos de Direitos Humanos Internacionais, uma vez que os 53 dissidentes soltos fazem parte de um grupo de 72 opositores presos em 2003 - um caso que teve grande repercussão negativa no mundo. "Eram basicamente profissionais liberais e jornalistas independentes que foram acusados de serem colaboradores do governo americano. Eles foram condenados de maneira sumária a longas penas. É um momento importante, bastante controversa, porque não tiveram acesso à defesa", lembra.
Brasil

O professor Marcelo Coutinho questiona o não envolvimento do governo brasileiro na negociação nas negociações. "Eu fico impressionado de o regime não ter feito essa negociação com o Brasil, não ter sequer preparado o governo de que isso acontecer. Isso deixa a diplomacia e o governo brasileiro em uma posição desconfortável", disse o professor.

Ele ainda lembra que o presidente Lula, em razão de sua proximidade com Fidel, adotou a posição de não criticar o regime cubano em relação a violações dos direitos humanos, chegando inclusive a dizer que o caso se tratava de presos comuns. "O Lula pagou o ônus por não censurar o governo cubano, e todos os bônus ficaram com o governo espanhol. Cuba podia ter envolvido o Brasil, ainda que indiretamente, para preservar a imagem do governo".

Greves de fome
Para a professora Silvia Miskulin, as greves de fome realizadas por opositores do regime, que tiveram grande repercussão na mídia internacional, foram decisivas na libertação dos presos. "É algo que você não consegue calar por muito tempo. Uma morte já foi muito desgastante, a segunda poderia desencadear um processo de maior oposição dentro do país", afirmou, lembrando a morte de Orlando Zapata, que faleceu em fevereiro deste ano após 85 dias de grave de fome.

Após a morte de Zapata, o dissidente Guillermo Fariñas "prosseguiu" a greve de fome que durou 135 dias e só foi encerrada no dia 9 de julho com o anúncio da libertação dos presos. Para o professor Coutinho, as greves de fome têm uma grande força simbólica de pressão. "Uma greve de fome, seguida de uma morte, é algo que incomoda muito. É algo que vai direto ao coração das pessoas. Cuba sabe muito bem a importância desses aspectos simbólicos, por que o regime é construído com base neles".

Contudo, Silvia Miskulin aponta que o governo cubano tenta fazer de tudo para negar que as greves de fome influenciaram na libertação dos presos. "O que o regime está tentando agora é uma obra de engenharia política, muito hábil, e fazer de tudo para mostrar que não estavam cedendo em relação a greve de fome e evitar uma derrocada maior".
Incertezas
Apesar de os analistas acreditarem que as libertações podem ser um passo rumo à abertura do regime, ambos concordam que ainda é preciso esperar os próximos eventos para saber o futuro dos presos políticos em Cuba.

"É uma coisa meio estranha ainda. Porque que ainda são muito poucos os países se dispuseram a receber esses presos. Na América do Sul, apenas o Chile se dispôs. Ainda precisamos esperar e ver o que é que vai acontecer com esses presos, qual a liberdade que vai ser dada a eles", afirmou Marcelo Coutinho.

A professora Silvia Miskulin, por sua vez, lembra que os presos "foram libertados com a condição de deixar a ilha" e que, com isso, o governo amortece o impacto político da saída deles. "Eles são levados direto da cadeia pro aeroporto", acrescenta.

Ela ainda lembra que existem mais de 100 presos políticos em Cuba e que não há menção sobre a libertação deles. "Pode ser que os presos libertados possam pressionar, a partir da repercussão da saída deles, pela libertação dos outros".

Miskulin também acredita que é difícil prever o impacto interno que da libertação, uma vez que o fato não diminuído pela imprensa oficial. "Mas a gente sabe que setores urbanos mais informados, sobretudo em Havana, que conseguem ter acesso a uma notícia que chega por intermédio da imprensa internacional, pelos blogs, por parabólicas clandestinas, acabam sabendo do fato", disse. "Esses setores talvez represente uma esperança a um novo passo libertação aos próximos presos", acrescentou.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ninguem e nada é para sempre, um dia acaba.Vira areia.