Erenice Guerra, Ana Maria Amorim, Mariza Campos e Marisa Letícia
Até a descoberta de que a Casa Civil foi reduzida a covil da família de Erenice Guerra, a concessão da Grã-Cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul à mãe do próspero vigarista Israel foi apenas – e já não é pouco – mais uma torpeza produzida pelos áulicos profissionais do Itamaraty. Na Era da Mediocridade, não basta agraciar a melhor amiga de uma possível presidente da República com rapapés, genuflexões, agrados subaternos, minuetos servis e discurseiras bajulatórias. É preciso também condecorá-la.
O desmoronamento da Casa Vil promoveu a coisa de celerado a vilania consumada em abril. Prestar reverências à matriarca de um clã unido no banditismo é vassalagem de comparsa. Quem homenageia publicamente um monumento à corrupção impune está moralmente corrompido até a medula. Até que alguém se responsabilize pelo ultraje, a paternidade da ideia pertence a Celso Amorim. Ao agraciar Erenice, ele se desonrou. Isso não tem importância. E desonrou a Grã-Cruz. Isso é imperdoável.
Enquanto a roubalheira descarada foi carinhosamente rebatizada de “denuncismo”ou “factoide” pelo presidente e pela primeira devota, os envolvidos na infâmia puderam olhar para os lados e fingir que não era com eles. O truque já perdeu a validade, avisa a confissão feita pelo presidente Lula ao portal Terra: .“Se alguém acha que pode chegar aqui e se servir, sabe, cai do cavalo. Porque a pessoa pode me enganar um dia, pode me enganar, sabe, mas a pessoa não engana todo mundo todo tempo. E quando acontece, a pessoa perde. O que aconteceu com a Erenice é que ela jogou fora uma chance extraordinária de ser uma grande funcionária pública deste país”.
Tradução: Erenice foi ávida demais e cautelosa de menos. Perdeu a chance de ser uma grande funcionária por estar exclusivamente interessada na chance de virar milionária. Segundo regras fixadas pelo Ministério das Relações Exteriores, “as condecorações conferidas no Dia do Diplomata são oferecidas a pessoas que se destacam em suas áreas de atuação”. As áreas de atuação em que Erenice se destacou estão capituladas no Código Penal.
Também de acordo com o Itamaraty, a “Ordem de Rio Branco é destinada a galardoar os que por qualquer motivo se tenham tornado merecedores do reconhecimento do Governo Brasileiro, servindo para estimular a prática de ações e feitos dignos de honrosa menção, bem como para distinguir serviços meritórios e virtudes cívicas. Tudo somado, as normas oficiais e a rendição do presidente aos fatos permitem que as coisas sejam vistas como as coisas são até por cegos voluntários, portadores de miopia cafajeste e cretinos fundamentais: Erenice Guerra deve ter a honraria confiscada imediatamente.
Um prontuário enfeitado com a Grã-Cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul não faz sentido nem no Brasil de Lula.
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