Juíza diz que declaração do presidente do Inep sobre 'missão cumprida' é 'afronta' ao exame e critica ideia de realizar nova prova. MEC pode recorrer da decisão
Nathalia Goulart - VEJA
A Justiça Federal do Ceará acatou nesta segunda-feira pedido de liminar do Ministério Público Federal e determinou a suspensão temporária em todo o Brasil do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2010. "A suspensão tem caráter temporário e cabe recurso ao Ministério da Educação", afirma a juíza Carla de Almeida Miranda Maia, da 7ª Vara Federal, responsável pela decisão. Procurado pela reportagem, o MEC, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que está ciente da decisão judicial, mas não quis se pronunciar a respeito. Enquanto vigorar a suspensão judicial, segundo a juíza, o MEC não poderá divulgar informações sobre resultados das provas do fim de semana e tampouco marcar nova prova.
"Acatei o pedido de liminar porque entendi que o Enem não foi realizado com a devida segurança, desde a impressão até sua realização, neste fim de semana", acrescenta a magistrada, referindo-se à falha de impressão nos cadernos de cor amarela com questões e respostas entregues aos candidatos no sábado. "A suspensão é válida até que a Justiça avalie o recurso que o MEC provavelmente apresentará, ou até que os responsáveis pelo exame apresentem soluções consideradas suficientes para estancar as falhas do Enem 2010."
Na sentença, ela detalha os problemas que constavam do caderno amarelo: “O cartão de respostas tinha a mesma divisão de cabeçalho, porém as ordens destes mesmos cabeçalhos estavam trocadas”. Além disso, a prova continha erros de impressão, “tais como três ou quatro perguntas duplicadas” e a “ordem das perguntas demonstrava ausência de várias questões”. Uma estudante que registrou boletim de ocorrência na Polícia Civil de Salvador é citada no despacho: “A esse respeito, a estudante Roberta Matos, em Salvador, prestou queixa, alegando que já tinha respondido ao menos 25 questões quando o erro foi constatado”.
A magistrada criticou também a proposta em estudo no MEC de realização de novo exame, ao qual compareceriam apenas os estudantes diretamente prejudicados pelo erro na impressão das provas. "O que foi apresentado até agora, aplicar a prova apenas a esses candidatos, não é suficiente", diz. "Novas provas poriam em desigualdade todos os candidatos remanescentes."
A juíza criticou ainda as declarações do presidente Joaquim José Soares Neto, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), autarquia do MEC responsável pelo Enem. Em entrevista coletiva após a realização da prova do sábado, Soares Neto se referiu ao exame como uma "missão cumprida", a despeito dos problemas ocorridos. "Isso é espantoso. É uma afronta ao coração do Enem", diz Carla de Almeida.
Em nota, o procurador da República Oscar Costa Filho, que apresentou a ação civil pública aceita pela Justiça, também criticou a proposta do MEC de realização de nova avaliação. “O fato do Inep ter aventado realizar provas separadas para o mesmo concurso apenas confirma o total desconhecimento dos princípios que informam os concursos públicos, entre os quais a igualdade”, diz.
Celular - A juíza Carla de Almeida também comentou outro ponto controverso da prova do fim de semana: o vazamento de informações por um jornalista, inscrito para o exame, durante a realização da avaliação. A magistrada considerou o fato uma amostra de falha na segurança do Enem 2010: "O pior não é a atitude em si de driblar a segurança, mas, sim, pensar que qualquer um que estivesse fazendo a prova poderia fazer o mesmo", diz.
(Com reportagem de Renata Betti)
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