Lula discursou na reunião do Conselho Nacional de Economia Solidária e afirmou que levará a presidente eleita, Dilma Rousseff, para a confraternização com os catadores de papel: “Se Deus quiser, levarei a Dilma para passar o bastão lá. É importante porque é isso que faz acontecer o milagre da crença do povo”. Desde 2003, o Babalorixá de Banânia, convertido em Cristo dos excluídos — só que ele é o cordeiro rechonchudo da exaltação, não o da expiação — se encontra com os catadores na véspera de Natal. Este ano, a cerimônia “religiosa” acontecerá no dia 23.
Embora Lula tenha contado com uma imprensa generosíssima na cobertura dos atos do governo — parte dela fazia seu trabalho; outra parte foi regiamente paga para elogiar —, ele reclamou: “Todo o esforço que fizemos durante esses oito anos não foi levado em conta, não foi divulgado, as pessoas sequer cobriam as conferências porque no Brasil, às vezes, uma briga entre duas pessoas na rua é mais importante que uma conferência que reuniu mais de 20 mil pessoas nesse país para discutir economia solidária”.
Não tem jeito! Lula não suporta a independência da imprensa. Franklin Martins, sem dúvida, é a face conhecida da tentativa de criar empecilhos para o livre exercício do jornalismo, mas a orientação parte inequivocamente do chefe. O que mais ele queria? Sem jamais descer do palanque, já demonstra saudades do poder: “Demorou tanto para a oposição, mas para mim foi tão rápido”.
Vamos ver como ele vai compensar a síndrome de abstinência. Eu o imagino em casa, com os pés descalços sobre o pufe, assistindo às evoluções de Dilma no Jornal Nacional. Qual será a saída? Prozac, Zoloft, Black Label? Ele gosta demais desse negócio! Como diria Catulo, meu lírico predileto, “difficile est longum subito deponere amorem“: é difícil renunciar subitamente a um grande amor. Aquele, coitado!, ardia por Clódia, sua amante. A julgar pelos poemas, ela era, assim, o que se diria hoje em dia uma “vagaba” fogosa, que se dava a muitos amores, inclusive ao do marido… Lula tem ciúme é da cadeira!
A fala sobre os catadores não passa de um rasgo perverso de demagogia. Aqueles coitados compõem a miséria benfazeja. Estão lá para que Lula possa exaltar as próprias virtudes. Ele não se orgulha de tê-los tirado da abjeção. Sua generosidade é de outro tipo: os desgraçados servem para provar que ele próprio não é preconceituoso como os governantes do passado. Lula é do tipo que obtém lucro máximo com a desgraça alheia. Quando menos, ela serve para que ele descubra em si mesmo um temperamento caridoso, tolerante e inclusivo.
De resto, não fosse um estilo — que, de todo modo, não é irrelevante, posto que há uma óbvia degradação institucional no país —, sua fala seria perigosa. Quando afirma que o bastão, de fato, será passado a Dilma diante dos catadores, está, ainda que não tivesse clareza disto (e ele tem) criando uma oposição entre o legítimo e o legal. A legalidade da transmissão do cargo seria menos importante do que esse batismo das ruas. Levado a sério, esse pensamento tem, no ponto de chegada, a tirania.
Esse rapaz tende a dar trabalho a Dona Marisa Letícia: Prozaz, Zoloft ou Black Label? Com que substância Lula preencherá as horas intermédias do tédio, entre uma lembrança e outra? Não adianta lhe recomendar “Leite Derramado”. Ele já confessou que Chico Buarque (devolve o Jabuti!) lhe dá sono! Se bem que, dormindo, Lula é um pensador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário