Em festejo do Bolsa Família Lula pratica ‘tiro à mídia’

Lula ainda não se deu conta, mas, livre dos afazeres de presidente, poderia substituir Tiririca, agora eleito deputado, nos programas humorísticos da emissora do companheiro bispo Macedo.

Por Josias de Souza - Folha Online
Lula aproveitou a festa de aniversário de sete anos do Bolsa Família para praticar seu esporte predileto: tiro à mídia.

O principal programa aniversariou em outubro. Como era mês de eleição, os festejos foram adiados. Ocorreram na noite passada.

Deu-se durante a abertura de um seminário batizado de “Avanços e Desafios do Bolsa Família”. Lula discursou.

Tinha muito a comemorar. O principal programa social de seu governo atende, hoje, a 12,7 milhões de famílias.

A despeito disso, Lula desperdiçou generosos nacos de seu discurso para vergastar a imprensa. Até o Aerolula ele despejou sobre o microfone (assista lá no alto).

Em timbre de chacota, disse que só agora, prestes a deixar a Presidência, descobriu que o avião, adquirido no alvorecer do governo, não lhe pertence:

“Pensei que era meu, como a imprensa dizia que era Aerolula, a oposição diza que era Aerolula... Agora tá terminando o meu mandato e descobri que não é meu...”

“...A dona Dilma vai ganhar um avião sem receber uma crítica que eu recebi. Agora, vão colocar Aerodilma. E eu não vou ganhar nada. Ou seja, perdi meu avião”.

Em verdade, o avião que Dilma vai ganhar é outro. O governo cogita adquirir, ao preço de R$ 500 milhões, um brinquedo novo, o Aerodilma.

Afora o chiste aeronáutico, Lula divertiu a platéia, estimada em 500 pessoas, com uma analogia grandiloqüente.

Comparou o Bolsa Família a uma das sete maravilhas do mundo, a muralha da China: "É um processo que começou. É como a construção da muralha da China...”

“...Se ficasse uma pessoa olhando o tamanho daquela muralha, ele [sic] jamais colocaria o primeiro tijolo. Ele só começou porque ele foi ousado. E eu acho que nós fomos ousados".

Recordou o início de sua gestão, quando o programa atendia pelo nome de Fome Zero e era gerido pelo petista José Graziano.

Disse que, por vezes, depois de ler as críticas dos jornais, Graziano entrava em seu gabinete com o coração aos pulos, a ponto de “ter um infarto”.

Afirmou que algumas das notícias da época criticavam o Fome Zero “por ignorância”. Outras, por “um pouco de má-fé”.

Acomodou num terceiro lote as reportagens que, motivadas por interesses políticos, sustentavam que o programa não daria resultado por ser “populista”.

Em vez de reclamar, Lula deveria render homenagens à mídia. O Fome Zero revelou-se um rematado fiasco.

De resto, Lula homenagearia a si mesmo se recordasse o que dizia no passado sobre os programas que se restringiam à distribuição de alimento.

Para seu azar, há a internet. Quem quiser, pode ouvir esse Lula pretérito que o atual se abstém de recordar. Em 2000, dizia coisas assim:

“Lamentavelmente, no Brasil o voto não é ideológico. [...] Você tem uma parte da sociedade que, pelo alto grau de empobrecimento, é conduzida a pensar pelo estômago e não pela cabeça...”

“...É por isso que se distribui tanta cesta básica, tanto ticket de leite. Isso, na verdade, é uma peça de troca em época de eleição. [...] Você despolitiza o processo eleitoral...”

“...Você trata o povo mais pobre da mesma forma que Cabral tratou os índios quando chegou no Brasil, tentando distribuir bijuterias e espelhos para ganhar os índios. Eles distribuem alimentos”.

O grande salto foi dado no instante em que, sob Lula, o governo evoluiu do Fome Zero para o Bolsa Família, resultado da unificação de programas lançados na era FHC (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Vale Gás...).

No melhor estilo “nunca antes na história...”, Lula apaga da gênese do Bolsa Família esse DNA tucano. Apaga o antecessor, Cabral e até os índios. Finge que descobriu o Brasil em 2003.

Para seu desassossego, há a internet. Quem quiser pode assistir à cerimônia de lançamento do Bolsa Família. Verá que o programa brotou não da cabeça de Lula, mas de uma reunião com governadores.

Verá mais: a ideia de acomodar sob o guarda-chuva de um cadastro único todos os programas sociais existentes à época foi oferecida a Lula por um grão-tucano: Marconi Perillo.

À época governador de Goiás, Perillo mereceu de Lula um agradecimento especial. O presidente afagou-o em discurso.

Hoje, Lula acomoda Perillo, de volta ao governo goiano, na lista de desafetos. Faz pouco da imprensa e distribui gracejos à oposição.

Lula ainda não se deu conta, mas, livre dos afazeres de presidente, poderia substituir Tiririca, agora eleito deputado, nos programas humorísticos da emissora do companheiro bispo Macedo.

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