No vídeo capturado pela Polícia Federal, hoje em poder do Mnistério Público e divulgado pelo Estadão, a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF), escoltada pelo marido malandro, aparece recebendo uma bolada de R$ 50 mil das mãos de Durval Barbosa, pivô do escândalo que encerrou a carreira do governador José Roberto Arruda. Em seguida, a filha de Joaquim Roriz pede um aumento de propina ao vigarista que foi secretário de Relações Institucionais do Distrito Federal no governo do pai. Para os padrões da família, aquilo era dinheiro de troco.
A gravação das cenas de corrupção explícita custaria à trinca umapedagógica temporada na cadeia em qualquer paragem civilizada. No Brasil da Era da Mediocridade, Jaqueline está na iminência de entrar na multidão de condenados à impunidade. Embora tenha atropelado com selvageria o Código Penal, é altamente improvável que perca a liberdade: a Justiça brasileira não costuma valer para pais-da-pátria. Embora tenha espancado furiosamente a legislação eleitoral e o decoro parlamentar, é certo que não perderá o mandato nem os direitos políticos.
Será absolvida graças à “doutrina Cardozo”, uma abjeção concebida pelo atual ministro da Justiça quando defendia os interesses da companheirada no Conselho de Ética da Câmara. No começo de 2007, escalado pelo PT para encontrar uma fórmula que facilitasse a absolvição por atacado dos pecadores amigos, o deputado federal paulista pariu em poucos dias a malandragem prontamente encampada pelo Conselho: segundo a “doutrina Cardozo”, só podem ser abertos processos por quebra de decoro “referentes a atos cometidos depois da posse do acusado”.
Para preservar os mandatos dos mensaleiros Waldemar Costa Neto (PR-SP) e Paulo Rocha (PT-PA), acusados de quebra de decoro pelo PSOL por estarem enfiados até o pescoço na roubalheira descoberta em 2005, Cardozo argumentou no Conselho de Ética que a dupla fora purificada pela reeleição em 2006. “De alguma forma, o eleitorado optou pela anistia”, fantasiou o professor de Direito, inaugurando uma Justiça paralela em que a urna é a única instância.
É por esse buraco no porão que vai escapar Jaqueline Roriz. Por ter consumado a tunga não em 2010, mas na campanha anterior, Jaqueline nem precisará esperar a absolvição pelo plenário. Foi dispensada dessas miudezas pela “doutrina Cardozo”, criada pelo deputado que, há um ano, afirmou que não disputaria outro mandato por estar “decepcionado com o Congresso”. Fingiu ter esquecido o que fez. Fingiu que não estava apenas deixando a Câmara para concentrar-se na candidatura ao emprego de ministro.
Já escrevi nesta coluna que o Ministério da Justiça foi privatizado e anexado pelo PT em junho de 2005, quando o escândalo do mensalão obrigou o criminalista Márcio Thomaz Bastos a licenciar-se oficiosamente do cargo para concentrar-se na defesa do chefe Lula e seus 40. Depois de transformar o gabinete em sede do departamento jurídico do bando, o doutor justificou a fama de especialista em livrar da cadeia delinquentes com tanta culpa no cartório que o mais humilde guarda da esquina não hesitaria em dar-lhes voz de prisão. Foi ele quem descobriu que, vista de perto, a quadrilha dos mensaleiros era apenas um ajuntamento de pequenos contraventores. O mensalão nunca existiu, ensinou Márcio à clientela. Só dinheiro de caixa 2. Só recursos não contabilizados.
Herdeiro do escritório, Tarso Genro resolveu matar a saudade da Guerra Fria e envergonhar o Brasil decente com trapaças e trapalhadas internacionais. Em 2007, durante os Jogos Panamericanos do Rio, ganhou a medalha de ouro em subserviência ao afagar a ditadura cubana com a deportação dos pugilistas Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux. No ano seguinte, escalou o pódio do cinismo ao transformar em ditadura a democracia italiana, recusar o pedido de extradição de Cesare Battisti e promover o assassino de estimação em refugiado político.
No começo de 2010, com a substituição do bacharel gaúcho pelo interino vocacional Luiz Paulo Barreto, a instituição acabou reduzida a filial da grande fábrica de dossiês cafajestes, acionada regularmente pela Casa Civil e pelo Alto Comando da campanha de Dilma Rousseff. Decidida a prosseguir o trabalho de destruição que Lula começou, a sucessora entregou o Ministério da Justiça a José Eduardo Cardozo.
O caso Jaqueline Roriz confirma que confiou a missão ao homem certo.
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