Celso Arnaldo captura Dilma em Nova York: a calamidade que virou dinamite

O carro da presidente estaciona à porta do hotel Waldorf Astoria, na Park Avenue. Dilma está chegando da Reunião de Alto Nível sobre Doenças Crônicas Não-Transmissíveis, seu primeiro compromisso em Nova York, onde quarta-feira abrirá a Assembleia Geral da ONU.

Ao descer do carro com um tailleurzinho azul, os carregadores de bolsas e malas do Planalto se apressam em aliviar Dilma do peso extra, deixando-a só com uma pasta de plástico debaixo do braço – talvez cópia do discurso histórico que fará na ONU, que precisa ser passado e repassado até quarta-feira, porque o mundo vai estar de olho.

Os repórteres que a esperam à porta do hotel devem ter sido informados por seus colegas que, no caminho, ela dera uma parada numa livraria – programa obrigatório para a insaciável devoradora de livros que, antes de degustá-los, se deleita com seus aromas, como uma enófila/bibliófila. Se para Vinícius de Moraes o uísque era o cachorro engarrafado, tal a fidelidade canina que tinha para com o scotch, para Dilma os livros são o Nego impresso em papel.

Presidenta, dá uma palavrinha aqui com a gente, grita uma jornalista.

Não estava no protocolo, mas, sob o ponto de vista do “meu chinelo de minha humildade” que ela declarou calçar antes daquela célebre entrevista em que defendeu a convocação de Neymar e Ganso para a Copa de 2010, o que custa um pit stop para a grande estrela da AG da ONU, capa da última edição da revista Newsweek, onde foi chamada de “Dilma Dinamite” (Dynamite Dilma)?

A passagem pela livraria é o assunto que abre a palavrinha à imprensa. O que fez Dilma desviar-se de seu trajeto de volta ao hotel? Naturalmente um livro muito importante, seminal – se bem que, no caso de Dilma, mais de cabeceira do que de cabeça.

– Que livro a senhora comprou?, vai indagando uma repórter antes mesmo de a presidente chegar ao spot da imprensa.

A presidente ganha um ar meio assustado, mas logo se recupera do impacto da pergunta. Naquela caminhada de metros, a passos propositalmente lentos, antes de responder à pergunta inesperada, de sopetão, o pesadelo de um ano atrás deve ter passado por sua cabeça: ainda na campanha, Marcelo Branco, o guru virtual, a fez gravar um vídeo onde uma falsa repórter da equipe digital perguntava à candidata intelectual, contraponto do apedeuta Lula, acerca do último livro que tinha lido. Dilma disfarçou, dizendo que estava pensando na novela das 8 para tentar lembrar o nome do livro, até que uma assessora lhe soprou ao ouvido, mas ela não entendeu direito. Ainda levou alguns segundos para processar: “As, as, as, as brasas!” E ainda puseram o vídeo no You tube!!.

“Agora, eles não me pegam”, deve ter pensado Dilma, à porta do Waldorf:

Não comprei livro, não. Eu comprei um CD…

O problema é que ela também não lembra o nome do CD comprado há minutos. A sorte é que CD, ao contrário de livros, não precisa ser citado com título e autor. Basta o autor. Mas nem isso… Meu Deus, vai começar tudo de novo:

– Cumé que chama a moça do meu CD?, indaga Dilma aos atônitos assessores, incluindo dois ministros, Fernando Pimentel e Antonio Patriota.

– Seu CD que você comprou lá?, indaga ao fundo uma voz que parece a do embaixador Patriota, especialista em colocar algodão entre louças e salvar a pátria.

– Ô, já esqueci, viu, o nome do CD – lamenta Dilma.

– Tem um CD que tá aqui, sugere Pimentel.

E Dilma, durona, como sempre:

– Não, o seu é esse. O meu não é o seu – conclui a presidente, com a mesma lógica irrepreensível que pretende levar à Assembleia Geral da ONU para reafirmar que o Brasil é um país assertivo, seja lá o que isso seja.

Alguém – parece Patriota de novo – enfim elucida o enigma sobre “a moça do meu CD”;

– Stacey Kent.

– Stacey Kent, repete Dilma, triunfal, mas sem esclarecer, mesmo porque não lhe foi perguntado, como conseguiu localizar, escolher e comprar esse CD, especificamente, sem saber o nome da moça, aliás uma bela cantora de jazz da nova geração.

Sorte é que nenhum repórter quis saber que CD de Stacey Kent ela tinha comprado. Se fosse “Breakfast On The Morning Tram” (indicado ao Grammy em 2007), possivelmente Dilma perderia a reunião de quarta-feira tentando lembrar e depois pronunciar o título.

Ok, deixa o CD para lá. O assunto agora é a capa da Newsweek:

– A revista a senhora já leu?

– Agora que eu vou olhá, tá?

Note-se: ler, não; olhar.

– O que a senhora achou daquela manchete “Dilma Dinamite”

– Eu acho assim que lembra muito filme do velho oeste, né?

De novo, pede ajuda aos universitários:

– Cumé que chamava?

Patriota é mesmo um patriota, sempre com a mão estendida para salvar a presidente:

– Calamity Jane.

Dilma cai em si: não era bem isso o que pensou.

– Calâmity, Dilâmity, ri, nervosamente.

Bem, Jane é o segundo nome de dona Dilma, a Primeira-Mãe. Pelo menos estamos em casa.

– Mas a sra. gostou?

– Eu achei muito boa a capa.

A entrevista-relâmpago, sob o ponto de vista desta coluna, já estava plenamente encerrada. Mas, no minuto restante, os repórteres, imaginem, ainda quiseram saber de coisas sérias, como o discurso de quarta-feira:

- Acho que essa é uma expectativa grande, porque de fato é uma honra sê a primeira mulher a discursá na Assembleia Geral da ONU…

Como lembrou Reinaldo Azevedo num post ontem, ela é a primeira mulher porque é a primeira mulher presidente do Brasil. Seria o primeiro Saci-pererê se o Saci-pererê tivesse sido eleito presidente.

Mas a imprensa, curiosa que só ela, quer saber mais sobre os temas do discurso:

– Aí cês esperam, né, porque senão vou fazê meu discurso da ONU aqui.

Mas, presidente, mesmo a senhora sendo durona, não dá um friozinho na barriga falar na ONU?

– Olha, sempre dá, sempre qualquer pessoa que vai falá né, para um público que seja mais do que algumas poucas pessoas, fica emocionada até porque é o momento que cê tem de representá aquilo que você ali está fazendo,eu tenho de representá o Brasil, concluiu ela, tranquilizando os que pensavam que ele fosse representar a Tanzânia na quarta-feira.

Fim de papo. Agora, é banhinho e olhá a Newsweek da mulher-dinamite.

Brrigada, viu, brigada mesmo – despede-se a presidente.

Não importa o que Dilma vá ler na ONU quarta-feira, para “um público que seja mais do que algumas poucas pessoas”, como ela tão bem definiu esse momento glorioso.

O apelido da Newsweek vai pegar, na versão Dilma – Calamidade Pública Número 1

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