Sem querer, o ministro Luiz Fux, do STF, inaugurou na
Câmara um movimento que trará de volta ao noticiário em 2013 vários temas
polêmicos que Dilma Russeff imaginava sepultados. Ao conceder a liminar que
provocou o adiamento da votação do veto à Lei dos Royalties, Fux deu prazo aos
deputados para organizar a derrubada de outros vetos da presidente.
Um dos principais líderes da bancada
ruralista, o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) afirma não ter dúvidas de que
cairão os vetos que Dilma apôs ao Código Florestal. Declara que são grandes as
chances de ruírem também os vetos impostos ao fator previdenciário e ao trecho
da emenda da saúde que obrigava o governo a elevar a parcela de investimentos
no setor sempre que o PIB crescesse.
“O ministro Fux atirou num rato e
acertou numa onça. Ele não sabia o que estava escondido na moita”, disse
Caiado. Ao impor às votações uma ordem cronológica, o ministro do Supremo
obrigou o Congresso a deliberar sobre outros 3.059 vetos presidenciais antes de
chegar ao veto referente à repartição dos royalties petrolíferos.
Se tivesse prevalecido o ritmo de toque
de caixa, com a votação coletiva de todos os vetos numa única sessão, Dilma
receberia do Congresso o que Caiado chama de “presente de Natal”. Na pressa de
obter os dividendos do petróleo, as bancadas de Estados não produtores de óleo
manteriam intactos os outros vetos.
Caiado resumiu a cena: “Não teríamos
tempo para nos articular. Todos os outros vetos seriam mantidos e nós
passaríamos por otários. Acabaríamos com todo o passivo de vetos de mais de dez
anos. Passaríamos a régua em tudo em função de um acordo que envolvia os
royalties.”
“Agora, a coisa muda de figura”,
prossegue Caiado. “Nós é que ganhamos um presente natalino. A cada veto
pautado, vai haver uma mobilização. Vamos dar o troco na Dilma. Esse é que o
jogo. Vale para o Código Florestal, para o fator previdenciário, para a Emenda
29 da saúde, para tudo que tem interesse.”
Para derrubar um veto presidencial, são
necessários os votos de 41 senadores e 257 deputados. As votações são secretas,
o que permite aos congressistas decidir sem medo de sofrer retaliações do
Planalto. Caiado e seus colegas de oposição lamentaram que, na última hora,
Luiz Fux tenha recuado em relação à abrangência de sua decisão.
No despacho em que tratou da encrenca dos vetos, o
ministro anotara que a matéria está disciplinada no artigo 66 da Constituição.
O parágrafo 4o desse
artigo prevê que os vetos presidenciais terão de ser votados pelo Congresso
“dentro de trinta dias, a contar de seu recebimento.”
No parágrafo 6o do mesmo artigo, está escrito que,
esgotado o prazo de 30 dias, o veto “será colocado na ordem do dia da sessão
imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final.” Em
português claro: ou o Congresso votaria o veto ou não poderia votar mais nada.
Guiando-se por essa interpretação, José
Sarney (PMDB-AP), presidente do Senado e do Congresso, adiou para fevereiro de
2013 a votação do Orçamento da União. Depois, provocado pelo próprio Sarney e
pelo ministro Luiz Inácio Adams, chefe da Advocacia Geral da União, Fux deu
meia-volta. Esclareceu que o bloqueio da pauta limitava-se à votação dos vetos.
Não incluía outros projetos, muito menos ao Orçamento.
Para os líderes do DEM e do PSDB, a
reinterpretação dada por Fux ao seu próprio despacho não orna com o texto
constitucional. Não está escrito em nenhum artigo ou parágrafo que o bloqueio
se limita aos vetos. “A Constituição é clara: ou vota-se o veto no prazo de um
mês ou pára o Congresso”, afirma Caiado.
A decisão de Fux, por liminar
(temporária), terá de passar pelo plenário do STF. A expectativa da oposição é
a de que prevaleça no julgamento do mérito a tese do bloqueio total da pauta.
Desse modo, a lógica do processo legislativo seria restaurada. A palavra final
sobre as leis voltaria a ser dada pelo Congresso. Do modo como ocorre hoje, o
Planalto impõe sua vontade por meio dos vetos.
“Nas várias presidências do Sarney e de
outros, o processo legislativo foi aviltado”, queixa-se Caiado. “Eles fizeram
com que os vetos nunca fossem apreciados. Por isso há 3.060 vetos pendentes de
votação. Passou a ser uma prerrogativa deles arquivar os vetos. Isso tem que
acabar. E a polêmica provocada pelos royalties é uma boa oportunidade para
acabar com essa farra.”
A reinterpretação de Fux não altera os
planos da oposição em relação ao atual passivo dos vetos antigos. Esses, em função
do interesse da maioria do Congresso em resolver a pendência das verbas do
petróleo, terão de ser votados de qualquer jeito. O problema é quanto ao
futuro. Se vingar a tese de que o bloqueio da pauta se restringe aos vetos,
corre-se o risco de novas manobras. Os vetos voltariam a ser escondidos até que
surgisse outro tema capaz de mobilizar os congressistas a ponto de forçar
reabertura das gavetas. Hoje, há vetos que aguardam na fila há 12 anos. Sabe
Deus quando vai surgir um pé-de-cabra com a força dos royalties.
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