Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente
da República, como se sabe, reuniu-se anteontem com o prefeito de São Paulo,
Fernando Haddad (PT), a vice, Nádia Campeão, e 10 secretários municipais. Deu
uma aula sobre como deve funcionar a Prefeitura, a necessidade de parcerias com
o governo federal e do estado, as prioridades da gestão etc. Lula não exerce
cargo nenhum nem mesmo no PT. Se o Apedeuta fosse rei do Brasil, como Elizabeth
é rainha da Inglaterra, não poderia se entregar a essas larguezas. Ocorre que o
homem tem vocação para monarca absolutista.
Fernando Haddad, que já é tratado por
setores da grande imprensa paulistana, com menos de três semanas de mandato,
como o maior prefeito de todos os tempos, abriu-lhe as portas, com o devido
tapete vermelho. O prefeito Coxinha fez da Prefeitura um reduto do lulismo.
Se Haddad pratica a sujeição voluntária,
com Dilma Rousseff será um pouco diferente. Na segunda, o monarca reúne
integrantes do primeiro escalão do governo federal para tratar de política
externa. Trata-se de um evento patrocinado pelo instituto que leva seu nome.
Participam do encontro o ministro da Defesa, Celso Amorim (um lulista
fanático), Marco Aurélio Garcia, assessor especial da presidente, e Luciano
Coutinho, presidente do BNDES. Na plateia, estarão intelectuais petistas,
ex-ministros, políticos os mais variados e convidados da América Latina. O
Babalorixá de Banânia viaja depois para Cuba, onde está internado Hugo Chávez.
Em fevereiro, já anunciou que passa a viajar pelo país, numa espécie de
reedição das tais Caravanas da Cidadania.
Afinal, o que quer Lula? A resposta não é
simples. Oficialmente, ele e seus sequazes dirão que estão atuando para
fortalecer o governo Dilma, cuja reeleição, para todos os efeitos, não duvidem,
ele defenderá. Perdem, ademais, o seu tempo os que imaginarem que dá para
investir numa eventual dissensão aberta entre a atual mandatária e o ex. Isso
não vai acontecer.
A movimentação de Lula, no entanto,
evidencia — muito mais do que apenas “sugere” — que ele não está contente com o
papel de ex-presidente. Ora, para todos os efeitos, convenham, Dilma o
representa. Foi feita candidata por ele, mantém um governo com uma maioria
esmagadora de petistas, não cansa de exaltar as virtudes do antecessor etc. O
país vive, sim, um momento de baixo crescimento da economia, mas é visível que
isso ainda não se transformou em movimentos de opinião. Sem uma oposição
para politizar a crítica, Dilma segue sendo uma figura pública popular e faz, a
despeito da própria gestão, um governo aprovado pela esmagadora maioria,
segundo indicam as pesquisas ao menos.
Assim, escreva-se o óbvio: Dilma não corre
risco político nenhum que tenha raiz na oposição ou na população. O governo
segue com uma maioria folgada no Congresso, e a governanta tem a simpatia de
boa parte da imprensa. Por que Lula precisaria percorrer o país? A liderança da
hora, no seu terreno ideológico, chama-se Dilma Rousseff, goste ele ou não.
Qual o propósito de um seminário-aula para alguns figurões do governo e do novo
périplo pelo país?
Um só: lembrar que ele está no jogo e que
é, de fato, o “criador da criatura”. Ainda que Dilma negue, ainda que compareça
em pessoa ao seminário, ainda que se deixe fotografar ao lado do Apedeuta, é
evidente que um evento com essas características e com esses convidados agride
a sua autoridade de presidente e lhe mina a credibilidade junto a setores
importantes da sociedade.
Que se diga: ainda que Lula não tivesse a
intenção de “pôr Dilma em seu devido lugar”, isso se daria na prática, dada a
dimensão que ele tem no partido. O seminário, em si, com aquelas personagens,
já é um despropósito, mas ainda se pode condescender: “Ah, se institutos não
fizerem coisas assim, farão o quê?”. Mas e a nova “caravana”? Qual é o
propósito?
Não há mensagem que Lula possa passar aos
brasileiros que não esteja, hoje em dia, a cargo de Dilma, que o sucedeu,
ungida por suas próprias mãos. Ao tomar o lugar que cabe à presidente, o
ex-mandatário ocupa a posição que avalia lhe caber por direito divino. Caso
realmente decida percorrer o país, quando menos, Lula impõe à sua sucessora uma
pauta. A fatura máxima dessa iniciativa levaria Dilma a abrir mão da reeleição
em nome de um valor mais alto que se alevantasse: Lula!
Não, senhores! Desta vez, ele não
que sair pelo Brasil pra confrontar e afrontar “a direita”; desta vez, ele não
sairá por aí a demonizar FHC e os “300 picaretas”; desta vez, ele não vai
oferecer o seu PT como alternativa “àqueles que mandamnestepaiz desde
1500”.
A única a ter seu prestígio desgastado com
este Lula buliçoso é Dilma, por mais que ambos troquem publicamente juras de
eterno amor e mútua admiração. Segundo pesquisas de opinião, justa ou
injustamente, ela conseguiria se reeleger hoje por suas próprias pernas. O
Apedeuta não suporta a ideia de que se tornou obsolescente. Por isso assombra a sua sucessora.
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