Entrevista: Eleuses Paiva
VEJA
Um dos principais opositores no Congresso Nacional ao Mais Médicos, programa anunciado pelo governo federal para salvar
a saúde pública do país importando profissionais estrangeiros, o deputado
Eleuses Paiva (PSD-SP) afirma que a medida tenta camuflar a verdadeira intenção
do governo: “É um balão de ensaio para trazer 25 000 médicos de Cuba.”
Professor e integrante do setor de medicina nuclear do
Hospital de Base de São José do Rio Preto e do Hospital Sírio Libanês, em São
Paulo, o deputado afirma que as universidades de medicina do país “estão de
luto” e ataca o ministro Aloizio Mercadante, que, apesar de ser titular da
Educação, assumiu o papel de articulador do governo no Congresso: “Ele não
entende nada do assunto”. Leia trechos da entrevista ao site de VEJA:
Como o programa Mais Médicos foi recebido
pelo Congresso? Essa
medida é tão constrangedora que não tem nenhum deputado da área de saúde do PT
participando da comissão [que analisa o tema]. Ninguém aceitou ir para um
desgaste desse. A discussão é autoritária, não dá para negociar. Alguns
parlamentares, a pedido do Ministério da Saúde, querem discutir o tempo de
atuação no SUS [de dois anos, de acordo com a proposta], se diminui para um ano
ou para seis meses. O ponto é que a forma de fazer essa discussão não é por
meio de medida provisória, por ato autoritário. A forma de fazer a discussão é
dentro das universidades, no Conselho Nacional de Educação.
O que o senhor achou da mudança de
discurso quando o governo falou em trazer médicos espanhóis e portugueses? Esse balão de ensaio realmente é para trazer médico
cubano. Há quatro anos, a Venezuela teve a importação de 25 000 médicos cubanos
pelo governo Hugo Chávez. A Federação Médica Venezuelana nos disse que tinha
sérias dúvidas se essas pessoas eram médicas de verdade, porque as condutas
profissionais que elas tomavam eram absurdas. É justamente esse acordo que nós
desconfiamos que o governo brasileiro esteja fazendo, porque esses médicos têm
um contrato com o governo venezuelano que acaba agora. Eles estão retornando
para Cuba e são justamente os 25 000 que estavam trazendo para o Brasil quando
nós os emparedamos. Baseado nisso, o ministro [Alexandre] Padilha, que é uma
pessoa muito boa para desviar a rota, diz que vai trazer profissionais
portugueses e espanhóis. A notícia que nós temos, e que provavelmente o ministro
dará, é que serão dez portugueses, vinte espanhóis e 25 000 médicos cubanos. O
foco da discussão, na realidade, é médico cubano. É isso que ele está tentando
trazer.
Então o senhor é contra a importação de
médicos estrangeiros? Ninguém
é contra a entrada de médicos estrangeiros neste país. O que estamos discutindo
é qual profissional nós vamos trazer sob o ponto de vista de qualidade e de
conhecimento. Nós não podemos trazer profissionais despreparados, com
conhecimento precário. As provas do Revalida, quando aplicadas em médicos
oriundos de Cuba, tiveram reprovação de mais de 90%. Recentemente, avaliaram o
quinto e o sexto ano da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e o índice
de aprovação beirou 80%. Se um reprova 90%, e outro aprova 80%, que tipo de
profissional estamos trazendo para o nosso país?
Como o governo está reagindo às críticas? Agora está tentando o casuísmo. Em vez de assumir a
impossibilidade de uma medida provisória como essa, tenta criar casuísmos para
poder sobreviver. Estão propondo avaliar quarenta escolas de medicina para ver
o nível delas, mas são as quarenta piores avaliadas pelo MEC. Eles querem
rebaixar o nível. Quando eu vejo um ministro brigar para rebaixar enquanto quem
está na área acadêmica briga para melhorar sempre, é um absurdo. A sociedade
tem de ficar revoltada. É o que eu falo: coisa de ministro que não é da área. O
Mercadante não é um educador, não entende nada do assunto e resolveu agora
virar um educador.
O problema do Brasil é a falta de médicos? Hoje, no Brasil, se formam 16 000 médicos por ano. Não
é possível alguém achar que, ao formar mais 12 000 e levar o aparelho formador
para 28 000 profissionais, o problema será resolvido. Com 16 000 já tem
problema de qualidade de docentes, diagnosticado pelo MEC. Já tem problema de
hospital de ensino, de estrutura dessas escolas. Como vai dobrar o número por
medida provisória? Ninguém que tenha o mínimo de bom senso acha que isso pode
ser feito em curto espaço de tempo. Então é uma medida eleitoreira. As três
principais mudanças são totalmente inconsequentes e sem nenhum conteúdo
técnico.
Já foram apresentadas 567 emendas, 31 só
do senhor. Dá para acreditar que sairá do Congresso outra – ou nenhuma –
proposta? Eu
tendo a acreditar nisso. Se o governo tiver o mínimo de responsabilidade, ele
retira essa medida provisória. Até porque não é normal uma medida ter mais de
500 emendas. Eles conseguiram uma unanimidade: todas as medidas tentam resgatar
que não se mexa na autonomia universitária, que é importante avaliar a
competência profissional, que o aparelho formador tem que ter critérios
técnicos. Particularmente, tenho minhas sinceras dúvidas se será aprovado. AQUI
Um comentário:
Câncer e defenestração
A defenestração do Collor foi feita no esplendor de uma república refundada, forte e eivada de esperanças. Tratava-se apenas de expurgar um grupelho. Foi café pequeno. Uma amputação incruenta.
Agora, temos um enorme câncer (encabeçado por alguns cancerosos e outros psicopatas); metástases por todo o Estado e pelas instituições sociais desde as universidades aos sindicatos, passando por organizações informais paramilitares e até tribos indígenas, sem falar das religiões aliciadas. O expurgo só será feito com um banho de sangue. Em sã consciência, não o desejo nem o propago, mas temo que seja o único caminho que a sociedade necessariamente trilhará para se livrar de tanto mal que nos assola.
Não creio em negociações, via eleitoral, nem na via judicial para a solução de nossos problemas. Há de ser no campo de honra, já que se trata de questões de valores que estão em pauta.
http://orbasmeas.blogspot.com.br/
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