Governo federal libera ofícios enviados
e recebidos por homem forte do início da gestão Lula que explicitam troca de
cargos por apoio parlamentar, intervenção para audiência com empresa privada e
investigações internas de integrantes da máquina pública
Documentos oficiais obtidos pelo Estado -
entre correspondências confidenciais, bilhetes manuscritos e ofícios - revelam
os bastidores da atuação de José Dirceu no comando da Casa Civil, entre janeiro
de 2003 e junho de 2005. Liberados com base na Lei de Acesso à Informação, os
papéis enviados e recebidos pelo homem forte do governo Luiz Inácio Lula da
Silva explicitam troca de favores entre governo e partidos aliados,
intervenções para que empresários fossem recebidos em audiências e controle
sobre investigações envolvendo nomes importantes da máquina pública.
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Dirceu deixou o governo em meio ao escândalo do mensalão, acusado de comandar uma "quadrilha" disposta a manter o PT no poder via compra de votos no Congresso - ele é um dos 37 réus do julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal. Desde a saída do governo, mantém atuação partidária e presta serviços de consultoria a empresas privadas no Brasil e no exterior.
Uma centena de ofícios dos primeiros anos do governo Lula agora tornados
públicos trata quase exclusivamente da ocupação dos cargos públicos por partidos
aliados. Sob a "incumbência" de Dirceu, Marcelo Sereno, seu chefe de
gabinete e braço direito, despachava indicações de bancadas, nomeações e
currículos para os mais variados cargos federais.
A troca de ofícios com o então presidente do PL (hoje PR), deputado
Valdemar Costa Neto, não esconde os interesses de cada um. O assunto é a
negociação de cargos-chave na Radiobrás. Em ofício arquivado na Presidência com
o número 345/Gab-C.Civil/PR, Valdemar indica nomes à estatal federal de
comunicação e acrescenta: "Certo de que V.Exa. poderá contar com apoio
integral desta Presidência e da Bancada do Partido Liberal no Congresso."
Em 27 de fevereiro de 2003, Dirceu ordena que a demanda seja encaminhada
ao então presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci.
Valdemar viria a ser denunciado mais tarde sob a acusação de integrar a
"quadrilha" do mensalão por ter recebido dinheiro do valerioduto.
Hoje deputado pelo PR, o parlamentar também aguarda a sentença do STF.
Os documentos liberados também mostram pedidos de colegas de partido de
Dirceu. Em 11 de fevereiro de 2003, por exemplo, a deputada estadual petista
Maria Lúcia Prandi envia mensagem onde diz tomar "a liberdade de
estabelecer contato no sentido de solicitar audiência para tratar de questões
referentes à condução de articulações no sentido de consolidar a relação
partidária com as ações governamentais, em especial assuntos relativos à
atuação desta parlamentar na Baixada Santista".
Outro ofício recebido pelo Planalto mostra o então presidente do
Diretório Regional do PT em Sergipe, Severino Oliveira Bispo, pedindo a Dirceu
para tratar da seguinte pauta: "1) Apresentação da relação dos nomes dos
indicados para os cargos federais no Estado; 2) O que mais ocorrer".
A documentação liberada revela uma ordem da Casa Civil a favor de uma
empresa. Em 13 de março de 2003, a pedido de Dirceu, Marcelo Sereno intermedeia
pedido de audiência de representantes da Ondrepsb Limpeza e Serviços Ltda. no
Ministério da Justiça. Naquele ano, a empresa de Santa Catarina recebeu R$ 2,9 milhões
do governo federal. Em 2004, ganhou R$ 3,9 milhões. Segundo dados do Sistema
Integrado de Administração Financeira (Siafi), a média de pagamentos dos três
anos posteriores ao ofício foi 100% maior em comparação ao mesmo período que
antecedeu a intervenção.
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