O MST perdeu uma bandeira - Por Denis Rosenfield

É da maior importância a Ação Civil Pública impetrada pelo Ministério Público gaúcho contra o MST, numa defesa intransigente do direito de propriedade, da democracia representativa e do Estado de Direito. Nenhum MP, estadual ou federal, adotou uma atitude semelhante. Em todo caso, trata-se de uma novidade que, fazendo jurisprudência, pode fazer com que o País fortaleça as suas instituições, faça valer as suas leis e produza uma maior segurança jurídica, condição para a paz pública.

A ação do Ministério Público foi imediatamente acolhida pelo juiz de Carazinho, RS, que, em caráter liminar, deferiu o pedido. Este reside, primeiramente, na desocupação dos acampamentos limítrofes à Fazenda Coqueiros , mais de uma dezena de vezes invadida, objeto de mais de uma centena de ações criminosas e considerada produtiva pelo Incra e pela Ouvidoria Agrária Nacional .

Esses acampamentos, cedidos ao MST ou arrendados, constituíam verdadeiras bases operacionais de suas ações, fustigando a fazenda com o intuito de inviabilizá-la economicamente.

A Ação Civil Pública considera esses acampamentos bases operacionais para ações criminosas, não tendo nada a ver com a reforma agrária. Uma vez deferida a liminar, a Brigada Militar cumpriu a ordem judicial, chegando aos acampamentos de madrugada, pegando o MST desprevenido. Suas lideranças lá não estavam e os seus ocupantes não ofereceram nenhuma resistência. A desocupação foi pacífica, com a Brigada Militar desmontando completamente os acampamentos. A governadora Yeda Crusius tomou a decisão de cumprir imediatamente a ordem judicial. Houve, portanto, uma sintonia republicana entre o MP, o Judiciário e o Executivo, com a Brigada Militar assumindo plenamente as suas funções.

O MST acusou recepção. Em seu site chegou, em dois dias, a publicar cinco matérias sobre o caso quando, normalmente, publica de quatro a cinco informações e análises por dia. Em todo caso, pareceu completamente desnorteado, denunciando um suposto clima de luta anticomunista prévio a 1964. Pôs em causa a Veja , o Estadão e o MP gaúcho. Em nenhum momento contestou as informações e as análises, procurando, todo o tempo, simplesmente desqualificá-las. O problema é que os fatos citados e analisados são muito sólidos e os emessistas não querem entrar no mérito deles, pois, assim, os convalidariam. Utilizaram a tática esquerdista, muito usada, de desqualificar ou denegrir os que embasam a análise. O documento do MP parte de uma compreensão correta da natureza do MST, apoiado em sólida documentação e provas.

Documentos são utilizados, livros analisados, jornais e revistas pesquisados. Depoimentos de policiais militares, invadidos e invasores são colhidos. O resultado consiste em mostrar a natureza revolucionária , leninista , do MST, que age entre a legalidade e a ilegalidade, seguindo uma tática elaborada por Lênin, em seu livro O que fazer? . Joga com a democracia como um instrumento empregado para subvertê-la, não tendo nenhum valor em si mesmo. Age na ilegalidade cometendo os mais diferentes tipos de crime: esbulho possessório, formação de quadrilha, uso de armas, seqüestros, etc., mostrando o seu pouco apreço pelas leis e pelo direito de propriedade. Age na legalidade apresentando-se como um movimento social que possui escolas e conta, mesmo, com financiamento público. Usa o espaço público democrático com o intuito de repetir as experiências socialistas autoritárias e/ou totalitárias. A relativização da propriedade privada é uma condição, para eles, de instauração de sua própria dominação socialista.

No passado, a fonte principal de financiamento do MST era constituída por doações internacionais, em particular a Igreja Católica, mediante a organização internacional Caritas . Hoje, ela foi substituída por recursos provenientes do próprio Estado brasileiro, isto é, do bolso dos contribuintes.

Eles são de dois tipos: diretas e indiretas. As diretas provêm dos seguintes ministérios e órgãos estatais: a) Ministério do Desenvolvimento Agrário e Incra, mediante recursos dados à formação de militantes e auxílios como lonas e tendas usadas nas invasões; b) Ministério do Desenvolvimento Social, com os recursos destinados aos assentados e acampados mediante o Bolsa-Família e a Cesta Básica ; c) Ministério da Educação, através do financiamento das "escolas" emessistas e seus cursos de "formação" de professores.

As indiretas - pelos mesmos ministérios - são mediadas por organizações-laranjas. Destacam-se entre elas, conforme já apurado pelo CPMI da Terra , a Anca , o Iterra e a Concrab . Essas organizações se cruzam com o MST tanto nos endereços, nos sites, em dirigentes, em destinação de recursos e em contas bancárias. Esses acordos e convênios, plenos de irregularidades, conforme já contestado pelo Tribunal de Contas da União, exibem desvios de recursos públicos para financiar atentados ao Estado de Direito e à democracia representativa.

A Ação Civil Pública procura a responsabilização jurídica do MST, não se resignando a uma suposta não-personalidade jurídica, que ampararia seus crimes e seus propósitos revolucionários. Para isto, lança mão do conceito de personalidade judiciária . A personalidade judiciária é um conceito que dá conta de uma "comunidade de fato", que se traduz por lideranças reconhecidas, interlocução com órgãos estatais, presença na mídia e endereço conhecido. Não se pode tampouco desconhecer que essa organização política não adotou personalidade jurídica para fugir dos rigores da lei, com o intuito de agir impunemente, afrontando sistematicamente o Estado de Direito.

Comunidades de fato e, nesta perspectiva, pessoas "formais" podem ser litigadas em juízo. Logo, o MST pode configurar o pólo passivo da ação impetrada pelo Ministério Público. Abre-se, portanto, a possibilidade de que o próprio MST possa ser, no futuro, considerado "ilegal", o que lhe retiraria legitimidade política e cortaria suas fontes de financiamento.

Denis Lerrer Rosenfield é professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Jornal do Comércio -



Reportagem Especial
POR QUE DUELAM PROCURADORES E SEM TERRA GAÚCHOS

Conflitos sem fim – Por Humberto Trezzi – Jornal Zero Hora

O Estado que viu nascer o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) há mais de duas décadas discute agora a sua extinção.

Uma proposta do Conselho Superior do Ministério Público (MP), apreciada em 2007, previa a decretação da ilegalidade do MST. A justificativa eram dezenas de invasões e depredações que teriam sido praticadas pelos sem-terra no Rio Grande do Sul. A idéia não prosperou e foi retificada em outra reunião do conselho, porque os procuradores de Justiça concluíram que o movimento é legítimo e ações judiciais "só devem ser empreendidas para corrigir rumos quando constatada alguma ilegalidade".

Mas, apesar de se recusar a propor o fim do MST, procuradores de Justiça e promotores têm feito um cerco às ações dos sem-terra. A pedido do MP, a Justiça de Carazinho despejou militantes do MST de duas áreas que tinham arrendado - e a partir das quais realizavam invasões sistemáticas da Fazenda Coqueiros, uma das maiores do Estado, localizada em Coqueiros do Sul. Outra decisão, de um juiz eleitoral, suspende os títulos de eleitor dos que estavam acampados em Coqueiros para investigação de possíveis irregularidades.

A ofensiva não pára aí. Uma terceira ação, relativa à invasão do horto florestal da Fazenda Barba Negra, em Barra do Ribeiro, denuncia 37 integrantes da Via Campesina por dano, furto, cárcere privado, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro - incluindo o líder nacional do MST João Pedro Stédile. Além disso, quatro despachos judiciais concedidos semana passada proíbem marchas do MST no entorno das fazendas Southall (São Gabriel), Nenê (Nova Santa Rita), Coqueiros (Coqueiros do Sul) e Palma (Pedro Osório), todas invadidas nos últimos anos.

Por último, uma ação federal processa oito militantes do MST com base na Lei de Segurança Nacional, criada durante a ditadura militar. Os sem-terra foram denunciados pela procuradora da República Patrícia Muxfeldt, de Carazinho, por crimes praticados contra a Coqueiros. Entre eles, prática de "depredação e explosão por inconformismo político" e "fazer propaganda da luta entre as classes sociais". Os sem-terra são acusados pela explosão de três tratores e o incêndio de três caminhões, entre outros delitos.

- Eles afrontaram o Estado de direito de forma sistemática - justifica Patrícia.
Movimento será alvo de investigação na Assembléia

O MST considera que as ações judiciais - que incluem ainda investigação do uso de verbas públicas para sustentar os acampamentos e o uso da terra dos assentamentos - são um complô da Brigada Militar (representada pelo comandante, coronel Paulo Roberto Mendes), procuradores e juízes contra "os movimentos sociais". Acusação que o juiz criminal de Carazinho, Orlando Faccini Neto, considera "ridícula". Autor da ordem de despejo dos sem-terra em Coqueiros do Sul, ele diz que tomou a decisão com base em mais de 130 relatos de crimes praticados pelo MST nas imediações de acampamentos.

- Nem eu e nem ninguém do Judiciário politizamos decisões. O que fiz foi coibir atos criminosos praticados por sem-terra e prevenir outros - diz.

O MST será alvo de uma comissão de representação externa na Assembléia. O deputado Nelson Härter (PMDB) pedirá na terça-feira abertura da comissão para apurar repasse de recursos públicos a ONGs ligadas ao MST e à Via Campesina.


O que dizem:

PATRÍCIA MUXFELDT, procuradora da república
"Eles (os sem-terra) afrontaram o Estado de direito de forma sistemática."

ORLANDO FACCINI NETO, juiz de Carazinho
"Nem eu nem ninguém do Judiciário politizamos decisões. O que fiz foi coibir atos criminosos."

GUILHERME CASSEL, ministro do Desenvolvimento Agrário
"Que todo mundo fique atento. É preciso acabar com essa escalada de violência contra os movimentos."



“O MST DEVE SER DECLARADO ILEGAL”
Entrevista: Gilberto Thums, procurador de Justiça -


Há quem diga que o MST continua sendo o maior e mais representativo defensor da reforma agrária no país. Há quem considere que essa causa foi abandonada pelos sem-terra, que aspirariam agora a um projeto político de controle do aparelho do Estado. Um dos mais veementes é o procurador de Justiça Gilberto Thums, 53 anos, que atua junto à 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça (TJ) e também é professor na Escola Superior do Ministério Público do Estado. É dele a proposta, não aprovada, de que o MST seja declarado ilegal.


A seguir, uma síntese da entrevista:

Zero Hora - Por que o senhor quer pôr o MST na ilegalidade?

Gilberto Thums - O MST deve ser declarado ilegal porque usa táticas de guerrilha. Os acampamentos são usados para molestar fazendeiros, ameaçá-los de morte. Os sem-terra usam e abusam do saque e até de explosivos. Os objetivos iniciais do movimento eram 100% aceitáveis, mas seus métodos são ilegais. É isso que combatemos.

ZH - O senhor não acha que colocando na ilegalidade os sem-terra vai ajudar a empurrá-los para o crime?
Thums - Quem os empurra ao crime são seus líderes. Os acampados são excluídos, ninguém é imbecil de não reconhecer isso, mas são usados por uma turma que só quer esculhambar o país. Infelizmente, nos acampamentos mandam os radicais. É uma pena, porque a reforma agrária tem de ser feita, e o Estado pode até ser responsabilizado por não dar terra a quem precisa. Só que isso não justifica agir fora da lei, como faz o MST.

ZH - O senhor vai mesmo pedir intervenção nas escolas administradas pelo MST?
Thums - O Ministério Público vai sugerir isso em algum momento. Existe uma geração de sem-terra formada nessas escolas com base numa ideologia radical. Ela prega um conteúdo didático de luta de classes e contra o Estado, embora seja sustentada com dinheiro público. Não é uma contradição? Além disso, cantam o hino de Cuba mais do que o do Brasil. Isso não é possível tolerar.

ZH - O senhor não teme ser chamado de radical de direita em razão dessas propostas?
Thums - Tento fazer com que prevaleçam a lei e a ordem. Se uma pessoa entrar num supermercado e quebrar tudo, vai para o presídio. Já quando um integrante do MST faz isso, sempre surge alguém que justifica, dizendo ser um "movimento social" o autor dessa barbaridade. Está certo agir assim? Se estiver, podem me chamar de radical. Mas no cumprimento da lei. Jornal Zero Hora

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