Indenizações milionárias geram polêmica e são questionadas

ASSALTO NA CARA DURA


A ampliação do volume de indenizações milionárias concedidas pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça para perseguidos políticos durante o regime militar é motivo de polêmica judicial e já despertou a atenção de órgãos de controle do governo. O Tribunal de Contas da União, por exemplo, questiona os critérios adotados pela comissão na concessão de valores mensais e retroativos como reparação econômica aos perseguidos.

Dois casos recentes que chamaram a atenção do TCU envolvem os jornalistas Jaguar (Sérgio Jaguaribe) e Ziraldo (Ziraldo Alves Pinto), que dirigiam o extinto Pasquim. Pela alegada perseguição durante a ditadura, eles foram beneficiados, cada um, com uma bolada retroativa de R$ 1,2 milhão, além de R$ 4.365,88 mensais pelo resto de suas vidas.

O governo gastou R$ 2,5 bilhões com indenizações concedidas nos últimos sete anos – em cerca de 10 mil casos julgados – e paga, como reparação econômica mensal permanente, mais de R$ 90 milhões. Na fila de julgamento, para conclusão até o final do governo Lula, ainda há mais de 20 mil processos.

A auditoria do TCU nos casos que passaram pela Comissão de Anistia já resultou na abertura de quatro processos para corrigir irregularidades.

O primeiro deles, já acatado e modificado pelo Ministério da Justiça, envolve a ex-ativista Maria Augusta Carneiro Ribeiro. Ouvidora da Petrobras no Rio, Guta reivindicava um pagamento retroativo de R$ 1,5 milhão e mensalidade de R$ 8.200,00. A Comissão de Anistia concordou com o questionamento do TCU e reduziu os valores para R$ 600 mil e R$ 3.500,00, respectivamente. Normalmente, as inconsistências apontadas pelo TCU envolvem determinações arbitrárias de valores de indenizações, com base numa declaração genérica.

Outro caso polêmico, ainda pendente, envolve ex-cabos da Aeronáutica cujas carreiras foram encerradas em 1964 pela proximidade da categoria com o governo do ex-presidente João Goulart. São 3.700 processos nesta situação, sobre os quais a Comissão de Anistia considerou a tese de perseguição política, contestada pelo Ministério da Defesa. O TCU questiona se os afastamentos teriam sido realmente atos de exceção.

Em sua defesa, a Comissão de Anistia alega que houve uma redução considerável dos valores médios pagos pelo ministério a partir do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo representantes da comissão, até 2003, primeiro ano de mandato de Lula, o valor médio das indenizações mensais oscilava na casa dos R$ 6 mil. Hoje, gira em torno dos R$ 2,7 mil. – Jornal do Brasil




TARJAS PRETAS EM 413 LINHAS EM 3 MIL PÁGINAS

Covardia ou conveniência?

É reveladora da alma do governo a decisão de censurar 413 linhas nas 3.000 páginas das atas do extinto Conselho de Segurança Nacional. Os documentos foram enviados para consulta pública no Arquivo Nacional.

As atas do CSN foram produzidas de 1934 a 1988. Depois, o órgão foi extinto. Eram ocasiões onde os principais ministros, chefes militares e o presidente da República discutiam a conjuntura. O general Jorge Armando Felix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, justificou a censura. As tarjas pretas sobre o texto encobrem "expressões jocosas e ofensivas". Algumas dessas frases são dos anos 30. Outras, do período da Guerra das Malvinas (1982).

"Se alguma coisa pode causar constrangimento, nós estamos protegendo", disse o general. Para não parecer implicância, é justo reconhecer que nos últimos anos tem sido inédito o volume de material oficial remetido pelo governo para o Arquivo Nacional. Para por aí a boa vontade. Prevalece em certos bolsões da administração Lula (como também era o caso na de FHC) a estratégia de fazer diplomacia com sigilo dos fatos. Como se os argentinos não soubessem o que se fala deles no Planalto. Os focos de resistência são alguns jecas-tatus inflados de poder no Itamaraty. Têm o raciocínio enroscado na Guerra Fria.

Um país desenvolvido não precisa temer a divulgação de ofensas proferidas há mais de 60 anos. Tarjas pretas em 413 linhas de 3.000 páginas podem parecer pouca coisa. Não são. Mostram a covardia atávica do governo quando se trata de permitir ao país olhar para o seu passado. Expõe outra vez uma cultura arraigada de não-transparência. Até porque, pior do que as tarjas pretas é não haver prazo específico para a sua retirada. Ficarão lá, para sempre. Essa turma gosta mesmo é de sigilo eterno. Fernando Rodrigues – Folha de São Paulo

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