O afastamento de Obama da democratização marca uma grande e infeliz mudança na orientação política. Seu tom apologético e a aparente mudança do círculo de eleitores apontam uma ainda mais fundamental e preocupante direção. - Por Daniel Pipes
Por que avaliar o histórico de um novo presidente americano, e depois de apenas algumas semanas de um mandato de duzentas e nove semanas – e justamente acerca de um tema tão esotérico quanto o Oriente Médio e o Islã?
No caso de Barack Obama, os motivos são estes:
Antecedentes contraditórios: em suas experiências, transbordam contatos com anti-sionistas radicais, tais como Ali Abunimah, Rashid Khalidi e Edward Said; com islamistas, com a Nação do Islã e com o regime de Saddam Hussein; mas, desde que foi eleito, tem feito nomeações predominantemente de centro-esquerda e suas declarações assemelham-se às de seus antecessores no Salão Oval.
O papel desproporcionalmente grande do Oriente Médio e do Islã: a sua primeira quinzena como presidente foi testemunha de um discurso de posse que os mencionava com destaque; de um telefonema para Mahmoud Abbas, da Autoridade Palestina; da indicação de dois enviados de alto escalão para a região; e da primeira entrevista concedida ao canal de TV Al-Arabyia.
O que concluir e esperar dessa rápida sucessão de eventos?
Afeganistão e Iraque: Sem surpresas. Mais ênfase no primeiro e menos no segundo. ("Vocês me verão chegar ao fim dos procedimentos concernentes a uma redução do volume das tropas no Iraque”).
Irã: Uma disposição de dialogar com o regime iraniano misturada a uma frouxa reafirmação da inaceitabilidade das ações de Teerã. ("O Irã tem agido de maneira não… conducente à paz e à prosperidade”).
Conflito árabe-israelense: Uma estranha mistura. Sim, declarações sobre os imperativos de segurança de Israel e nenhuma condenação à sua guerra contra o Hamas. Mas também efusivos elogios ao “Plano Abdullah”, iniciativa que data de 2002 e que propõe a aceitação da existência de Israel pelos árabes em troca da volta às fronteiras de junho de 1967, um plano distinto de outras iniciativas diplomáticas por seus muitos detalhes e questões inconclusos e por sua total dependência da boa-fé árabe. As eleições israelenses em 10 de fevereiro (vencidas pelo Likud, de Benjamin Netanyahu, o novo primeiro-ministro) provavelmente trarão ao poder um governo não favoravelmente inclinado a aceitar esse plano, significando dificuldades nas relações entre os Estados Unidos e Israel mais a frente.
Guerra ao terror: Um analista afirmou que Obama está “dando um fim à guerra ao terror”, mas isto é uma especulação. Logo em 22 de janeiro, Obama referiu-se à “contínua luta contra a violência e o terrorismo”, o que lhe evitou dizer “guerra ao terror”, mas mais tarde, naquele mesmo dia, referiu-se precisamente à “guerra ao terror”. Consideradas as muitas e desajeitadas maneiras pelas quais George W. Bush referia-se a essa guerra, incluindo “a grande luta contra o extremismo que ora grassa pelo mais amplo Oriente Médio”, a inconsistência de Obama, até agora, sugere continuidade das políticas de Bush, mais do que mudança.
Estender a mão ao mundo muçulmano: A referência de Obama quanto ao desejo de retornar “ao mesmo respeito e parceria que a América tinha com o mundo muçulmano há meros vinte ou trinta anos atrás” modifica a história, ignorando que 1989 foi um ano ruim e que 1979 foi o pior de todos nas relações americano-muçulmanas. (Somente em novembro de 1979, Khomeini derrubou o xá do Irã e então se apoderou da Embaixada americana em Teerã, enquanto uma insurgência islamista em Meca inspirou uma onda de ataques contra legações americanas em oito países de maioria muçulmana).
Democracia: Todavia, voltar-se para os bons e velhos dias de “vinte ou trintas anos atrás” de fato contém uma mensagem real, conforme ressalta Fouad Ajami. Este estilo linguístico sinaliza “um retorno à Realpolitik e ao conceito de volta ao normal, apesar de tudo’” nas relações com o mundo muçulmano. A “agenda da liberdade” de Bush esteve em retirada por três anos; agora, com Obama, os tiranos podem respirar ainda mais facilmente.
Finalmente, há a questão da ligação pessoal de Obama com o Islã. Durante a campanha, ele condenou a discussão sobre suas conexões com o Islã, classificando-as de “promotoras do medo” e aqueles que exploravam o tema acabaram por serem eles mesmos vilipendiados. Ele desencorajou o uso de seu nome do meio, Hussein, de forma tão severa, que John McCain desculpou-se quando um orador que o antecedeu num evento de campanha ousou mencionar “Barack Hussein Obama”. Depois da eleição, as regras mudaram radicalmente, com o juramento de posse administrado a “Barack Hussein Obama” e com o novo presidente dizendo voluntariamente: “Eu tenho muçulmanos entre os membros da minha família, eu vivi em países muçulmanos”.
Já é ruim o suficiente que ligações de família com o Islã, percebidas como uma desvantagem durante a campanha, sejam subitamente exploradas uma vez no cargo e a fim de conquistar a boa vontade muçulmana. Pior, tal como observa Diana West: “... desde Napoleão, nenhum líder de uma superpotência ocidental fez, de forma tão desembaraçada (ou destituída de vergonha), uma jogada política para os olhos e ouvidos do povo do mundo muçulmano”.
Resumindo, enquanto o afastamento de Obama da democratização marca uma grande e infeliz mudança na orientação política, seu tom apologético e a aparente mudança do círculo de eleitores apontam uma ainda mais fundamental e preocupante direção.
Daniel Pipes é jornalista e historiador, especialista em islamismo e Oriente Médio, membro do U.S. Institute of Peace e colunista do New York Sun e The Jerusalem Post.
Tradução: Henrique Paul Dmyterko – Diário do Comércio
Por que avaliar o histórico de um novo presidente americano, e depois de apenas algumas semanas de um mandato de duzentas e nove semanas – e justamente acerca de um tema tão esotérico quanto o Oriente Médio e o Islã?
No caso de Barack Obama, os motivos são estes:
Antecedentes contraditórios: em suas experiências, transbordam contatos com anti-sionistas radicais, tais como Ali Abunimah, Rashid Khalidi e Edward Said; com islamistas, com a Nação do Islã e com o regime de Saddam Hussein; mas, desde que foi eleito, tem feito nomeações predominantemente de centro-esquerda e suas declarações assemelham-se às de seus antecessores no Salão Oval.
O papel desproporcionalmente grande do Oriente Médio e do Islã: a sua primeira quinzena como presidente foi testemunha de um discurso de posse que os mencionava com destaque; de um telefonema para Mahmoud Abbas, da Autoridade Palestina; da indicação de dois enviados de alto escalão para a região; e da primeira entrevista concedida ao canal de TV Al-Arabyia.
O que concluir e esperar dessa rápida sucessão de eventos?
Afeganistão e Iraque: Sem surpresas. Mais ênfase no primeiro e menos no segundo. ("Vocês me verão chegar ao fim dos procedimentos concernentes a uma redução do volume das tropas no Iraque”).
Irã: Uma disposição de dialogar com o regime iraniano misturada a uma frouxa reafirmação da inaceitabilidade das ações de Teerã. ("O Irã tem agido de maneira não… conducente à paz e à prosperidade”).
Conflito árabe-israelense: Uma estranha mistura. Sim, declarações sobre os imperativos de segurança de Israel e nenhuma condenação à sua guerra contra o Hamas. Mas também efusivos elogios ao “Plano Abdullah”, iniciativa que data de 2002 e que propõe a aceitação da existência de Israel pelos árabes em troca da volta às fronteiras de junho de 1967, um plano distinto de outras iniciativas diplomáticas por seus muitos detalhes e questões inconclusos e por sua total dependência da boa-fé árabe. As eleições israelenses em 10 de fevereiro (vencidas pelo Likud, de Benjamin Netanyahu, o novo primeiro-ministro) provavelmente trarão ao poder um governo não favoravelmente inclinado a aceitar esse plano, significando dificuldades nas relações entre os Estados Unidos e Israel mais a frente.
Guerra ao terror: Um analista afirmou que Obama está “dando um fim à guerra ao terror”, mas isto é uma especulação. Logo em 22 de janeiro, Obama referiu-se à “contínua luta contra a violência e o terrorismo”, o que lhe evitou dizer “guerra ao terror”, mas mais tarde, naquele mesmo dia, referiu-se precisamente à “guerra ao terror”. Consideradas as muitas e desajeitadas maneiras pelas quais George W. Bush referia-se a essa guerra, incluindo “a grande luta contra o extremismo que ora grassa pelo mais amplo Oriente Médio”, a inconsistência de Obama, até agora, sugere continuidade das políticas de Bush, mais do que mudança.
Estender a mão ao mundo muçulmano: A referência de Obama quanto ao desejo de retornar “ao mesmo respeito e parceria que a América tinha com o mundo muçulmano há meros vinte ou trinta anos atrás” modifica a história, ignorando que 1989 foi um ano ruim e que 1979 foi o pior de todos nas relações americano-muçulmanas. (Somente em novembro de 1979, Khomeini derrubou o xá do Irã e então se apoderou da Embaixada americana em Teerã, enquanto uma insurgência islamista em Meca inspirou uma onda de ataques contra legações americanas em oito países de maioria muçulmana).
Democracia: Todavia, voltar-se para os bons e velhos dias de “vinte ou trintas anos atrás” de fato contém uma mensagem real, conforme ressalta Fouad Ajami. Este estilo linguístico sinaliza “um retorno à Realpolitik e ao conceito de volta ao normal, apesar de tudo’” nas relações com o mundo muçulmano. A “agenda da liberdade” de Bush esteve em retirada por três anos; agora, com Obama, os tiranos podem respirar ainda mais facilmente.
Finalmente, há a questão da ligação pessoal de Obama com o Islã. Durante a campanha, ele condenou a discussão sobre suas conexões com o Islã, classificando-as de “promotoras do medo” e aqueles que exploravam o tema acabaram por serem eles mesmos vilipendiados. Ele desencorajou o uso de seu nome do meio, Hussein, de forma tão severa, que John McCain desculpou-se quando um orador que o antecedeu num evento de campanha ousou mencionar “Barack Hussein Obama”. Depois da eleição, as regras mudaram radicalmente, com o juramento de posse administrado a “Barack Hussein Obama” e com o novo presidente dizendo voluntariamente: “Eu tenho muçulmanos entre os membros da minha família, eu vivi em países muçulmanos”.
Já é ruim o suficiente que ligações de família com o Islã, percebidas como uma desvantagem durante a campanha, sejam subitamente exploradas uma vez no cargo e a fim de conquistar a boa vontade muçulmana. Pior, tal como observa Diana West: “... desde Napoleão, nenhum líder de uma superpotência ocidental fez, de forma tão desembaraçada (ou destituída de vergonha), uma jogada política para os olhos e ouvidos do povo do mundo muçulmano”.
Resumindo, enquanto o afastamento de Obama da democratização marca uma grande e infeliz mudança na orientação política, seu tom apologético e a aparente mudança do círculo de eleitores apontam uma ainda mais fundamental e preocupante direção.
Daniel Pipes é jornalista e historiador, especialista em islamismo e Oriente Médio, membro do U.S. Institute of Peace e colunista do New York Sun e The Jerusalem Post.
Tradução: Henrique Paul Dmyterko – Diário do Comércio
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