A casa da mãe joana

QUEEN OF NAPLES VIVE. EM BRASÍLIA

As casas da mãe joana

Casa, comida, empregada doméstica, roupa lavada, celular ilimitado, reforma de apartamentos, decoração, combustível, lazer, passagens aéreas, entrega de pizzas quentinhas, notas geladas, presentes para amigos, mordomias para parentes, aluguel de jatinhos, favorecimentos ilícitos. Casa-grande e senzala, financiadas com dinheiro do povo. Os sustentados da mãe joana, na Câmara e no Senado, se aferram a suas regalias e voltam atrás nas promessas de moralização e transparência.

Sentem-se vítimas de uma campanha de execração. Por isso, vão tirar os bodes da sala. O Senado decidiu fechar com vidro a tribuna de imprensa do plenário, para impedir o acesso dos jornalistas ao cafezinho dos senadores. O presidente da Câmara, Michel Temer, critica “a pancadaria nos jornais”. O senador Gerson Camata, na defesa de um apadrinhado, afirma: “Está um denuncismo de assustar”. O deputado federal Silvio Costa lamenta o “sadomasoquismo”: “A imprensa bate, e o Parlamento fica calado, parece que está gostando”.

É dinheiro demais diante dos grandes roubos? Não. Mas ninguém atura mais as malandragens cotidianas.


O senador petista Tião Viana empresta seu celular de parlamentar para a filha viajar para o México em janeiro, e ela gasta R$ 14.758? Viana só pagou a conta de seu bolso depois de ter sido desmascarado na imprensa. E a denúncia de que a Câmara paga o salário da empregada do ex-vice-líder do PPS Arnaldo Jardim? Logo Jardim, da Frente Parlamentar Anticorrupção. Maria Helena de Jesus ganha R$ 1.608 por mês como secretária parlamentar, mas cozinha, lava e serve cafezinho no apartamento de Jardim. O deputado Betinho Rosado (DEM-RN) consegue ser reembolsado por uma única nota de R$ 4.100, gastos com combustível em determinado posto de gasolina. O deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) apresenta nota fiscal de R$ 2.500, pagos a uma empresa de cobranças por serviço de consultoria. A generosidade do povo brasileiro é tamanha que, aparentemente, sustentamos há seis anos uma funcionária fantasma: a sogra de um assessor de Renan Calheiros, o líder do PMDB no Senado.

Na Câmara e no Senado – como nos bordéis medievais – cada um faz o que bem entende

Nem os políticos se entendem. Os 432 apartamentos funcionais de quatro quartos em Brasília passarão mesmo a ser ao todo 528? A reforma custará R$ 74 milhões ou R$ 150 milhões? Vai acabar ou não o auxílio- -moradia de R$ 3 mil mensais? A cada dia, um deputado ou um senador desautorizam e desmentem uns aos outros. A “verba indenizatória” mensal de R$ 15 mil continuará a ter uso indiscriminado pelos deputados? No ano passado, o Senado gastou R$ 8,6 milhões com as contas de seus celulares. Tudo legal.

O presidente Lula tem suas obsessões e manda demitir o presidente do Banco do Brasil por considerar imorais (não ilegais) os lucros de um banco público. O eleitor tem hoje uma obsessão: moralizar o Congresso.

O senador Cristovam Buarque propôs um plebiscito para saber se a população quer manter aberto o Congresso. O amigo Roberto Freire crucificou Cristovam: “É uma asneira golpista vinda de um democrata e homem de bem”. Muito criticado, Cristovam insistiu: “O Congresso não dura para sempre se não tiver legitimidade diante da opinião pública, se não for capaz de virar o centro das aspirações, dos desejos, da pauta do povo”.

De tanto escândalo e toma lá dá cá, o Congresso virou a casa da mãe Joana para boa parte da população brasileira. Joana viveu no século XIV, foi rainha de Nápoles, exilou-se em Avignon, França, depois de ser acusada de conspiração, e regulamentou os bordéis da cidade com uma norma: “O lugar terá uma porta por onde todos possam entrar”. Joana podia até ter boas intenções, mas acabou assassinada em 1382. A expressão “casa da mãe joana” foi para Portugal e veio para o Brasil como um lugar onde cada um faz o que quer, onde imperam a desordem, a desorganização e o desmando.

Com todo o respeito pelo senador Cristovam Buarque, há em seu discurso impulsivo um erro de princípio. Não se confunde a instituição com aqueles que ali estão. Mas, em algum momento, o sono dos congressistas será perturbado pelo clamor popular. Por RUTH DE AQUINO - é diretora da sucursal de
ÉPOCA no Rio de Janeiro –

Um comentário:

Anônimo disse...

seria ótimo que os Congressistas tivesse o mesmo fim da "Mãe Joana".