Índios entram em conflito pela posse

A RINHA DE URUBUS DE PENACHO

Depois de o STF considerar constitucional a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, ao Norte de Roraima, em área contínua, as organizações indígenas começaram a brigar entre si pelas posses das ocupações.

Uma delas é o lago Caracaranã, em Normandia, distante 190 quilômetros da Capital. O lago, considerado ponto turístico do Estado, foi incluído na demarcação. O antigo proprietário da posse centenária, Joaquim Correia de Melo, 86, deixou o local no mês passado, depois de ser vencido por uma longa batalha judicial. Ele não quis esperar até 30 de abril, data estipulada pelo STF para deixar o lago.

E foi justamente posterior a saída de Joaquim Melo do Caracaranã, que os indígenas iniciaram a confusão. As chaves da propriedade ainda não foram entregues à FUNAI, mas Joaquim confiou o local a um casal indígena que há anos trabalhava com ele no local. Esse casal é ligado à Sociedade em Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima (Sodiurr).

Ao tomar conhecimento do fato, cerca de 20 tuxauas integrantes do Conselho Indígena de Roraima (CIR) se dirigiram até o lago para reivindicar a posse do Caracaranã. Esse questionamento gerou o conflito entre os integrantes das duas facções indígenas.


As informações foram confirmadas pela Polícia Federal (PF). O superintendente regional da PF, José Maria Fonseca, enviou ontem equipes de policiais ao local. Mas segundo ele, cabe à FUNAI dar um ponto final ao entrave.

“Como está dentro da terra indígena, quem vai resolver essa questão de distribuição de terra é a FUNAI. Nós temos que usar de recursos para evitar que haja problema, mas a FUNAI é quem deve ser mediadora desse conflito. Mas se na disputa pela posse houver crime, nós vamos ter que agir”, ponderou Fonseca.

Em entrevista à Folha, por telefone o administrador regional da FUNAI, Gonçalo Teixeira, negou “que exista um conflito entre os índios, mas um questionamento entre eles pela posse do lago Caracaranã”.

“Quando o senhor Joaquim saiu do lago, ele deixou um casal de indígenas para cuidar de lá até ele receber os valores correspondentes à indenização. E quando ele receber vai repassar as chaves à FUNAI. É a FUNAI quem vai destinar as terras para ocupação dos índios”, frisou.

Conforme Teixeira, na quarta-feira passada um grupo de índios do CIR se deslocou até o local e ocupou uma parte do Caracaranã, iniciando o desentendimento. E para piorar ainda mais a situação, uma equipe da Companhia Energética de Roraima (CER) teria ido até a região retirar um transformador da posse.

“Os índios me ligaram e eu informei que o transformador está entre os bens indenizados e que não pode sair de lá. Uma equipe da Polícia Federal e outra da FUNAI já estão lá para resolver a situação”, explicou.

No momento, conforme o administrador, os esforços devem se concentrar na desocupação dos habitantes não-índios da reserva e não em ocupação dos índios. O Caracaranã, conforme ele, servirá nessa fase como uma base da Operação Upatakon 3 e abrigará agentes da Polícia Federal, Força Nacional de Segurança e Funai, no processo de desintrusão. Só depois disso, é que as áreas serão destinadas aos índios.

“Todas as ocupações, sejam fazendas, casas ou áreas de rizicultura, a FUNAI vai receber a chave de cada uma, sentar com as organizações indígenas, não só CIR e Sodiurr como as outras também, e vamos encontrar um consenso para essa situação. Antes não vamos destinar nenhuma fazenda”, frisou.

Gonçalo destacou que nenhum posseiro pode entregar o bem a nenhum indígena. “Esse papel é da FUNAI. Os ocupantes não têm autonomia para destinar o bem. Também estou sabendo que estão retirando cercas de outras fazendas e tudo que for tirado e estiver no laudo não vamos efetuar o pagamento”, disse o gestor da Fundação. ANDREZZA TRAJANO
Folha de Boa Vista -




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Produtores entram com ação para que União indique terras de reassentamento

Os produtores que possuem propriedades na reserva indígena Raposa Serra do Sol devem ingressar na próxima semana com uma ação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a União, para que esta indique quais as terras para realocação deles.

A informação foi repassada à Folha pelo advogado do grupo, Valdemar Albrecht, que defende o interesse de 52 famílias. Conforme ele, o processo de reassentamento é uma obrigação do Governo Federal prevista no decreto 1775/ 96, do Ministério da Justiça, que diz claramente que ‘nas identificações de terras indígenas, constatada a presença de não-índios, o órgão fundiário federal é obrigado a priorizar essas pessoas para assentamento’. “Isso até agora não aconteceu com ninguém em Roraima, então é isso que vamos procurar”, disse ele, argumentando que os produtores aguardaram o que chamou de ‘um gesto concreto’ por parte do governo até a Páscoa, o que não aconteceu.

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