Sobre palestinos e chechenos

RACISMO PURO E SIMPLES

Talvez o mundo dê atenção às vicissitudes dos palestinos, mas não às dos chechenos, pela única razão de que os palestinos são percebidos como vítimas exclusivas do estado judeu. - Por Melanie Philips

No Wall Street Journal, Bret Stephens faz uma pergunta bastante simples e bastante óbvia. Observando o fato de que, enquanto cerca de seis mil palestinos (muitos, se não a maioria, terroristas) foram mortos em confronto com os israelenses desde o início da Segunda Intifada contra Israel, entre vinte e cinco mil e duzentos mil civis chechenos (de uma população equivalente a um terço ou um quarto da população palestina) foram mortos pelos russos durante esse mesmo período, ele fica admirado diante de um mundo que simplesmente dá de ombros, indiferente às brutalidades na Chechênia, enquanto discorre incessante e obsessivamente sobre Israel.

Ele pergunta:


Por que, por exemplo, escritores ocidentais de projeção, tal como o português ganhador do Nobel, José Saramago, fazem "peregrinações" a Ramallah, mas não a Grozny, capital da Chechênia? Por que acadêmicos britânicos organizam boicotes a seus colegas israelenses, mas não a seus colegas russos? Por que um estado palestino é considerado um imperativo moral global, mas um estado checheno não o é? Por que todo primeiro-ministro israelense invariavelmente torna-se um pária global, quando nem mesmo uma pessoa em mil sabe o nome do “presidente” checheno, Ramzan Kadyrov, um homem que, segundo muitos relatos, mantém uma masmorra próxima a sua casa a fim de torturar pessoalmente seus opositores políticos? E por que o fato de Kadyrov ser o capanga escolhido a dedo por Vladimir Putin para "governar" a Chechênia não causa nem um arrepio de repulsa no momento em que a administração Obama busca pelo botão "reset" nas relações com a Rússia?

Eu tenho uma hipótese. Talvez o mundo dê atenção às vicissitudes dos palestinos, mas não às dos chechenos, pela única razão de que os palestinos são percebidos como vítimas exclusivas do estado judeu. Isto é: quando não estão sendo vítimas de outros palestinos, ou sendo expulsos em massa do Kuwait, ou sendo excluídos do mercado de trabalho no Líbano. São coisas que vocês provavelmente tampouco sabiam.

Vinte e sete anos atrás, quando eu era redatora de editoriais no The Guardian, eu fiz a mesma pergunta aos meus colegas mais velhos – exceto que, em vez da Chechênia, eu me perguntava por que o jornal raramente cobria as atrocidades de árabes contra outros árabes. Eles me disseram que era porque as culturas do Terceiro Mundo não têm o mesmo respeito pela vida humana como nós temos no Ocidente. Assim, seria errado de nossa parte esperar deles os mesmos padrões que exigimos de nós mesmos.

Isso era apenas uma outra maneira de dizer que pessoas que por acaso vivam no Terceiro Mundo não têm os mesmos direitos à vida e à liberdade desfrutados por aquelas pessoas que vivem no Ocidente desenvolvido; equivalia a dizer que as vidas das pessoas no Terceiro Mundo valiam menos dos que as vidas das pessoas no Ocidente.

No meu manual, isso é racismo, puro e simples. Mas este é o padrão de julgamento na esquerda "anti-racista" e moralmente relativizada. Adicione esse fator sobre o amontoado de ressentimentos e preconceitos em relação aos judeus e você levará um bom tempo até explicar a patológica obsessão com Israel e a negligência rotineira para com as verdadeiras tiranias e perseguições no mundo; obsessão e negligência que compõem uma bizarra característica do discurso público no Ocidente.

Melanie Philips é jornalista inglesa. Ver site
http://ww.midiaamais@com.br
Tradução: Henrique Paul Dmyterko – via
Diário do Comércio

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