Contra a Lei da Mordaça ao MP

UMA SÉRIA AMEAÇA DE DANO INSTITUCIONAL

A Câmara dos Deputados deu um perigoso passo num caminho que leva à intimidação e à demonização do Ministério Público. Por decisão de líderes partidários, foi aprovado o regime de urgência para a votação do projeto de lei que propõe a punição de procuradores que entrarem com ação contra políticos acusados de corrupção. O projeto, de autoria do deputado Paulo Maluf (PP-SP), prevê a adoção de sanções penais a membros do MP que agirem motivados por suposta promoção pessoal, má-fé ou perseguição.

Não por acaso, o projeto — que, ao entrar em regime de urgência, pode ser votado em plenário já nos próximos dias — é conhecido como Lei da Mordaça do Ministério Público. E não é outra a intenção do parlamentar: ele próprio alvo de investigações da Justiça, MP e Polícia por acusações de improbidades administrativas e gestões heterodoxas, Maluf procura lançar a Casa numa aventura totalitária. Editorial O Globo


É um equívoco em si calcar a justificativa de uma lei em conceitos subjetivos, como o das alegadas “razões pessoais” que, na visão do parlamentar, poderiam motivar ações do Ministério Público. Ademais, carece de sentido blindar com o aço do corporativismo qualquer setor da sociedade contra ações do MP, um organismo fortalecido na Constituinte de 87, da qual saiu com suas atribuições consolidadas na Carta de 88, exatamente para agir em nome da sociedade contra abusos, desmandos e improbidades de qualquer dos Poderes.

Admita-se que o Ministério Público abrigue em seu corpo procuradores que, levados por interesses pessoais, confundem a obrigação constitucional de fiscalizar — e propor punições — com o desabonador propósito de perseguir.

Excessos sempre existirão em qualquer órgão que concentre poderes — e, nesse particular, tornouse notório o caso do procurador Luiz Francisco de Souza, hoje relegado a funções menores no TRF de Brasília, mas que passou boa parte do governo FH frequentando as primeiras páginas dos jornais por ter feito a opção preferencial pelo denuncismo embasado em opções ideológicas.

Mas, além de atuações desse tipo constituírem exceção no histórico do MP, o próprio órgão dispõe de dispositivos de autorregulação, além de estar sujeito à fiscalização do Conselho Nacional do Ministério Público. É imperioso, portanto, que os congressistas responsáveis pelo apoio à mordaça do MP revejam tal posição, sob pena de compactuarem com uma proposição que fere a necessária independência de promotores e procuradores.



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A Câmara dos Deputados poderá votar nesta semana uma perigosa proposta de retrocesso institucional. Trata-se da Lei da Mordaça ao Ministério Público, projeto apresentado pelo deputado Paulo Maluf (PP-SP), em 2007.

O texto tem tom de retaliação. Estabelece punição para membros do Ministério Público que impetrarem ações judiciais contra integrantes dos Poderes Legislativo e Executivo - quando o juiz da causa julgar que o impetrante foi motivado por promoção pessoal, má-fé ou perseguição. Esse projeto – PL 265/07 – prevê multa equivalente a 10 vezes o valor das custas processuais, além do pagamento dos honorários advocatícios e condenação a até dez anos de prisão para os responsáveis por ações que vierem a ser enquadrados naquelas motivações – cujo controle, aliás, já é exercido pelo Conselho Nacional do Ministério Público.

Parece clara uma tentativa de inibir o ajuizamento de ações por improbidade administrativa ou outras formas de corrupção. Uma blindagem a mais aos políticos, além da prerrogativa do foro privilegiado.

Tal proposta é descabida. Todo réu tem direito inalienável a ampla defesa. Há procedimentos jurídicos para anular eventuais excessos cometidos por quem move ações. Ademais, os danos decorrentes também podem ser reparados à luz do Direito. Isso posto, o que pode estar direcionado para a má-fé é o próprio texto do PL 265/07.

Ainda assim, estranhamente ou não, o referido projeto caminha na Câmara. Recebeu o sinal verde da Comissão de Constituição e Justiça e, há poucos dias, teve regime de urgência de votação aprovado – após exposição de Maluf aos líderes partidários (do PT, do PSDB, do PMDB, do PPS e do PTB) – obtendo o apoio de todos. O líder do PR, Lincoln Portela, já solicitou a retirada de sua assinatura no requerimento, procedimento que deveria ser acompanhado por todos os demais.

A urgência do projeto começa a ser respondida com mobilização, também urgente, para derrubá-lo. Representantes do Ministério Púbico estão articulando o contra-ataque. A partir desta semana, eles iniciam uma mobilização em todo o país encabeçada pela Conamp (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público).

Uma das formas de pressão para derrubar a Lei da Mordaça ao MP será a atuação direta nos municípios dos 15 mil promotores espalhados por todo o país. Além disso, a associação pretende espalhar outdoors pelas cidades "para mostrar à sociedade os problemas de se retirarem prerrogativas dos promotores".

O presidente do Conamp, José Carlos Cosenzo, certamente não tem o monopólio da opinião segundo a qual o projeto do deputado Maluf atende a causa própria. O parlamentar paulista é réu em cerca de 40 ações penais e cíveis. Desse total, pelo menos 10 resultaram de denúncia a outros políticos – o que presume estratégia para evitar ser responsabilizado pessoalmente.

Porém nada disso está obstaculando a tramitação do PL 265/07 na Câmara. Para ser aprovado, no entanto, depende da votação em plenário, com manifestação favorável de 257 deputados. Pode ser que não passe.

Mas a ameaça de dano institucional é muito grande. Com o Ministério Público imobilizado, estaria enfraquecido o combate à corrupção. Os grandes instrumentos legais disponíveis para esse fim, como a Lei de Improbidade Administrativa, a Lei da Ação Civil Pública e a Lei de Ação Popular, correriam risco real de esvaziamento. Isso representaria grave perda para toda a sociedade. EDITORIAL A GAZETA (ES)

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