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Há mais do que interesse político por trás da mão dura do governo do Irã quando trata de conter o descontentamento dos eleitores com o resultado - que denunciam ser fraudulento - das eleições presidenciais. Trata-se de um objetivo mesquinho, ganancioso. A elite do regime teocrático iraniano procura, sobretudo, manter as suas mordomias - num país onde 40% da população sobrevivem com o equivalente a US$15 por mês.
O aiatolá Ali Khamenei, sob o manto de líder supremo da Revolução Islâmica, trata de preservar não apenas a aura da chamada Revolução Islâmica, mas, também, os benefícios que ela trouxe para aiatolás e clérigos em geral, além de parentes e amigos. Eles se transformaram numa casta - a dos "mulás milionários", que circulam por Teerã em Mercedes e BMWs, jogam golfe em clubes fechados e viajam frequentemente para a Europa. Por José Meirelles Passos
Eles não querem abrir mão do que conquistaram a partir da privatização dos anos 90, quando centenas de empresas foram vendidas a quem tinha conexões com as pessoas certas dentro do regime. E tampouco pretendem ver naufragar as bonyads - entidades que, sob a fachada de fundações de caridade, são formadas por empresas confiscadas ao antigo regime.
Elas abrangem a maior parte dos negócios que não têm a ver com o petróleo (principal produto de exportação do Irã) e foram entregues aos clérigos mais confiáveis. Eles não têm de prestar contas publicamente: devem justificá-las apenas a Khamenei. Todos os hotéis cinco estrelas, por exemplo, estão em mãos das bonyads., que controlam um quarto da economia; o governo maneja 60% dela; os agronegócios são de propriedade do Ministério da Agricultura; o de Inteligência é dono de empresas de telecomunicações e de tecnologia da informação.
Até mesmo a Guarda Revolucionária tem papel comercial. Ela geralmente ganha os contratos de construção de estradas, oleodutos e até edifícios de apartamentos. A Guarda foi criada em 1979 pelo aiatolá Ruhollah Khomeini com três funções específicas. As duas primeiras eram fazer prevalecer "a ideologia divina, e expandir a lei de Deus através da legislação da República Islâmica do Irã". A seguinte, mais prática, era enfrentar ameaças estrangeiras e funcionar como uma organização político-militar para conter a oposição doméstica.
É a esta última tarefa que a Guarda vem se dedicando mais ultimamente. Tal função já havia sido redobrada a partir da chegada de Mahmoud Ahmadinejad ao poder, em 2005. Ele próprio servira nesse contingente. E, ao assumir a Presidência, pôs nove comandantes da força no Ministério. Além disso, nomeou outros como governadores e vice-governadores de 30 províncias.
Ali Alfoneh, pesquisador do American Enterprise Institute, de Washington, especializado na Guarda Revolucionária e nas relações entre civis e militares no Irã, acredita que poderia haver uma mudança - ainda que não necessariamente agora - provocada pelos protestos. Isso, no entanto, não levaria de imediato a uma democracia:
- Enquanto democracias temem inimigos externos, regimes não democráticos temem a sua própria população, cujas escolhas e aspirações eles suprimem através de meios militares - avalia Alfoheh. - A tática de Khamenei pode funcionar a curto prazo. Mas a sua confiança apenas na Guarda Revolucionária pode acabar tornando-o um prisioneiro de sua própria guarda pretoriana. O Globo
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