MEC pagou R$ 257 milhões por escolas que ficaram no papel

NOSSO DINHEIRO É CAPIM - II
Centro de sindicato recebeu R$ 3,1 milhões e nunca abriu

No número 738 da rua Galvão Bueno, na Liberdade (centro da capital), fica uma casa de cinco andares com portas de vidro onde deveria funcionar, desde 2005, o Centro de Educação Profissional do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, com 1.200 alunos. Mas, até hoje, o centro não abriu as portas.

Ele deveria oferecer cinco cursos técnicos e 60 cursos básicos em áreas como eletrônica industrial, telecomunicações e mecânica em inspeção veicular. Pelo menos metade das vagas deveria ser gratuita.

Desde 2002, o centro recebeu do MEC R$ 3,1 milhões, do Proep, para a reforma do prédio e compra de equipamentos. A reforma do edifício começou em janeiro de 2003 e só terminou cinco anos depois. A obra ficou dois anos paralisada.

Segundo o coordenador técnico do projeto no sindicato, Fernando Ferreira, houve um problema e a construtora contratada desistiu. Depois de nova licitação, e a reforma foi retomada em 2006. O prédio está pronto desde 2008, mas os cursos não começaram devido à demora da prefeitura em conceder o Habite-se, diz Ferreira. A secretaria de Habitação não confirmou a informação nem explicou o porquê da demora. Por Talita Bedinelli- Folha de S. Paulo



AUDITORIA CONSTATOU PRÉDIOS VAZIOS OU NEM CONSTRUÍDOS
Só 1 (uma) das 98 instituições que receberam, ao todo, R$ 257 milhões de programa federal de 1998 a 2007 cumpriu todo o contrato

Escolas técnicas financiadas com dinheiro público, que deveriam atender alunos gratuitamente, viraram prédios vazios e faculdades privadas ou até edifícios nunca construídos. A conclusão é de fiscalização do Ministério da Educação no Proep (Programa de Expansão da Educação Profissional), que funcionou de 1998 a 2007.

Em São Paulo, por exemplo, o imóvel que deveria, desde 2005, ter um centro educacional para metalúrgicos está fechado. Em Capivari (135 km de SP), um prédio que consumiu R$ 3,1 milhões em obras e equipamentos está abandonado.

O Proep, criado pelo ex-ministro Paulo Renato Souza (1995-2002), hoje secretário de Educação paulista, e feito em parceria com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), previa que a União repassasse verbas a entidades "comunitárias" para que construíssem, ampliassem e equipassem escolas. Em troca, deveriam ter cursos técnicos com 50% das vagas gratuitas.

De 1999 a 2007, 98 entidades -sobretudo fundações e sindicatos- receberam R$ 257 milhões, o que seria suficiente para erguer 50 escolas federais. Durante esse tempo, nenhuma vistoria foi feita, alega o MEC, por dificuldade estrutural.

O MEC constatou que apenas uma entidade cumpriu todo o contrato: a Fundação Iochpe, que atua em SP e no RS. Outras 20 abriram vagas gratuitas, mas não na quantidade acordada. Nove delas já existiam antes do Proep. "O programa praticamente só funcionou no Sul e Sudeste, e boa parte das escolas teria funcionado sem ele", diz Gleisson Rubin, da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC.

As demais entidades tiveram irregularidades que, diz o órgão, vão do não oferecimento dos cursos à cobrança de mensalidade de 100% dos alunos. O primeiro caso descoberto foi o da Escola Catarinense de Gastronomia, em Florianópolis. Segundo o MEC, em vez de curso técnico, havia no local a Unisul (Universidade do Sul de Santa Catarina), que cobrava mensalidades de R$ 900. Na Justiça, a União conseguiu reaver o prédio em 2007.

O Centro de Formação do Profissional do Paulista, em Pernambuco, recebeu R$ 2,7 milhões para erguer uma sede. A obra terminou em janeiro de 2003, mas os cursos gratuitos só duraram três meses. Outra entidade responsabiliza o próprio governo. A Fundação de Asseio e Conservação de Almirante Tamandaré (PR), diz seu diretor-executivo, Pedro Paulo Guerreiro, aderiu ao projeto em 1999, mas o convênio só foi formalizado em 2005 e só em 2006 chegou a verba para erguer um prédio para aulas de limpeza profissional.

"O contrato ficou parado por anos no ministério. Nesse período, entraram e saíram ministros e ninguém resolveu nada. Os convênios ficaram parados nas gavetas. Ou então, quando se cobrava o dinheiro, o argumento era que não havia disponibilidade no momento."

O MEC afirma que as entidades cujos convênios só saíram após 2003 tinham problemas de documentação.

Após a auditoria, além das 30 escolas federalizadas, cinco passarão para Estados. Onze estão sob a gestão do Sistema S. Uma escola decidiu devolver o dinheiro. Para outra foi aberto processo de tomada de contas. Há ainda negociações em curso com outras escolas. As 20 que têm cursos gratuitos em número menor estão redefinindo suas metas com a União. Por Ângela Pinho – Agência Folha



PRÉDIO CONCLUÍDO EM 2007 POR R$ 3,1 MILHÕES NUNCA TEVE AULAS
Um prédio de uma instituição privada construído com verbas do governo federal e concluído em 2007 para ser um centro educacional técnico está abandonado na periferia de Capivari (135 km de SP).

As obras e a aquisição de equipamentos consumiram R$ 3,1 milhões, de 2001 a 2007. Mas hoje, cercado por mato, nenhum estudante conseguiria entrar no prédio: o portão está trancado com cadeado.No interior, há salas com carteiras, TVs, DVDs, telefones e bebedouros. O prédio tem ainda elevador, banheiros e uma biblioteca sem livros. No entanto, partes do teto e das paredes já apresentam infiltração.

O local foi construído para abrigar o Cadecap (Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento Cenecista de Capivari), cuja mantenedora é a CNEC (Campanha Nacional de Escolas da Comunidade) -instituição de direito privado constituída sob a forma de associação civil sem fins lucrativos.

Pelo contrato com MEC, o centro teria de oferecer gratuitamente metade das vagas dos cursos técnicos. Pelo acordo, seriam 46 cursos de formação inicial e continuada e seis de nível técnico, com 3.840 e 1.400 matrículas, respectivamente.

O projeto do Cadecap, em seu site, exibe a formação em cinco áreas: agropecuária, comércio, informática, lazer e desenvolvimento social e saúde.A responsabilidade pela não utilização do centro virou um jogo de empurra-empurra.

A diretora da CNEC de Capivari, Ana Maria Reginato, culpou a falta de infraestrutura na área externa do Cadecap: "Não tem como levar estudante para aquele local. (...) Até hoje, a prefeitura não fez rede de esgoto e a de água só foi instalada no fim de 2008".

Os diretores nacional e estadual da CNEC estiveram na cidade há um mês e disseram que o campus não funciona por falta de água e esgoto -que teriam sido promessas do ex-prefeito Carlos Borsari (PDT). Borsari negou: "A CNEC não teve competência para concluir as obras e tenta agora responsabilizar a prefeitura". Já o atual prefeito, Luís Donisete Campaci (PMDB), diretor da CNEC de Capivari até março de 2006 e quem assinou o convênio federal, disse que obras foram iniciadas. Maurício Simionato – Agência Folha

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