Rafael Correa encurralado

O VÍDEO DAS FARC É IRREFUTÁVEL

Sua revelação põe em vermelho-vivo a crise entre Colômbia e Equador

A divulgação de um vídeo onde o 'Mono Jojoy' reconhece que um grupo de 200 guerrilheiros das Farc ajudaram a financiar a campanha do presidente Rafael Correa caiu como uma bomba atômica nas relações entre Colômbia e Equador.

No vídeo, revelado com exclusividade pela agencia A.P., gravado em 27 de março de 2008 e confiscado de uma miliciana em Bogotá, o chefe guerrilheiro informa às suas filas sobre a morte de 'Tirofijo' e lê uma carta do fundador das Farc.

É ali, que ele revela que com o confisco do computador de 'Raúl Reyes' ficaram descobertos vários secretos das Farc e entre eles a "ajuda em dólares à campanha de Correa e posteriores conversações com seus emissários, incluídos alguns acordos, segundo documentos em nosso poder, os quais resultam muito comprometedores em nossos nexos com os amigos".

As declarações do chefe militar das Farc constituem para muitos a maior prova dos vínculos entre o governo equatoriano e a guerrilha colombiana, e complicam ainda mais o panorama das relações bilaterais que estão em queda livre desde o bombardeio no acampamento das Farc em território equatoriano há 16 meses.

As suspeitas sobre o governo de Correa surgiram desde as revelações computador de 'Raúl Reyes' encontrado a poucos metros de seu cadáver depois do bombardeio. Em várias mensagens de e-mails se descrevem os aportes à primeira campanha presidencial de Correa, por parte da guerrilha e se mencionam as reuniões de funcionários equatorianos com Reyes.

Mas o tema com o Equador vai muito além da possível cumplicidade do governo de Correa – ou de alguns de seus funcionários com a guerrilha. Existe o forte indício de que as Farc usem as selvas de Sucumbíos como retaguarda para montar acampamentos, traficar armas e esconder seqüestrados ante a ineficácia, ou a indiferença, do Estado equatoriano. O problema já não é só militar, mas também político, econômico e estratégico para a segurança nacional da Colômbia.

Correa radicalizou seu discurso contra o país. Desde o ataque contra 'Reyes', o Presidente do Equador vem exaltando um fervor patriótico e exacerbando um sentimento anticolombiano que capitalizou politicamente na campanha eleitoral que o levou a reeleger-se em abril deste ano. Essa moléstia contra a Colômbia vem se incubando já há muitos anos e hoje, que está à flor da pele, pode se converter em uma perigosa bandeira chauvinista em tempos de crise.

Porém, mais grave que a retórica de suas palavras é a ação de suas convicções. O governo do Equador já interpôs duas demandas contra Colômbia perante os tribunais internacionais. A primeira, pelas fumigações na fronteira, ante a Corte Internacional de Justiça, e a segunda, perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, pela morte de um cidadão equatoriano no bombardeio de Angostura.

No político, as relações estão corroídas. Desde março de 2008 não tem embaixador colombiano em Quito nem equatoriano em Bogotá. O intercambio comercial está se diluindo. Faz duas semanas o governo do Equador decidiu subir unilateralmente as tarifas às exportações colombianas, o que pode representar um custo adicional para a economia colombiana de 500 milhões de dólares ao ano.

E para rematar o quadro, um juiz da província amazônica de Sucumbíos ordenou a detenção do ex ministro de Defesa Juan Manuel Santos pela morte do cidadão equatoriano no bombardeio e pediu à Interpol que expedisse uma circular vermelha. Ainda que a justiça seja autônoma, poucos acreditam que a decisão de um juiz menor em uma província selvática esteja alheia ao sorvedouro político que tem sacudido aos dois países. Em poucas palavras, a situação atual com o Equador é que a diplomacia está judicializada, a economia está fraturada, a política está congelada e a cooperação militar está suspensa

Ante a impossibilidade de defender-se dada a visibilidade das provas, Correa só tem duas alternativas: 1) recorrer à fórmula de Samper, e dizer que “ele não sabia”, que aceitaram ajuda pelas suas costas e 2) utilizar a fórmula futebolística de que a melhor defesa é o ataque. Nesta última, que é a mais provável, ele tem demonstrado que é um pequeno Maradona, especialmente quando joga de local.

De escândalo em escândalo
Este vídeo chega num péssimo momento para Rafael Correa porque ele está tratando de sair de outro escândalo muito incomodo que envolve seu irmão Fabricio com o tráfico de influências para conseguir contratos com o Estado de 80 milhões de dólares. Nas pesquisas de opinião já foi verificada uma queda de até 15 por cento em sua credibilidade e chegou a 46 por cento (Cedatos-Gallup) em 29 de junho passado, o ponto mais baixo desde que ele assumiu a Presidência.

Nas últimas três semanas, Correa mergulhou de cabeça no tema e se movimentou desesperadamente para afastar as suspeitas que possam recair sobre ele. Contra atacou os meios que publicaram a informação. Dado ao fato que o escândalo tem a ver com umas empresas de seu irmão no Panamá, chegou ao extremo de expedir decretos que proíbem que qualquer empresa que tenha papéis no exterior contrate o Estado.

O vídeo-bomba do 'Mono Jojoy' ressurge no momento em que o tema das Farc já estava superado no Equador, para o governo de Quito o assunto já estava debaixo do travesseiro. A tal ponto, que Correa deu uma série de passos que, segundo os analistas equatorianos, têm como propósito converter a Colômbia no novo inimigo externo do Equador.

Essa atitude faz parte do novo empaque de Correa II. O Presidente equatoriano foi reeleito em 26 de abril e vai começar seu segundo mandato em agosto. Se ele teve um bom triunfo nas urnas, na Assembléia (Congresso) as coisas não foram tão bem como ele esperava. Obteve uma maioria frágil e teve que fazer alianças com 12 congressistas de outros partidos.

¿O que vai acontecer com o vídeo de 'Jojoy' no Equador? Em matéria legal, deverá ser o Tribunal Eleitoral quem vai adiantar uma investigação. Sem embargo, esta entidade está praticamente tomada pelo movimento de Correa, de maneira que não se espera maior transparência. Minutos depois de tomar conhecimento do vídeo, o governo anunciou que uma Comissão Técnica, integrada por quatro ministros, analisaria ao material. Dois dos membros deste Comitê, o chanceler Fander Falconí e o ministro de Seguridade, Miguel Carvajal, já deram o primeiro conceito.

Carvajal disse ao correspondente da revista SEMANA em Quito, que " em nenhuma das campanhas, o movimento Pais (partido de Correa) recebeu dinheiro das Farc. Que não teve e nem tem nexos para pedir nem receber recursos". Falconí, por sua parte, disse que o vídeo é um ataque midiático e que não existem elementos técnicos suficientes que envolvam o presidente Correa com os terroristas.

No sábado, no encerramento desta edição, o presidente Correa se dirigia ao país em sua habitual cadeia de televisão. "A credibilidade da palavra de Correa é muito grande no Equador e a percepção negativa contra o governo colombiano também é muito grande. Quando Correa sai dizendo que o vídeo é um complô, as pessoas vão acreditar nele. Menos que antes, porém, vão acreditar”, afirma o editor de um prestigioso meio de Quito.

Sobre o tema do financiamento das campanhas o diário El Comercio publicou no ano passado várias investigações sobre o assunto, e chegou à conclusão de que reinou a má administração, pois grande parte dos recursos recebidos (entre 500.000 e 1 Milhão de dólares) não tinha a origem. Estes recursos foram justificados sob o nome de coletas, porém a origem não foi identificada com certeza. Esse escândalo também foi esquecido quando o tribunal eleitoral os absolveu.

Bomba do tempo regional
O Correa versão II também tem um discurso internacional mais radical. No mesmo dia em que ganhou as eleições anunciou que ia intensificar o projeto do Socialismo do Século 21 (o mesmo do presidente venezuelano Hugo Chávez) No Equador há poucas semanas se oficializou seu à Alternativa Bolivariana para os Povos da Nossa América (Alba), o grupo de países latinoamericanos que segue a linha de Chávez.

Precisamente na semana passada, em La Paz, Correa celebrou com seus colegas da Alba - Bolívia, Venezuela, Paraguai – o encerramento das operações de Manta como "um passo histórico". Sem embargo, os documentos apreendidos das Farc, os quais 'Mono Jojoy' reconhece sua autenticidade, geram mais e mais perguntas sobre o Equador. "É necessário que Correa apóie a exigência do desmonte da Base de Manta dentro da campanha da CCB, nenehum soldado yanqui em nossa América", diz 'Raúl Reyes' em um correio de fevereiro de 2007.

Enquanto se realizava a reunião da Alba, o governo ratificava seu interesse de incrementar a presença militar americana na Colômbia. O presidente Álvaro Uribe defendeu firmemente o possível acordo que permitiria Washington utilizar cinco bases no país. A reação da Alba não se fez esperar: "Quero dizer (que os) políticos latinoamericanos que aceitam uma base militar norte-americana em qualquer país da América Latina são traidores de seu país, traidores de sua pátria", disse o presidente boliviano Evo Morales.

Para o ministro de Seguridade Interna e Externa do Equador, Miguel Carvajal, tudo está relacionado. "Não é coincidência -disse- que hoje tenha sido o último dia do vôo dos Estados Unidos na Base de Manta ... Há pouco se acusou a Venezuela de ser um Estado permissivo com o narcotráfico". Carvajal fazia referência ao informe do General Accounting Office (GAO) ordenado pelo Congresso dos Estados Unidos que denunciou, entre outras coisas, as relações de funcionários venezuelanos com as Farc. O documento, que a SEMANA teve acesso, denunciou que a Venezuela "estendeu um salva-vidas aos grupos armados ilegais colombianos. Como resultado, esses grupos são ameaças viáveis à segurança colombiana e aos esforços antinarcóticos colombo-estadounidenses".

O documento oficial cita amplamente os correios do computador de 'Raúl Reyes' e destaca como essa informação serviu para acusar os três altos oficiais venezuelanos de vínculos com as Farc. Para Hugo Chávez, a divulgação do informe não podia vir em pior momento, pois lhe tira a legitimidade de seus esforços para restituir a Manuel Zelaya como presidente de Honduras e revive as perguntas sobre suas relações com as Farc, as mesmas que pensou ter enterrado depois do aperto de mãos com Uribe na cumbre de Santo Domingo em março de 2008. Sem dúvida, isso torna mais difícil qualquer aproximação com o governo de Barack Obama.

A soma de todos esses acontecimentos - a radicalização da Alba, as revelações sobre Correa e as Farc e a denúncia da narcotização da Venezuela - é um coquetel explosivo que pode gerar uma crise regional sem precedentes e com conseqüências imprevisíveis. Ademais, a crise se apresenta em momentos em que a OEA tem demonstrado sua debilidade e sua inoperância perante os acontecimentos em Honduras. E deixou clara a divisão dos países do hemisfério: Alba, e às vezes Argentina, contra o resto.

Para a Colômbia, o cenário é pouco promissor; tem dois países vizinhos dirigidos por mandatários voláteis. Sua firme aliança com os Estados Unidos, fundamental para a luta contra as Farc e o narcotráfico, é também uma debilidade no atual concerto latinoamericano, onde ser antigringo está na moda. Os recentes esforços para acercar-se do Brasil poderiam complicar-se com a decisão de permitir o acesso permanente às forças militares americanas a bases colombianas. Ao Brasil, a potência Sulamericana, lhe incomoda sobremaneira essa presença de Washington, comentou a SEMANA um alto dirigente da região.

Apesar dos esforços do Centro Carter e da OEA, a desconfiança entre o governo colombiano e equatoriano está aumentando. Para Uribe, o vídeo confirma sua percepção de que seu colega equatoriano está confabulado com as Farc. Ao Correa não lhe resta nenhuma dúvida de que a divulgação do vídeo é apenas outra infiltração do governo colombiano em sua "guerra midiática" contra o Equador.

É evidente que desde o ataque ao acampamento de 'Reyes' e da descoberta dos 'segredos' de seu computador, nem o governo equatoriano nem o colombiano estão atuando com a diplomacia e a mesura que uma crise dessa dimensão necessita. Correa há 17 meses está vociferando e ameaçando por todos os lados. Enquanto Uribe e o chanceler Jaime Bermúdez pedem calma, por debaixo da mesa outros funcionários filtram informações negativas sobre o Equador. Com razão, dirão alguns, especialmente agora, depois de conhecido o vídeo de 'Jojoy'.

O vídeo de 'Jojoy', mais que uma ferramenta propagandística, pode ser a chave para obrigar o governo equatoriano a mudar seu comportamento irregular.
Revista A Semana - Tradução de Arthur para o MOVCC


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“Si Correa tiene un poco de dignidad, de vergüenza en su rostro, él debe presentar inmediatamente su renuncia. Estamos indignados, se nos cae la cara de la vergüenza porque en el mundo entero se está hablando que tenemos un narco-gobierno” , afirmou Lucio Gutiérrez à Radio Caracol. Leia mais
aqui (em espanhol)

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