ROLE NO LEÃO
A cultura da sonegação Contratos com Petrobras revelam que área cultural usa terceiros para pagar menos impostos
A descoberta de que a Petrobras gastou mais de R$ 12,4 milhões na sua área de abastecimento com empresas que vendem notas fiscais, que têm como endereço um canil ou um barraco numa favela, levantou a ponta de um esquema muito maior: grande parte da produção cultural do Rio vive num ambiente de sonegação sistemática de impostos e operando através das mesmas empresas.
Artistas, autores, produtores e fornecedores de todos os tipos usam o esquema de notas fiscais "de favor", obtidas destas empresas, em vez de operar como pessoa física autônoma ou abrir sua própria empresa. Assim, driblam a Receita Federal, pagando menos imposto ou simplesmente sonegando. Por Chico Otavio, Maiá Menezese Alessandra Duarte
Especialistas na área tributária afirmaram ao GLOBO que todas as partes envolvidas no mercado de notas fiscais para a prestação de serviços estão agindo irregularmente.
“Se todo mundo fizer o correto, vai desmontar o setor”, alega um produtor. Empresas de produção de eventos que trabalharam para a Infoglobo, que edita os jornais O GLOBO e Extra, também se valeram dos expedientes de contratação de profissionais que utilizaram notas de favor.
Contratos com Petrobras revelam que área cultural usa terceiros para pagar menos impostos.
A descoberta de pagamentos da ordem de R$ 12,4 milhões da Petrobras a empresas de pequeno porte, localizadas em endereços suspeitos, jogou luz sobre uma indústria de notas fiscais que alimenta parte da contabilidade do mercado cultural brasileiro. Levantamento feito pelo GLOBO indica a existência de pelo menos 13 empresas fornecedoras dessas notas fiscais a artistas, produtores culturais, autores e outros prestadores de serviços. As mesmas firmas também já aprovaram quase R$ 14 milhões no Ministério da Cultura em projetos enquadrados na Lei Rouanet. Para especialistas em tributos, o comércio de “notas de favor” — como são chamadas por auditores da Receita Federal — pode esconder um esquema sistemático de sonegação fiscal.
Ao optar pelo uso da nota fiscal de terceiros, em vez de cobrar como pessoa física autônoma ou abrir a sua própria empresa, o prestador de serviços deixa de recolher os impostos previstos para esse tipo de transação como autônomo ou Pessoa Jurídica.
No lugar do recolhimento da tributação, preferem recorrer ao mercado das notas de favor e pagar percentuais de 5% a 10% do valor do trabalho realizado de taxa paralela — geralmente, índices bem menores do que seria a tributação oficial.
— É uma prática inusual e ilegal. É um caso de simulação, com indício de crime contra a ordem tributária, que precisa ser apurado — diz o exsecretário da Receita Federal Everardo Maciel.
Empresas de produção de eventos que trabalharam para a Infoglobo — que edita os jornais O GLOBO, Extra e Expresso — também se valeram dos mesmos expedientes de prestação de serviços com notas de origem suspeita.
O uso dessas notas se verifica em centenas de produções feitas para a Infoglobo.
Eletrobras, BNDES, oito ministérios, como Ciência e Tecnologia, Cultura, Educação e Saúde, e Transpetro, além das prefeituras do Rio, de Niterói, Petrópolis, Campos dos Goytacazes, João Pessoa (PB) e Itajaí (SC), segundo Diários Oficiais e sites, também tiveram serviços prestados por essas empresas.
Da saúde à área nuclear
As firmas emitiram notas por serviços de natureza variada, da área nuclear à regulação de planos de saúde (em geral previstos em sua razão social), prestados a órgãos públicos e empresas particulares. As empresas com receita bruta de até R$ 240 mil recolhem 7,27% de impostos.
Um artista que recorra a notas de terceiros com os quais não tenha relação de trabalho está evitando um carga tributária maior: uma empresa de prestação de serviço de porte médio está sujeita a impostos que variam de 16,33% a 19,53% sobre o seu faturamento. Na prática, esse percentual incide sobre o preço pago pelo trabalho, reduzindo o ganho do prestador ou aumentando o valor em impostos recolhido pela empresa.
Se pagar para o autônomo, como pessoa física, a empresa que o contratar recolhe na fonte 27,5%.
Inscritas na Receita Federal em casas de áreas residenciais, as três empresas com notas na Petrobras não foram encontradas em nenhum dos endereços declarados. Na sede da Sibemol, por exemplo, fica um canil. Há também alternância de sócios nos contratos societários. Para especialistas, essas características indicariam uma tentativa de burlar a fiscalização e possíveis ações fiscais, mas os sócios alegam, por meio de sua assessoria de comunicação, que não há nada de errado com essa prática: — Todas as empresas para estes fins podem ser registradas no próprio endereço residencial de seus diretores.
Devido a esta não exigência, acabamos nos esquecendo de fazer esta alteração, que está sendo providenciada — diz a assessoria das empresas R.A.Brandão, Sibemol e Guanumbi, da família Almeida Brandão.
Na Petrobras, os pagamentos às empresas da família Almeida Brandão, feitos pela Gerência de Comunicação do Abastecimento, estão sendo alvo, segundo a estatal, de uma sindicância. A assessoria da família informa que as empresas recolheram os impostos “de acordo com a carga tributária vigente para a categoria da nossa empresa”. As empresas receberam ainda um total de R$ 395,4 mil por realizar serviços em ações federais que vão da delimitação de áreas marinhas à gestão do Programa Nacional de Atividades Nucleares, passando por regulação de planos de saúde.
O advogado Fabio Cesnik, especialista na área administrativa e cultural, afirma que empresas que apenas repassam notas estão “fugindo da cadeia de impostos”: — Quem diz que faz essa prática porque a carga tributária é alta na verdade está tentando justificar seu caminho de burlar o Fisco. Carga tributária é alta para todos. Uma empresa que não vai participar da produção do projeto, que vai simplesmente receber um valor pelo artista ou profissional e repassar para ele, está fugindo totalmente da cadeia de impostos. É, sem dúvida, evasão fiscal, não elisão mdash; afirma Cesnik.
Elisão fiscal é a utilização de métodos legais para diminuir o peso da carga tributária Atuante no mercado cultural, a Avatar 2001 funciona com outras seis empresas, entre elas a Rigel e a Fênix, todas dos mesmos sócios, num endereço residencial na Ilha do Governador. A Avatar é proponente de projetos no total de R$ 1,7 milhão aprovados pelo Ministério da Cultura.
O contador das três empresas, Josias Dias, sustenta que, nos projetos da Lei Rouanet, elas funcionam como administradoras. Ou seja: um interveniente na relação entre o produtor e o órgão que liberará o recurso, depois da aprovação do MinC.
O contador afirma que recolhe os impostos, diz que há prestação de contas sistemática de seus projetos ao Ministério da Cultura e negou que suas empresas vendam notas fiscais— “Venda de nova fiscal é crime”, disse. Ressaltou, no entanto, que há casos em que os profissionais são forçados a apresentar notas fiscais de terceiros.
— A empresa grande os coloca na parede. E não aceita pagar como pessoa física por causa dos encargos — disse Josias, que afirma não emitir notas quando é proponente de projetos e alega nunca ter tido desvio de dinheiro em suas empresas.
Firma admite fornecer nota
A Avatar 2001 e a Fênix também prestaram serviços em áreas diversas na administração pública federal.
Uma consulta ao site Transparência Brasil indica que ambas prestaram, de 2003 para cá, serviços como “controle de radioproteção e dosimetria”, no Programa Nacional de Atividades Nucleares, e “Conser vação e Uso Sustentável da Biodiversidade no Arboreto”.
De acordo com o contador, o perfil contemplado na Razão Social delas autoriza tamanho leque de prestação de serviços.
No telefone de outra empresa, a Fenícia, em Santa Cruz, uma mulher que se apresentou como administradora afirmou que a empresa “fornecia nota”. Já o dono da Imagination, Celso Goulart, disse que as notas só são fornecidas “pelos ser viços que a gente presta”. Ele afirmou não ter funcionários. O GLOBO não localizou os don o s d a D a n j o u r, q u e prestaram serviço ao poder público na área nuclear, de fomento à arte e à cultura e para a intensificação das Forças Armadas nas áreas de fronteira.
O BNDES informou que efetuou pagamentos de cachês de artistas por meio dessas empresas. Mas ressaltou que é exigência do edital que o artista formalize a ligação com a empresa que o representa.
A prefeitura do Rio disse que não trata de contratos firmados na gestão anterior. A Eletrobras, procurada na noite de sexta-feira, pediu tempo para responder às indagações do GLOBO
A cultura da sonegação Contratos com Petrobras revelam que área cultural usa terceiros para pagar menos impostos
A descoberta de que a Petrobras gastou mais de R$ 12,4 milhões na sua área de abastecimento com empresas que vendem notas fiscais, que têm como endereço um canil ou um barraco numa favela, levantou a ponta de um esquema muito maior: grande parte da produção cultural do Rio vive num ambiente de sonegação sistemática de impostos e operando através das mesmas empresas.
Artistas, autores, produtores e fornecedores de todos os tipos usam o esquema de notas fiscais "de favor", obtidas destas empresas, em vez de operar como pessoa física autônoma ou abrir sua própria empresa. Assim, driblam a Receita Federal, pagando menos imposto ou simplesmente sonegando. Por Chico Otavio, Maiá Menezese Alessandra Duarte
Especialistas na área tributária afirmaram ao GLOBO que todas as partes envolvidas no mercado de notas fiscais para a prestação de serviços estão agindo irregularmente.
“Se todo mundo fizer o correto, vai desmontar o setor”, alega um produtor. Empresas de produção de eventos que trabalharam para a Infoglobo, que edita os jornais O GLOBO e Extra, também se valeram dos expedientes de contratação de profissionais que utilizaram notas de favor.
Contratos com Petrobras revelam que área cultural usa terceiros para pagar menos impostos.
A descoberta de pagamentos da ordem de R$ 12,4 milhões da Petrobras a empresas de pequeno porte, localizadas em endereços suspeitos, jogou luz sobre uma indústria de notas fiscais que alimenta parte da contabilidade do mercado cultural brasileiro. Levantamento feito pelo GLOBO indica a existência de pelo menos 13 empresas fornecedoras dessas notas fiscais a artistas, produtores culturais, autores e outros prestadores de serviços. As mesmas firmas também já aprovaram quase R$ 14 milhões no Ministério da Cultura em projetos enquadrados na Lei Rouanet. Para especialistas em tributos, o comércio de “notas de favor” — como são chamadas por auditores da Receita Federal — pode esconder um esquema sistemático de sonegação fiscal.
Ao optar pelo uso da nota fiscal de terceiros, em vez de cobrar como pessoa física autônoma ou abrir a sua própria empresa, o prestador de serviços deixa de recolher os impostos previstos para esse tipo de transação como autônomo ou Pessoa Jurídica.
No lugar do recolhimento da tributação, preferem recorrer ao mercado das notas de favor e pagar percentuais de 5% a 10% do valor do trabalho realizado de taxa paralela — geralmente, índices bem menores do que seria a tributação oficial.
— É uma prática inusual e ilegal. É um caso de simulação, com indício de crime contra a ordem tributária, que precisa ser apurado — diz o exsecretário da Receita Federal Everardo Maciel.
Empresas de produção de eventos que trabalharam para a Infoglobo — que edita os jornais O GLOBO, Extra e Expresso — também se valeram dos mesmos expedientes de prestação de serviços com notas de origem suspeita.
O uso dessas notas se verifica em centenas de produções feitas para a Infoglobo.
Eletrobras, BNDES, oito ministérios, como Ciência e Tecnologia, Cultura, Educação e Saúde, e Transpetro, além das prefeituras do Rio, de Niterói, Petrópolis, Campos dos Goytacazes, João Pessoa (PB) e Itajaí (SC), segundo Diários Oficiais e sites, também tiveram serviços prestados por essas empresas.
Da saúde à área nuclear
As firmas emitiram notas por serviços de natureza variada, da área nuclear à regulação de planos de saúde (em geral previstos em sua razão social), prestados a órgãos públicos e empresas particulares. As empresas com receita bruta de até R$ 240 mil recolhem 7,27% de impostos.
Um artista que recorra a notas de terceiros com os quais não tenha relação de trabalho está evitando um carga tributária maior: uma empresa de prestação de serviço de porte médio está sujeita a impostos que variam de 16,33% a 19,53% sobre o seu faturamento. Na prática, esse percentual incide sobre o preço pago pelo trabalho, reduzindo o ganho do prestador ou aumentando o valor em impostos recolhido pela empresa.
Se pagar para o autônomo, como pessoa física, a empresa que o contratar recolhe na fonte 27,5%.
Inscritas na Receita Federal em casas de áreas residenciais, as três empresas com notas na Petrobras não foram encontradas em nenhum dos endereços declarados. Na sede da Sibemol, por exemplo, fica um canil. Há também alternância de sócios nos contratos societários. Para especialistas, essas características indicariam uma tentativa de burlar a fiscalização e possíveis ações fiscais, mas os sócios alegam, por meio de sua assessoria de comunicação, que não há nada de errado com essa prática: — Todas as empresas para estes fins podem ser registradas no próprio endereço residencial de seus diretores.
Devido a esta não exigência, acabamos nos esquecendo de fazer esta alteração, que está sendo providenciada — diz a assessoria das empresas R.A.Brandão, Sibemol e Guanumbi, da família Almeida Brandão.
Na Petrobras, os pagamentos às empresas da família Almeida Brandão, feitos pela Gerência de Comunicação do Abastecimento, estão sendo alvo, segundo a estatal, de uma sindicância. A assessoria da família informa que as empresas recolheram os impostos “de acordo com a carga tributária vigente para a categoria da nossa empresa”. As empresas receberam ainda um total de R$ 395,4 mil por realizar serviços em ações federais que vão da delimitação de áreas marinhas à gestão do Programa Nacional de Atividades Nucleares, passando por regulação de planos de saúde.
O advogado Fabio Cesnik, especialista na área administrativa e cultural, afirma que empresas que apenas repassam notas estão “fugindo da cadeia de impostos”: — Quem diz que faz essa prática porque a carga tributária é alta na verdade está tentando justificar seu caminho de burlar o Fisco. Carga tributária é alta para todos. Uma empresa que não vai participar da produção do projeto, que vai simplesmente receber um valor pelo artista ou profissional e repassar para ele, está fugindo totalmente da cadeia de impostos. É, sem dúvida, evasão fiscal, não elisão mdash; afirma Cesnik.
Elisão fiscal é a utilização de métodos legais para diminuir o peso da carga tributária Atuante no mercado cultural, a Avatar 2001 funciona com outras seis empresas, entre elas a Rigel e a Fênix, todas dos mesmos sócios, num endereço residencial na Ilha do Governador. A Avatar é proponente de projetos no total de R$ 1,7 milhão aprovados pelo Ministério da Cultura.
O contador das três empresas, Josias Dias, sustenta que, nos projetos da Lei Rouanet, elas funcionam como administradoras. Ou seja: um interveniente na relação entre o produtor e o órgão que liberará o recurso, depois da aprovação do MinC.
O contador afirma que recolhe os impostos, diz que há prestação de contas sistemática de seus projetos ao Ministério da Cultura e negou que suas empresas vendam notas fiscais— “Venda de nova fiscal é crime”, disse. Ressaltou, no entanto, que há casos em que os profissionais são forçados a apresentar notas fiscais de terceiros.
— A empresa grande os coloca na parede. E não aceita pagar como pessoa física por causa dos encargos — disse Josias, que afirma não emitir notas quando é proponente de projetos e alega nunca ter tido desvio de dinheiro em suas empresas.
Firma admite fornecer nota
A Avatar 2001 e a Fênix também prestaram serviços em áreas diversas na administração pública federal.
Uma consulta ao site Transparência Brasil indica que ambas prestaram, de 2003 para cá, serviços como “controle de radioproteção e dosimetria”, no Programa Nacional de Atividades Nucleares, e “Conser vação e Uso Sustentável da Biodiversidade no Arboreto”.
De acordo com o contador, o perfil contemplado na Razão Social delas autoriza tamanho leque de prestação de serviços.
No telefone de outra empresa, a Fenícia, em Santa Cruz, uma mulher que se apresentou como administradora afirmou que a empresa “fornecia nota”. Já o dono da Imagination, Celso Goulart, disse que as notas só são fornecidas “pelos ser viços que a gente presta”. Ele afirmou não ter funcionários. O GLOBO não localizou os don o s d a D a n j o u r, q u e prestaram serviço ao poder público na área nuclear, de fomento à arte e à cultura e para a intensificação das Forças Armadas nas áreas de fronteira.
O BNDES informou que efetuou pagamentos de cachês de artistas por meio dessas empresas. Mas ressaltou que é exigência do edital que o artista formalize a ligação com a empresa que o representa.
A prefeitura do Rio disse que não trata de contratos firmados na gestão anterior. A Eletrobras, procurada na noite de sexta-feira, pediu tempo para responder às indagações do GLOBO
2 comentários:
Há um Selo pra você no Blog: Pedro da Veiga.
Abraços.
O uso de empresas de fachada para sonegação fiscal e variados outros crimes como estelionato, ao contrário do que afirma Evardo Maciel, é técnica consagrada e massivamente utilizada.
No comércio exterior tal tipo de fraude é extremamente disseminada, como provam as múltiplas operações conjuntas da PF e da Receita (Narciso, Pôr-do-Sol, Persona, Titanic,etc,etc,etc.)
Realmente, é uma piada do ex-SRF:"é inusual". Na verdade, acontece ao contrário, basicamente que não usa desse esquema é tido como mané.
Lembrem do alegado esquema da Telefônica com "prestadoras" de serviço que superfaturavam seus preços para enxugar o lucro da empresa de telefonia.
A CVM até foi atrás da denúncia de que eram empresas de fachada dos espanhóis para estrepar os acionistas minoritários e remeter recursos ao exterior por baixo do pano. No entanto, onde estão as prisões, as condenações? Até agora não vi nada.
Mais uma história que foi parar nos gavetões mágicos de Brasilia, Everardo era SRF na época, será que mandou investigar também?
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