Pais, alunos, professores e donos de escolas protestam contra novas regras da educação
Associações de pais, estudantes, professores, universidades e donos de escolas da Venezuela protestaram ontem contra a aprovação de uma lei que transforma as escolas do país em centros comunitários supervisionados por líderes chavistas locais e ameaça direcionar o currículo das universidades, acabando com a autonomia do ensino superior. Partidos políticos de oposição e até mesmo a reitora da principal universidade do país afirmaram que desobedecerão a lei enquanto ela não for considerada inconstitucional ou até que seja convocado um referendo para derrubar a polêmica Lei Orgânica da Educação do país.
A nova legislação foi aprovada no meio da noite, às 2h da madrugada de ontem, depois de uma sessão de dez horas de duração na Assembleia Nacional (o Congresso venezuelano). Os poucos deputados de oposição da Casa (ex-aliados de Chávez, pois a oposição boicotou as últimas eleições parlamentares) abandonaram o plenário em protesto. A votação fez o país amanhecer ontem em clima de enfrentamento. O Globo
A reitora da Universidade Central da Venezuela, a maior do país, afirmou que a lei é inaceitável.
- As universidades jamais estarão a serviço de qualquer governo - disse ela, que ironizou dispositivos da lei, que, segundo ela, abandonam qualquer tipo de meritocracia na carreira universitária. - Como uma pessoa chega a ter o máximo cargo militar? Os soldados votam? Como são designados os ministros? Porque, se vai haver essa democratização, tem que ser feito em todas as instituições.
Partido de oposição anuncia desacato
O líder do partido Podemos, o deputado Ismael García, declarou ontem que sua legenda se "declara em rebeldia e desacato" à lei, considerada absurda por ele.
Já a diretoria da Câmara Venezuelana de Educação Particular (Cavep), que reúne centenas de instituições de ensino do país, afirmou que a lei é inconstitucional. Com a nova legislação, os colégios particulares venezuelanos são obrigados não apenas a alterar profundamente o currículo escolar, como até mesmo a ceder instalações para o uso de organizações comunitárias comandadas por integrantes do chavismo.
Segundo o presidente do Cavep, Octavio Delamo, a entidade trabalhará para que seja realizado um referendo popular para derrubar a lei.
- Temos que nos manter dentro do marco legal (e apelar) a todas as instâncias para exigir a derrubada desta lei e buscar um referendo para cancelá-la - disse Delamo. - Segundo o artigo 74 da Constituição, serão submetidas a referendo leis cuja derrubada seja solicitada por iniciativa de um número não menor de 10% dos eleitores registrados.
Segundo ele, o objetivo do governo é colocar "a serviço de um projeto político" as crianças, os jovens, os profissionais docentes. - O governo quer um marco legal que o permita expressar todo seu ressentimento social - disse Delamo.
Integrantes do maior movimento de pais da Venezuela - a Rede de Pais, Mães e Representantes - também garantiram que levarão a lei até o Tribunal Supremo de Justiça, alegando seu caráter inconstitucional.
- Ela desvincula a escola de seu papel educativo e a converte no centro da atividade política e comunitária - disse Lila Vega, da Rede. - E faz isso para um interesse partidário. Esta não é uma lei para as crianças e os adolescentes, porque desvirtua o propósito central da escola: a educação.
Os estudantes propuseram uma ação mais direta: tomar as ruas do país. Foi o que disse ontem o presidente da Federação dos Centros Universitários, Ricardo Sánchez.
- Os estudantes propõem a mobilização nas ruas. Não nos resta outra coisa para enfrentar a possibilidade de que demitam professores, fechem meios de comunicação, acabem com a autonomia universitária.
Jornalistas exigem prisão de chavistas
As primeiras manifestações ocorreram ontem em alguns pontos de Caracas, com estudantes distribuindo papel higiênico como símbolo de rechaço, segundo Sánchez.
No mesmo dia, a Assembleia Nacional aprovou também uma nova Lei de Terras Urbanas. A medida facilitará desapropriações dentro das cidades.
Ontem, as ruas em torno da Procuradoria Geral foram ocupadas por jornalistas, designers gráficos de periódicos e outros trabalhadores de empresas de comunicação. Eles exigiram que o grupo de chavistas que atacou e feriu 12 repórteres de diferentes meios
NOVA LEGISLAÇÃO PERMITE A CHÁVEZ DESAPROPRIAR TERRENOS URBANOS
Logo após votar a nova lei de educação, a Assembleia Nacional aprovou na madrugada de ontem legislação que facilita ao Poder Executivo a desapropriação de terrenos localizados em áreas urbanas da Venezuela, onde vive quase 90% da população do país.
De acordo com a lei, são terras consideradas "improdutivas urbanas": "grandes monopólios imobiliários, parcelas intraurbanas vazias, ociosas, subutilizadas e terras perimetrais à espera de ser incorporadas ao polígono urbano, resquícios de uma sociedade rentista contraposta aos objetivos de inclusão social e produtividade".
Segundo a Agência Bolivariana de Notícias (ABN), estatal, a lei prevê indenizações e "se aplicará em todas as terras urbanas aptas para o desenvolvimento de programas sociais de moradia em território nacional, onde por terras urbanas aptas ao desenvolvimento de programas sociais de moradia se entende aquelas sem uso localizas em áreas centrais das cidades e dos municípios".
No domingo, durante seu programa de TV, o presidente Hugo Chávez ameaçou expropriar campos de golfe que estão localizados em áreas urbanas, sob a alegação de que se trata de um "esporte burguês".
Porta-vozes da oposição afirmam que a lei atenta contra a propriedade privada e prometem realizar protestos contra a medida hoje, em Caracas. De acordo com a deputada da Frente Humanista (partido dissidente), Pastora Medina, a lei viola devido processo judicial para a desapropriação. "O único órgão competente é o Ministério da Habitação", diz.
Juntamente com outros cinco deputados da oposição, Medina abandonou a sessão de ontem ainda durante a discussão da lei de educação, após suas intervenções serem reiteradamente interrompidas pela presidência da Assembleia, sob a alegação de que elas estavam "fora da ordem". (FM) – Por Fabiano Maisonnave, de Caracas - Folha de S. Paulo
HUGO CHÁVEZ MERECE FIGURAR NO FILME “BANANAS”
Um dos mais cômicos filmes de Woody Allen chama-se “Bananas” e ironiza regimes autoritários e governantes delirantes da América do Sul. Numa de suas melhores passagens, um ditador determina que os homens têm de trocar a cueca diversas vezes por dia – para controle, ela terá de ser vestida obrigatoriamente por cima da calça. “Bananas” foi feito em 1971. Hugo Chávez leva o mérito de mantê-lo atual.
O presidente da Venezuela quer agora desapropriar campos de golfe porque os considera um acinte burguês àqueles que não têm terreno para morar: “Alguém pode dizer que o golfe é popular? Não é, não é”. Os dois primeiros campos a serem desapropriados são os de Maracay e Caraballeda. O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, P.J. Crowley, ironizou-o valendo-se de uma expressão desse esporte: “Mais uma vez Chávez, figura das mais desagregadoras, saiu dos ‘limites do campo’”. Por Fabiana Guedes-Istoé
Associações de pais, estudantes, professores, universidades e donos de escolas da Venezuela protestaram ontem contra a aprovação de uma lei que transforma as escolas do país em centros comunitários supervisionados por líderes chavistas locais e ameaça direcionar o currículo das universidades, acabando com a autonomia do ensino superior. Partidos políticos de oposição e até mesmo a reitora da principal universidade do país afirmaram que desobedecerão a lei enquanto ela não for considerada inconstitucional ou até que seja convocado um referendo para derrubar a polêmica Lei Orgânica da Educação do país.
A nova legislação foi aprovada no meio da noite, às 2h da madrugada de ontem, depois de uma sessão de dez horas de duração na Assembleia Nacional (o Congresso venezuelano). Os poucos deputados de oposição da Casa (ex-aliados de Chávez, pois a oposição boicotou as últimas eleições parlamentares) abandonaram o plenário em protesto. A votação fez o país amanhecer ontem em clima de enfrentamento. O Globo
A reitora da Universidade Central da Venezuela, a maior do país, afirmou que a lei é inaceitável.
- As universidades jamais estarão a serviço de qualquer governo - disse ela, que ironizou dispositivos da lei, que, segundo ela, abandonam qualquer tipo de meritocracia na carreira universitária. - Como uma pessoa chega a ter o máximo cargo militar? Os soldados votam? Como são designados os ministros? Porque, se vai haver essa democratização, tem que ser feito em todas as instituições.
Partido de oposição anuncia desacato
O líder do partido Podemos, o deputado Ismael García, declarou ontem que sua legenda se "declara em rebeldia e desacato" à lei, considerada absurda por ele.
Já a diretoria da Câmara Venezuelana de Educação Particular (Cavep), que reúne centenas de instituições de ensino do país, afirmou que a lei é inconstitucional. Com a nova legislação, os colégios particulares venezuelanos são obrigados não apenas a alterar profundamente o currículo escolar, como até mesmo a ceder instalações para o uso de organizações comunitárias comandadas por integrantes do chavismo.
Segundo o presidente do Cavep, Octavio Delamo, a entidade trabalhará para que seja realizado um referendo popular para derrubar a lei.
- Temos que nos manter dentro do marco legal (e apelar) a todas as instâncias para exigir a derrubada desta lei e buscar um referendo para cancelá-la - disse Delamo. - Segundo o artigo 74 da Constituição, serão submetidas a referendo leis cuja derrubada seja solicitada por iniciativa de um número não menor de 10% dos eleitores registrados.
Segundo ele, o objetivo do governo é colocar "a serviço de um projeto político" as crianças, os jovens, os profissionais docentes. - O governo quer um marco legal que o permita expressar todo seu ressentimento social - disse Delamo.
Integrantes do maior movimento de pais da Venezuela - a Rede de Pais, Mães e Representantes - também garantiram que levarão a lei até o Tribunal Supremo de Justiça, alegando seu caráter inconstitucional.
- Ela desvincula a escola de seu papel educativo e a converte no centro da atividade política e comunitária - disse Lila Vega, da Rede. - E faz isso para um interesse partidário. Esta não é uma lei para as crianças e os adolescentes, porque desvirtua o propósito central da escola: a educação.
Os estudantes propuseram uma ação mais direta: tomar as ruas do país. Foi o que disse ontem o presidente da Federação dos Centros Universitários, Ricardo Sánchez.
- Os estudantes propõem a mobilização nas ruas. Não nos resta outra coisa para enfrentar a possibilidade de que demitam professores, fechem meios de comunicação, acabem com a autonomia universitária.
Jornalistas exigem prisão de chavistas
As primeiras manifestações ocorreram ontem em alguns pontos de Caracas, com estudantes distribuindo papel higiênico como símbolo de rechaço, segundo Sánchez.
No mesmo dia, a Assembleia Nacional aprovou também uma nova Lei de Terras Urbanas. A medida facilitará desapropriações dentro das cidades.
Ontem, as ruas em torno da Procuradoria Geral foram ocupadas por jornalistas, designers gráficos de periódicos e outros trabalhadores de empresas de comunicação. Eles exigiram que o grupo de chavistas que atacou e feriu 12 repórteres de diferentes meios
NOVA LEGISLAÇÃO PERMITE A CHÁVEZ DESAPROPRIAR TERRENOS URBANOS
Logo após votar a nova lei de educação, a Assembleia Nacional aprovou na madrugada de ontem legislação que facilita ao Poder Executivo a desapropriação de terrenos localizados em áreas urbanas da Venezuela, onde vive quase 90% da população do país.
De acordo com a lei, são terras consideradas "improdutivas urbanas": "grandes monopólios imobiliários, parcelas intraurbanas vazias, ociosas, subutilizadas e terras perimetrais à espera de ser incorporadas ao polígono urbano, resquícios de uma sociedade rentista contraposta aos objetivos de inclusão social e produtividade".
Segundo a Agência Bolivariana de Notícias (ABN), estatal, a lei prevê indenizações e "se aplicará em todas as terras urbanas aptas para o desenvolvimento de programas sociais de moradia em território nacional, onde por terras urbanas aptas ao desenvolvimento de programas sociais de moradia se entende aquelas sem uso localizas em áreas centrais das cidades e dos municípios".
No domingo, durante seu programa de TV, o presidente Hugo Chávez ameaçou expropriar campos de golfe que estão localizados em áreas urbanas, sob a alegação de que se trata de um "esporte burguês".
Porta-vozes da oposição afirmam que a lei atenta contra a propriedade privada e prometem realizar protestos contra a medida hoje, em Caracas. De acordo com a deputada da Frente Humanista (partido dissidente), Pastora Medina, a lei viola devido processo judicial para a desapropriação. "O único órgão competente é o Ministério da Habitação", diz.
Juntamente com outros cinco deputados da oposição, Medina abandonou a sessão de ontem ainda durante a discussão da lei de educação, após suas intervenções serem reiteradamente interrompidas pela presidência da Assembleia, sob a alegação de que elas estavam "fora da ordem". (FM) – Por Fabiano Maisonnave, de Caracas - Folha de S. Paulo
HUGO CHÁVEZ MERECE FIGURAR NO FILME “BANANAS”
Um dos mais cômicos filmes de Woody Allen chama-se “Bananas” e ironiza regimes autoritários e governantes delirantes da América do Sul. Numa de suas melhores passagens, um ditador determina que os homens têm de trocar a cueca diversas vezes por dia – para controle, ela terá de ser vestida obrigatoriamente por cima da calça. “Bananas” foi feito em 1971. Hugo Chávez leva o mérito de mantê-lo atual.
O presidente da Venezuela quer agora desapropriar campos de golfe porque os considera um acinte burguês àqueles que não têm terreno para morar: “Alguém pode dizer que o golfe é popular? Não é, não é”. Os dois primeiros campos a serem desapropriados são os de Maracay e Caraballeda. O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, P.J. Crowley, ironizou-o valendo-se de uma expressão desse esporte: “Mais uma vez Chávez, figura das mais desagregadoras, saiu dos ‘limites do campo’”. Por Fabiana Guedes-Istoé
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