MÁQUINA PÚBLICA
Serviços básicos e infraestrutura se deterioram no Brasil, por décadas, devido à incapacidade financeira do setor público para investir. E, mesmo apoiado em uma carga tributária elevada, por muito tempo o Estado só conseguiu manter gastos de rotina, deixando que a inflação aguda corroesse essas despesas. De certa maneira, a inflação se tornou aguda no país por conveniência do Estado, impondo enorme sacrifício à população brasileira.
Reformar o Estado passou a ser então uma tarefa primordial para que a economia nacional alcançasse razoável padrão de estabilidade monetária, de modo a viabilizar também a recuperação de investimento do próprio setor público. Editorial O Globo
Tal reforma envolveu a privatização de companhias estatais, concessão de serviços básicos, extinção de órgãos desnecessários e adoção de instrumentos modernos e mais flexíveis de administração.
Ainda assim, foi preciso recorrer a ajustes compulsórios, determinados por lei, para que os governos federal, estaduais e municipais não continuassem como meros gestores de folha de pagamento. É uma situação até hoje não inteiramente resolvida. Vários governadores e prefeitos se tornaram reféns do governo federal por só conseguirem investir com ajuda do Tesouro.
E até o governo central, que havia sido forçado a segurar suas despesas de pessoal nesse processo de ajuste macroeconômico, voltou a desembolsar mais que 5% do Produto Interno Bruto (PIB) com a folha dos servidores em exercício e inativos.
Mesmo com o país crescendo, não se justifica submeter a máquina administrativa a salários acima da realidade do mercado. Funcionários públicos devem ser remunerados adequadamente, e desde que cumpram suas funções. Mas sem estruturar o setor público para torná-lo eficiente, a contratação de funcionários e o aumento dos gastos de pessoal representam apenas inchaço da máquina, numa espécie de retorno ao passado.
ARTIMANHA FISCAL SOMA R$55 BI
Governo usa brechas, como direcionar depósitos judiciais ao Tesouro, para ampliar margem de gastos
Num cenário de arrecadação em queda há 11 meses e despesas em alta, o governo tem feito uma série de artimanhas para raspar o tacho e conseguir fechar suas contas em 2009 e 2010. Juntas, essas medidas dão uma margem de manobra de R$55 bilhões para mais gastos. Isso sem contar ações orçamentárias e congelamento de emendas parlamentares, que somam R$42 bilhões, além da postergação na liberação de outros R$6 bilhões referentes às emendas individuais dos congressistas.
A estratégia mais recente foi inflar as receitas do Tesouro Nacional com depósitos judiciais, por meio da Medida Provisória (MP) 468. Os contribuintes que questionam o pagamento de tributos ou taxas na Justiça precisam depositar o valor num banco até que o caso seja julgado. Não há garantia de que esse montante ingressará nos cofres públicos, mas a União determinou que a Caixa Econômica Federal reúna esses depósitos e faça sua transferência para a conta do Tesouro.
Somente este ano, isso renderá ao governo R$5 bilhões em depósitos tributários. Por orientação do governo, a Câmara dos Deputados aprovou a ampliação da MP, incluindo todo o tipo de depósito - até mesmo os não-tributários - no repasse ao Tesouro, o que renderá mais R$6,4 bilhões no ano que vem. Os depósitos não-tributários envolvem qualquer receita, como taxas e aluguéis devidos a órgãos públicos.
Especialistas criticam "farra fiscal"
Para o economista José Roberto Afonso, as manobras feitas pelo governo afetam sua credibilidade. Ele crê que a equipe econômica manteve gastos elevados e que, mesmo conseguindo abrir espaço fiscal, acabou optando por aumentar outro tipo de despesas que não os investimentos:
- Fazer essas maquiagens está tendo um custo de credibilidade e de expectativa. Era melhor assumir o quanto é a despesa real do que fazer maquiagem. O problema é a qualidade do gasto. Houve uma redução inesperada da carga tributária, a arrecadação cai, e o gasto sobe. É um gasto que não tem retorno futuro.
Com previsão de quase R$70 bilhões a menos de receitas em 2009, o governo também encontrou espaço fiscal ao ampliar a parcela de gastos com investimentos que pode ser abatida da meta de superávit primário (economia para pagar juros da dívida pública). O primeiro passo foi incluir integralmente o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no abatimento.
O mesmo ocorreu com o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, que, embora reúna subsídios à população de baixa renda, também foi caracterizado como investimento. Juntos, PAC e Minha Casa permitiram abatimento adicional de R$12,9 bilhões da meta de superávit em 2009 e de R$30,3 bilhões em 2010. Esse montante, no entanto, só pode ser abatido caso as despesas sejam executadas.
A meta de superávit primário de 2009 está fixada em 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos pelo país). No início de 2009, o governo poderia abater um total de R$15,6 bilhões (ou 0,51% do PIB) da meta. Com a mudança no cálculo, esse valor subiu para R$28,5 bilhões ou 0,94% do PIB. Isso significa que o resultado primário pode ficar ainda menor: 1,56% do PIB.
Para a professora de Economia da UFRJ Margarida Gutierrez, existe uma farra fiscal. Ela argumentou que o governo se comprometeu com novas despesas - com pessoal e custeio da máquina - antes mesmo da crise e teve que adotar as medidas anticíclicas muito mais para fazer frente a elas do que para ajudar a economia.
- Essa política fiscal anticíclica não foi desenvolvida por causa da crise, mas pelo aumento do gasto. Antes da crise, o governo já havia contratado essas despesas com aumento de salários e do INSS, e usa a crise como pretexto. O governo pratica uma farra fiscal encoberto por um contexto internacional. A arrecadação não está sendo retomada - disse Margarida Gutierrez, admitindo que as medidas ajudam a segurar o PIB.
Para o economista Raul Veloso, o clima é de "total leniência".
- O governo não se preocupa com os aumentos de gastos. Num ano de crise, se faz política anticíclica, mas o que está subindo são despesas correntes, como as com pessoal - diz.
Responsável pelas negociações pelo governo na Comissão Mista de Orçamento e vice-líder do governo no Congresso, o deputado Gilmar Machado (PT-MG) disse que o governo precisou fazer opções diante da falta de dinheiro. Uma delas, segundo ele, foi suspender o repasse de R$8 bilhões em emendas de bancada e usar o dinheiro no custeio da máquina:
- Tivemos uma crise e não podemos deixar o país se desorganizar. Tivemos que definir prioridades.
Ele admitiu que uma tática que vem sendo usada é a proposição de novos créditos ao Orçamento - a maior parte direcionada para o PAC. Como não haverá condições de gastar tudo este ano, a meta é contabilizar os valores como "restos a pagar". Assim, os recursos ficam livres da legislação eleitoral, que impede novos repasses e convênios a partir de julho.
- Temos ainda quase R$34 bilhões de créditos a serem aprovados. São R$16 bilhões do Orçamento mesmo e mais cerca de R$17 bilhões de estatais - disse Gilmar Machado.
A oposição vem reclamando dessa tática, além da ampliação da MP 468.
- Cada vez mais cai a arrecadação. E, ao mesmo tempo, em contradição, o governo não para de enviar ao Congresso mensagens solicitando suplementação de verbas. A Comissão de Orçamento está para apreciar pedido de crédito de R$34 bilhões. Se o PAC representa investimentos bilionários, se o governo solicita outros R$34 bilhões, se a arrecadação está em queda, e serão R$70 bilhões a menos no fim do ano, de onde sairá esse dinheiro? Eis a pergunta que não quer calar - reclamou o deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), em plenário. Por Cristiane Jungblut e Martha Beck - O Globo
Serviços básicos e infraestrutura se deterioram no Brasil, por décadas, devido à incapacidade financeira do setor público para investir. E, mesmo apoiado em uma carga tributária elevada, por muito tempo o Estado só conseguiu manter gastos de rotina, deixando que a inflação aguda corroesse essas despesas. De certa maneira, a inflação se tornou aguda no país por conveniência do Estado, impondo enorme sacrifício à população brasileira.
Reformar o Estado passou a ser então uma tarefa primordial para que a economia nacional alcançasse razoável padrão de estabilidade monetária, de modo a viabilizar também a recuperação de investimento do próprio setor público. Editorial O Globo
Tal reforma envolveu a privatização de companhias estatais, concessão de serviços básicos, extinção de órgãos desnecessários e adoção de instrumentos modernos e mais flexíveis de administração.
Ainda assim, foi preciso recorrer a ajustes compulsórios, determinados por lei, para que os governos federal, estaduais e municipais não continuassem como meros gestores de folha de pagamento. É uma situação até hoje não inteiramente resolvida. Vários governadores e prefeitos se tornaram reféns do governo federal por só conseguirem investir com ajuda do Tesouro.
E até o governo central, que havia sido forçado a segurar suas despesas de pessoal nesse processo de ajuste macroeconômico, voltou a desembolsar mais que 5% do Produto Interno Bruto (PIB) com a folha dos servidores em exercício e inativos.
Mesmo com o país crescendo, não se justifica submeter a máquina administrativa a salários acima da realidade do mercado. Funcionários públicos devem ser remunerados adequadamente, e desde que cumpram suas funções. Mas sem estruturar o setor público para torná-lo eficiente, a contratação de funcionários e o aumento dos gastos de pessoal representam apenas inchaço da máquina, numa espécie de retorno ao passado.
ARTIMANHA FISCAL SOMA R$55 BI
Governo usa brechas, como direcionar depósitos judiciais ao Tesouro, para ampliar margem de gastos
Num cenário de arrecadação em queda há 11 meses e despesas em alta, o governo tem feito uma série de artimanhas para raspar o tacho e conseguir fechar suas contas em 2009 e 2010. Juntas, essas medidas dão uma margem de manobra de R$55 bilhões para mais gastos. Isso sem contar ações orçamentárias e congelamento de emendas parlamentares, que somam R$42 bilhões, além da postergação na liberação de outros R$6 bilhões referentes às emendas individuais dos congressistas.
A estratégia mais recente foi inflar as receitas do Tesouro Nacional com depósitos judiciais, por meio da Medida Provisória (MP) 468. Os contribuintes que questionam o pagamento de tributos ou taxas na Justiça precisam depositar o valor num banco até que o caso seja julgado. Não há garantia de que esse montante ingressará nos cofres públicos, mas a União determinou que a Caixa Econômica Federal reúna esses depósitos e faça sua transferência para a conta do Tesouro.
Somente este ano, isso renderá ao governo R$5 bilhões em depósitos tributários. Por orientação do governo, a Câmara dos Deputados aprovou a ampliação da MP, incluindo todo o tipo de depósito - até mesmo os não-tributários - no repasse ao Tesouro, o que renderá mais R$6,4 bilhões no ano que vem. Os depósitos não-tributários envolvem qualquer receita, como taxas e aluguéis devidos a órgãos públicos.
Especialistas criticam "farra fiscal"
Para o economista José Roberto Afonso, as manobras feitas pelo governo afetam sua credibilidade. Ele crê que a equipe econômica manteve gastos elevados e que, mesmo conseguindo abrir espaço fiscal, acabou optando por aumentar outro tipo de despesas que não os investimentos:
- Fazer essas maquiagens está tendo um custo de credibilidade e de expectativa. Era melhor assumir o quanto é a despesa real do que fazer maquiagem. O problema é a qualidade do gasto. Houve uma redução inesperada da carga tributária, a arrecadação cai, e o gasto sobe. É um gasto que não tem retorno futuro.
Com previsão de quase R$70 bilhões a menos de receitas em 2009, o governo também encontrou espaço fiscal ao ampliar a parcela de gastos com investimentos que pode ser abatida da meta de superávit primário (economia para pagar juros da dívida pública). O primeiro passo foi incluir integralmente o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no abatimento.
O mesmo ocorreu com o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, que, embora reúna subsídios à população de baixa renda, também foi caracterizado como investimento. Juntos, PAC e Minha Casa permitiram abatimento adicional de R$12,9 bilhões da meta de superávit em 2009 e de R$30,3 bilhões em 2010. Esse montante, no entanto, só pode ser abatido caso as despesas sejam executadas.
A meta de superávit primário de 2009 está fixada em 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos pelo país). No início de 2009, o governo poderia abater um total de R$15,6 bilhões (ou 0,51% do PIB) da meta. Com a mudança no cálculo, esse valor subiu para R$28,5 bilhões ou 0,94% do PIB. Isso significa que o resultado primário pode ficar ainda menor: 1,56% do PIB.
Para a professora de Economia da UFRJ Margarida Gutierrez, existe uma farra fiscal. Ela argumentou que o governo se comprometeu com novas despesas - com pessoal e custeio da máquina - antes mesmo da crise e teve que adotar as medidas anticíclicas muito mais para fazer frente a elas do que para ajudar a economia.
- Essa política fiscal anticíclica não foi desenvolvida por causa da crise, mas pelo aumento do gasto. Antes da crise, o governo já havia contratado essas despesas com aumento de salários e do INSS, e usa a crise como pretexto. O governo pratica uma farra fiscal encoberto por um contexto internacional. A arrecadação não está sendo retomada - disse Margarida Gutierrez, admitindo que as medidas ajudam a segurar o PIB.
Para o economista Raul Veloso, o clima é de "total leniência".
- O governo não se preocupa com os aumentos de gastos. Num ano de crise, se faz política anticíclica, mas o que está subindo são despesas correntes, como as com pessoal - diz.
Responsável pelas negociações pelo governo na Comissão Mista de Orçamento e vice-líder do governo no Congresso, o deputado Gilmar Machado (PT-MG) disse que o governo precisou fazer opções diante da falta de dinheiro. Uma delas, segundo ele, foi suspender o repasse de R$8 bilhões em emendas de bancada e usar o dinheiro no custeio da máquina:
- Tivemos uma crise e não podemos deixar o país se desorganizar. Tivemos que definir prioridades.
Ele admitiu que uma tática que vem sendo usada é a proposição de novos créditos ao Orçamento - a maior parte direcionada para o PAC. Como não haverá condições de gastar tudo este ano, a meta é contabilizar os valores como "restos a pagar". Assim, os recursos ficam livres da legislação eleitoral, que impede novos repasses e convênios a partir de julho.
- Temos ainda quase R$34 bilhões de créditos a serem aprovados. São R$16 bilhões do Orçamento mesmo e mais cerca de R$17 bilhões de estatais - disse Gilmar Machado.
A oposição vem reclamando dessa tática, além da ampliação da MP 468.
- Cada vez mais cai a arrecadação. E, ao mesmo tempo, em contradição, o governo não para de enviar ao Congresso mensagens solicitando suplementação de verbas. A Comissão de Orçamento está para apreciar pedido de crédito de R$34 bilhões. Se o PAC representa investimentos bilionários, se o governo solicita outros R$34 bilhões, se a arrecadação está em queda, e serão R$70 bilhões a menos no fim do ano, de onde sairá esse dinheiro? Eis a pergunta que não quer calar - reclamou o deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), em plenário. Por Cristiane Jungblut e Martha Beck - O Globo
Um comentário:
Amigos, a única reforma do Estado que vimos, nestes tempos lulísticos, foi o aparelhamento dos cargos públicos por ineptos, corruptos e outros sanguessugas como os sindicalistas.
Este governo (?) está interferindo até em uma empresa privada gigantesca e vitoriosa como a Vale, na tentativa de tomar para si, o cofre particular dos acionistas. Então, o que poderemos esperar em termos de modernização administrativa, de enxugamento da máquina e dos gastos públicos?
Este governo (?) está doando recursos públicos dos brasileiros para seus ailados, proto-ditadores latino americanos, como Moralez e o bispo prevaricador. Então, como imaginar que ele fará a justa distribução dos impostos pagos pelos brasileiros em áreas que precisam urgentemente de atenção, como a segurança pública e a educação?
Contemplando os sete anos de lulismo, a paisagem que se nos apresenta é tomada por destroços de falsos projetos ou obliterada pelo nada.
O que cresce e se desenvolve no Brasil atual são apenas as pragas, as ervas daninhas da corrupção, do apadrinhamento, da corrosão do Estado e do enriquecimento ilícito daqueles que não se envergonham de se vender.
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