Canal da época de Mao é exemplo de fracasso

Graças a décadas de propaganda, quase todos na China já ouviram falar do Canal Bandeira Vermelha, uma maravilha da engenharia construída durante o auge do fervor maoísta por camponeses equipados apenas com as ferramentas mais rudimentares.

Entre 1960 e 1969, mais de 100 mil trabalhadores "voluntários" abriram, a golpes de picareta, centenas de quilômetros de cadeias montanhosas e penhascos abruptos para redirecionar água potável da vizinha Província de Shanxi para os áridos vales no condado de Lin na Província setentrional de Henan. Financial Times

Mesmo hoje, o canal ainda é considerado pelo partido como um modelo patriótico do "espírito" comunista e atrai um fluxo contínuo de visitantes no circuito turístico vermelho. Mas, por extraordinário que seja, o canal é hoje pouco mais do que uma atração turística. O nível de água diminuiu continuamente ao longo de décadas devido ao esgotamento do rio fonte. Grande parte do município de Lin secou novamente e, rio acima, a poluição é tão grave que a água é imprópria para consumo. Além disso, disputas acirradas eclodiram ao longo de décadas entre os agricultores do condado de Lin e aqueles que haviam perdido sua água - e agora recebem indenização do governo do condado Lin por este ter se apropriado dela.

Críticos do atual grandioso novo projeto de desvio de água, o maior projeto de engenharia na China e a maior obra hidrológica na história humana, veem muitos paralelos entre esse mais recente megaprojeto de engenharia e o empreendimento do Canal Bandeira Vermelha. "Assim como houve consequências imprevisíveis e prejudiciais no caso do Canal Bandeira Vermelha, o mesmo ocorrerá com a transposição sul-norte, que será considerada um desastre dentro de 20 anos", disse Dai Qing, um conservacionista veterano e ativista político. "Sob o presidente Mao, frequentemente ouvíamos o slogan 'os seres humanos precisam conquistar a natureza', e essa é ainda a mentalidade atual de muitas pessoas. Mas estamos aprendendo gradualmente que os seres humanos não podem conquistar a natureza e que essa filosofia conduz inevitavelmente ao desastre."

À parte a escala e os modernos métodos de construção, uma importante diferença entre o Canal Bandeira Vermelha da era Mao e o atual esquema sul-norte são as enormes somas de dinheiro envolvidas e o resultante interesse de autoridades de governos locais na realização do projeto.

Com tanto dinheiro fluindo através dos ministérios e empresas estatais de construção civil, e descendo até os governos locais, as oportunidades de corrupção e propinas são numerosas e diversificadas. Alguns dos agricultores que foram transferidos de seus lares para abrir caminho para a rota central do projeto já estão reclamando que o dinheiro reservado para sua indenização e realocação foi roubada por funcionários locais corruptos, uma história familiar em outros projetos gigantes, como a represa Três Gargantas, que envolveu o deslocamento de mais de 1,3 milhão de pessoas.

Talvez não seja surpreendente, então, que as campanhas de propaganda moderna ainda comemorem o espírito dos construtores do Canal Bandeira Vermelha, que não eram motivados por dinheiro, mas por fervor revolucionário e seu amor ao presidente Mao. Via Valor Econômico