Juízes denunciam ameaça de rebelião na Papuda.Eles dizem que sistema prisional ‘está um caos’ desde a chegada de mensaleiros.

Entrada do posto de fiscalização do Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília O Globo / Givaldo Barbosa

O GLOBO

BRASÍLIA — Três juízes que atuam na Vara de Execuções Penais (VEP) em Brasília, responsável pelos processos das prisões dos condenados do mensalão, pediram para ser removidos da Vara em razão dos conflitos surgidos desde a chegada dos condenados ao Complexo da Papuda. Entre os motivos elencados nos pedidos, encaminhados à Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, está a iminência de ocorrer uma rebelião e uma tentativa de fuga na próxima terça-feira, dia 24, véspera de Natal.
Eles também denunciam a existência de uma suposta sabotagem por parte de agentes penitenciários com o objetivo de prejudicar a VEP. Os pedidos dos juízes foram remetidos ao primeiro vice-presidente, desembargador Sérgio Bittencourt, no último dia 9. Dois dias depois, o desembargador negou a remoção dos juízes e encaminhou à Presidência do TJ, “com urgência”, as denúncias de rebelião, fuga e sabotagem.

Os juízes escreveram no pedido de remoção que magistrados, promotores de Justiça e defensores públicos constataram a tensão no sistema prisional desde a chegada dos mensaleiros à Papuda, principalmente em razão das regalias concedidas a eles pela administração penitenciária. Entre esses privilégios estava um dia especial de visitas, as sextas-feiras, medida derrubada pelos juízes substitutos da VEP.

Situação de caos no sistema prisional
A argumentação dos juízes para serem transferidos da VEP se baseia na situação que consideram “de caos” do sistema prisional desde a chegada dos condenados do mensalão. As detenções ocorreram em 15 de novembro, e, diante dos conflitos deles com o juiz titular da VEP, Ademar Silva de Vasconcelos, os magistrados já alegavam a necessidade de remoção da Vara.

Os primeiros pedidos nesse sentido foram feitos ainda em novembro e negados pela Vice-Presidência do TJ, a quem cabe decidir sobre remoções de juízes. Há poucos dias, diante da ampliação da tensão nos presídios da Papuda, inclusive com uma suspeita de sabotagem por parte de agentes prisionais, os magistrados voltaram a pedir remoção.

A segunda negativa do TJ pode levar a uma contestação formal na Justiça sobre a permanência na VEP. No fim de novembro, por ingerência do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão, o titular da VEP foi afastado da condução dos processos de execução das penas dos presos. Praticamente todo o trabalho passou a ser feito pelos juízes substitutos e pelos juízes auxiliares designados pela Vice-Presidência do TJ para atuar na VEP.

Pelo menos três fontes independentes teriam alertado um dos juízes sobre a possibilidade de rebelião na véspera do Natal. A unidade onde detentos estariam arquitetando a revolta é o Centro de Detenção Provisória (CDP), que fica ao lado do Centro de Internamento e Reeducação (CIR), dentro do Complexo da Papuda. É numa cela especial do CIR onde estão presos o ex-ministro José Dirceu; o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares; o ex-tesoureiro do PL (hoje PR) Jacinto Lamas; e os ex-deputados Romeu Queiroz, Pedro Corrêa, Bispo Rodrigues, Valdemar Costa Neto e Pedro Henry. Também é dada como certa, no pedido remetido à cúpula do TJ, que os agentes tentarão uma sabotagem com a finalidade de atrapalhar a atuação da Justiça.

O assunto já foi tratado na semana passada numa reunião da cúpula da Secretaria de Segurança Pública do governo petista do DF. A Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), que cuida da gestão dos presídios, é vinculada à Secretaria de Segurança Pública. O subsecretário, Cláudio de Moura Magalhães, confirmou ao GLOBO que tratou de rebelião nos presídios, mas disse que o assunto é discutido rotineiramente pela Sesipe, tanto com a pasta de Segurança Pública quanto com os juízes da VEP.

— Há um núcleo de inteligência em cada presídio e a Gerência de Inteligência da Sesipe, com o objetivo de apurar fugas e rebeliões. Não tenho conhecimento de sabotagem nem de rebelião. Na reunião da semana passada, discutimos vários assuntos, inclusive sobre inteligência e rebelião. Mas isso ocorre o tempo todo, não houve uma reunião específica com essa finalidade — afirmou o subsecretário.

Os magistrados apontam situação de tensão e conflito com o titular da VEP. Dizem ter acumulado todo o trabalho da execução das penas dos mensaleiros. E relatam uma reunião em 16 de novembro, um sábado, o dia seguinte à decretação das primeiras prisões. Toda a cúpula do TJ teria participado da reunião, assim como o titular da VEP e os juízes substitutos. Na ocasião, Vasconcelos teria dito que não se subordinaria a Barbosa. As decisões, então, se concentraram nos demais magistrados.

— Pedido de remoção é normal. Estou em silêncio — disse ao GLOBO o titular da VEP, que não quis comentar os pedidos de transferência.

O primeiro vice-presidente do TJ do DF indeferiu os pedidos de remoção para garantir o “interesse público”. A manutenção dos juízes nos cargos evitaria uma instabilidade ainda maior do sistema prisional, na visão de Bittencourt, que designou dois juízes auxiliares para atuar na VEP, em razão da ampliação do trabalho desde a chegada dos condenados do mensalão à Papuda.

A assessoria de imprensa do TJ do DF confirmou o teor da decisão do desembargador e sustentou que a negativa de remoção dos juízes está mantida. Sobre o monitoramento da possibilidade de rebelião e sabotagem na Papuda, a assessoria afirmou que o tribunal “está atento”. Nos pedidos de remoção, os juízes pediram ao TJ que decrete o sigilo a respeito da questão.

O subsecretário do Sistema Penitenciário disse ser comum o envio de relatórios de inteligência para a VEP, e não o contrário, da VEP para a Sesipe:
— Estamos o tempo todo em contato com o secretário de Segurança Pública e com os juízes da VEP. Todos os assuntos são discutidos com eles, inclusive de inteligência. Posso ter conversado com os juízes sobre esses relatórios, sobre rebelião. Esse é um assunto rotineiro entre Sesipe e VEP — disse Cláudio Magalhães.

No início do mês, as seis promotoras que atuam na área de Execução Penal do Ministério Público do DF apresentaram uma representação contra o juiz Vasconcelos na Corregedoria. As promotoras pedem uma investigação da conduta do titular da VEP. A representação diz respeito, exclusivamente, a episódios relacionados à execução das penas dos mensaleiros. Elas citam a falta de “providências”, por parte de Vasconcelos, em relação à ausência de “tratamento isonômico” nas visitas aos presos. Site O GLOBO

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