Duplipensando à brasileira

A maneira de o presidente Lula informar a população brasileira a respeito da crise financeira mundial lembra uma anedota a respeito de como se dá uma má notícia em Minas Gerais – aos poucos, suavemente. - Por Belmiro Valverde Jobim Castor – Editorial do RPC


O caseiro de uma chácara telefona para seu patrão e lhe dá uma notícia triste: o papagaio de estimação da família, que alegrava as crianças e as visitas havia morrido. “Puxa, que pena, um papagaio tão alegre... E como é que ele morreu?”, pergunta o patrão. “De comer carne estragada”, responde o caseiro. “Carne estragada? Como assim?” “Do seu cavalo.” “Meu cavalo morreu? Mas, como?” “De canseira de tanto carregar água”, informa o caseiro. “Mas também, como é que vocês colocam um cavalo puro-sangue para carregar água?” “Precisava ‘né’, para apagar o incêndio.” “Que incêndio, homem do céu?” “Na casa principal. Uma vela caiu e ateou fogo na cortina e não deu pra segurar!” “Mas o senhor é muito incompetente!”, explode o dono da chácara. “Por que é que acenderam uma vela dentro da casa?”, continua. “Por causa do velório de sua mãe, que chegou aqui de noite. Eu só vi a sombra, pensei que era ‘assarto’ e atirei nela.”

Lula, momento 1: “Crise? Ah, é a crise do Bush, não temos nada a ver com ela”. Momento 2: “Não vai chegar aqui e se chegar é só uma marolinha”. Momento 3: “É séria, mas o Brasil está blindado contra ela”. Momento 4: “É inacreditável que os países ricos criem uma crise e que nós é que acabamos pagando”. Momento 5: “Das Nações Unidas, máximo cenário multilateral, deve partir a convocação para uma resposta vigorosa às ameaças que pesam sobre nós”. Momento 6: “Esta é uma crise global, e ela exige soluções globais. Este é o momento de formular propostas para uma mudança substantiva na arquitetura financeira mundial”.

A novilíngua e o duplipensar de George Orwell parecem ter se instalado e se enraizado solidamente na cultura política brasileira. As pessoas dizem as coisas sem nenhum compromisso com a verdade ou com a memória dos outros. O Ministro José Gomes Temporão, da Saúde, faz uma acusação gravíssima pela manhã, a respeito da Fundação Nacional de Saúde, que seria “um antro de corrupção”. À tarde, se desmente e declara não ter dito aquilo que diversos jornalistas o ouviram dizer. E fica por isso mesmo. Os dirigentes da Funasa também nem se abalaram. Os ingênuos pensariam que, se alguém é acusado de comandar um “antro de corrupção”, esse alguém imediatamente reagiria, protestaria, processaria o caluniador. Nada disso. Afinal, eles sabem que isso tudo vai ficar exatamente do mesmo tamanho. Para que se estressarem com essas reações emocionais?

Ninguém mais leva a sério a palavra solenemente empenhada, pois ela vale nada ou quase nada. Como foi mesmo o envolvimento da Agência Brasileira de Informações (Abin) com a Polícia Federal na tal Operação Satiagraha?

Começou sendo descrita como algo informal, irrelevante, mas progressivamente essa “verdade” formulada por pessoas que, inclusive, gozavam de fé pública, foi sendo reeditada; no início era um agente da Abin apenas, depois três, depois cinco, depois cinqüenta e dois, depois cinqüenta e seis, agora (sujeito a alterações sem prévio aviso), setenta e dois ou mesmo oitenta e cinco. Todos “colaborando informalmente”.

Talvez seja por isso que os cartórios se previnam. Outro dia fui assinar uma procuração que começava solenemente: “confere poderes amplos, gerais e ilimitados”. O Houaiss e o Conselheiro Acácio diriam que ilimitados significa “sem limite”. Para os cartorários, escaldados com o formalismo brasileiro, isso não é o bastante. O texto utilizava quarenta verbos diferentes para descrever os poderes: comprar, vender, ceder, transferir, compromissar, arrendar, gerir, administrar, doar, contratar, distratar, rescindir, anuir, divisar, demarcar, gravar, permutar etc. Afinal, o seguro morreu de velho. Eu incluiria mais três verbos: indignar-se, irritar-se e respeitar a inteligência dos outros.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR. –
Portal RPC





O PAC DA MÃE DILMA
PF e TCU apontam irregularidades na construção na Norte-Sul em Tocantins e Goiás

Investigações da Polícia Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU) apontam indícios de sobrepreço, superfaturamento, fraude em licitações e tráfico de influência na construção da Ferrovia Norte-Sul em Tocantins e Goiás, uma obra de R$ 3 bilhões, incluída no PAC. O TCU aponta um sobrepreço de R$ 516 milhões, o que corresponde a 22% do valor total de 16 lotes investigados. A partir de escutas telefônicas, inquérito da PF aponta o envolvimento do diretor de Engenharia da Valec, Ulisses Assad, com empresários que teriam recebido subempreitadas na obra de forma irregular. Leia mais
aqui, no Correio Braziliense





MERCADO DE VEÍCULOS TEM CALOTE RECORDE
Dívidas com atraso de mais de 90 dias somam R$ 4,6 bi, segundo o BC

Após recordes seguidos de produção e venda nos últimos meses, o setor automotivo bate mais uma marca. Só que, desta vez, a notícia não é boa e pode ser considerada um dos primeiros e mais dramáticos exemplos do efeito da crise econômica na vida das pessoas.

Em setembro, a inadimplência nos financiamentos para a compra de veículos atingiu o maior patamar da série histórica: 3,83% dos empréstimos apresentavam atraso superior a 90 dias. Isso quer dizer que a dívida pendente dos brasileiros soma R$ 4,6 bilhões. Esse valor que os bancos têm a receber já é superior à ajuda dada recentemente pelo governo federal ao setor, de R$ 4 bilhões.

Nas concessionárias e financeiras, o clima é de muita preocupação com a crise que parecia tão distante meses atrás. A sensação é que a roda do setor - que só andava para frente e em alta velocidade - desacelerou o ritmo e começa a dar sinais de que pode começar a dar ré. Números do Banco Central comprovam o clima de fim de festa.

A inadimplência cresce sem parar desde janeiro e, se forem somados os atrasos mais curtos - superiores a 15 dias, a dívida pendente salta para R$ 13,4 bilhões, ou 11,23% de todos os financiamentos para compra de veículos. Além disso, os novos financiamentos estão rareando. Continue lendo
aqui - Por Fernando Nakagawa - Estadão





BRASILEIRO JÁ TEME IMPACTO

Da euforia ao medo: 46% dos brasileiros planejam cortar gastos. Pesquisa nas principais capitais do país revela que 46% dos brasileiros acham que a crise afetará seus planos em 2009. E 40% decidiram cortar gastos no Natal.


A crise financeira atingiu em cheio o otimismo do consumidor. Prova disso é que as famílias brasileiras já reduzem a lista de despesas para o fim de ano e alteram os planos para 2009. A conclusão é de estudo inédito feito no início deste mês pela consultoria TNS InterScience em seis capitais de diferentes regiões do país. De acordo com o levantamento, 46% dos entrevistados têm cancelado viagens e compras agendadas para os próximos 12 meses. Para este Natal, 40% decidiram cortar gastos em até 70%. Outros 28% vão esperar até o fim do próximo mês para se decidir.

A TNS InterScience está presente em 70 países e faz parte do Kantar Group, uma das maiores redes de pesquisa de mercado do mundo.

Preocupado com o avanço do desemprego e dos preços, o consumidor espera queda em seu poder de compra para 2009. Segundo o estudo, a expectativa atingiu o pior nível nesta década. Em agosto último, antes da atual crise ganhar força, 55% dos brasileiros acreditavam que iriam consumir mais e melhor no futuro. Este mês, o índice caiu pela metade, para 26%. Por outro lado, o número de pessimistas dobrou no mesmo período. Subiu de 15% para 31%. Em 2002, com as incertezas da eleição do governo Lula e o dólar chegando a R$4, apenas 17% das pessoas achavam que a vida ia piorar, contra 56% dos otimistas.

Segundo Ivani Rossi, diretora de planejamento da TNS, a forte retração na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) e os cortes na produção feitos pelas empresas têm um impacto psicológico negativo. Ivani revela que 56% das pessoas acreditam que o país será totalmente afetado pela crise mundial.

51% não vão se endividar em 2009

- O consumidor está reagindo a todos os sinais. As famílias da classe C são as mais pessimistas. Eles (49%) acham que mesmo o Lula tendo boa vontade não vai conseguir conter a influência externa. E, em todas as entrevistas, o medo do desemprego é o que faz o brasileiro frear o seu consumo e apertar o cinto. O momento é de suspensão - diz Ivani.

Para o economista Claudio Goldberg, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), a pesquisa mostra uma tendência, pois todos estão preocupados com o emprego e a desaceleração da economia. O resultado, continua, é um gasto menor e o pagamento de dívidas. Segundo a TNS, entre os que já sabem o destino do décimo terceiro salário, cerca de 14% vão quitar os financiamentos pendentes. Além disso, 51% planejam estar menos endividados em 2009.

- O Natal deste ano será a primeira data afetada. As pessoas vão comprar itens mais baratos. Televisões digitais e carros serão cortados da lista. Ninguém quer assumir novas dívidas nesse momento de instabilidade - explica Goldberg.

O analista de marketing Rafael Nascimento comprova a pesquisa. Ele já cancelou a viagem para a Itália que faria em 2009 e suspendeu a compra de um carro financiado. No Natal, pretende gastar 40% menos:

- O momento é muito incerto. É hora de poupar. Não há como comprar nada parcelado neste momento de incertezas e alta nos juros.

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central (BC) e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), prevê fim de ano sem alta nas vendas. Os negócios serão afetados pela alta do dólar, que pulou de R$1,70 para R$2,30.

- Este ano, não será o Natal dos importados. O consumidor está com medo de comprar, pois percebeu que as empresas abriram menos vagas.

Antônio Cesar Carvalho, da Acomp Consultoria, diz que há um efeito manada, pois as famílias já traçaram suas expectativas para 2009:

- No início do ano há de impostos e despesas que terão de ser pagas. E a satisfação pessoal, com presentes e viagens, ficará em segundo plano.

Ivani, da TNS, diz que as empresas terão de ser criativas para estimular as vendas. A executiva lembra que em outubro as lojas já estavam decoradas para o Natal. O objetivo é criar um clima para as compras. Nas redes de departamento do país, a ordem é economizar. A estratégia já foi alterada: só serão abertas lojas em mercados onde a marca é conhecida. O objetivo é evitar gastos em marketing.

Grifes como Cantão e Uncle K cancelaram a compra de vários itens de seus fornecedores. Não querem ficar com o estoque cheio. A Granado vai lançar colônias da marca Phebo para este Natal por preços mais acessíveis. Roni Argalji, presidente da Duloren, lembra que qualquer empresário lúcido está vivendo apenas o dia-a-dia:

- Os bancos só fazem linhas de crédito de um mês. Acabou a antecipação de até 120 dias. - afirma. – Por Bruno Rosa – O Globo

Um comentário:

Anônimo disse...

Maravilha de matéria. Somos os idiotas da palavra.

O que me chama mais atenção nos dias de hoje, é a falta de valor que a palavra empenhada tem. Isto não está só nos meios políticos, as pessoas comuns estão exatamente se comportanto assim: novilíngua e o duplipensar de George Orwell parecem ter se instalado e se enraizado nesse mapa das palavras.

"Ninguém mais leva a sério a palavra solenemente empenhada, pois ela vale nada ou quase nada."

Os que foram educados a cumprir com a palavra, precisam se adaptar a esse mundinho sem valor. Melhor não valorizar quem fala, só aquele que faz. Tá difícil viver, e conviver quando sabemos que somos os últimos a considerar a "palavra" um documento.