SUSANNE KOELBL
A derrota foi comemorada como se fosse uma vitória. O ministro-chefe da fronteiriça província Noroeste saudou a delegação local do Taleban. Os líderes do Taleban, com as suas barbas longas e turbantes, vieram até o gabinete do governador para assinar um tratado. Após chegarem em grandes limousines, os homens sentaram-se em cadeiras revestidas de veludo e comeram alimentos que lhes foram servidos em bandejas de prata.
A seguir, os religiosos inimigos do governo de Islamabad receberam como presente um cobiçado pedaço do Paquistão.
Segundo o acordo, que os homens e o governador assinaram com bastante cerimônia, o Taleban terá permissão para implementar a sua interpretação da lei islâmica, ou sharia, no Vale Swat e outros distritos adjacentes no sopé dos Himalaias. "Hoje é um dia histórico", disse Amir Haider Khan Hoti, o ministro-chefe do governo provincial, procurando nitidamente dar uma conotação positiva ao fato de o Taleban estar assumindo o poder. "Uma antiga demanda do povo foi atendida. A nova regulação proporcionará um sistema legal mais eficiente".
Foi uma mentira descarada. A maioria dos paquistaneses encontra-se chocada diante da perspectiva de que, no futuro, no Vale Swat, ladrões possam ter as mãos decepadas como punição pelos seus crimes.
Céu azul e fanáticos
O Vale Swat na região de Malakand, com as suas pistas íngremes de esqui e hotéis elegantes, já foi uma das maiores atrações turísticas do Paquistão. O céu vasto tem quase sempre uma tonalidade azul clara, e as montanhas nevadas parecem estar tão perto que tem-se a impressão que é possível tocá-las. O Vale Swat, que fica apenas 250 quilômetros ao norte da capital, Islamabad, já foi um refúgio para os moradores ricos da cidade, que vinham até aqui para desfrutar o ar fresco e limpo ou para caminhar ao longo dos riachos das montanhas e pelos bosques de damasqueiros.
Os moradores do vale pouco têm em comum com o fanático Taleban. No ano passado, por exemplo, os cidadãos da região retiraram os islamitas do poder em uma eleição, e a maioria esmagadora dos eleitores votou no semi-secular e liberal Partido Nacional Awami. Mas eles foram novamente deixados nas mãos do Taleban, com o consentimento do exército e do presidente paquistanês Asif Ali Zardari.
A notícia da tomada de poder no Vale Swat pelos islamitas radicais foi tão alarmante para o resto do mundo quanto foi para muitos paquistaneses. Richard Holbrooke, o novo enviado especial dos Estados Unidos para a região, estava na Índia - ele tinha acabado de deixar o Paquistão após completar a sua primeira visita oficial ao país - quando recebeu a notícias "aterradora". Segundo Helbrooke, a vitória do Taleban demonstra que a Índia, o Paquistão e os Estados Unidos enfrentam um inimigo comum "que representa uma ameaça direta às nossas lideranças, às nossas capitais e aos nossos povos". No momento em que pressiona com sucesso crescente as tropas norte-americanas e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) no Afeganistão, o Taleban deve sentir agora que a repressão e o terror contra a população e os soldados do exército do Paquistão farão com que obtenham mais ganhos.
Nesta semana, o chefe do exército paquistanês, Ashfaq Parvez Kayani, e o ministro das Relações Exteriores do Paquistão, Shah Mehmood Qureshi, estão se reunindo com autoridades dos Estados Unidos em Washington como parte de conversações que devem servir de base para uma revisão da política norte-americana no Afeganistão. A situação no Paquistão desempenha um papel fundamental para esta política.
Em Islamabad, o presidente Zardari procurou minimizar a derrota, observando que o acordo com os radicais exige que estes abandonem as suas armas. Mas ninguém acredita nisso. Até mesmo as autoridades governamentais na região afetada admitem que "o Taleban está usando o cessar-fogo para rearmar-se". Na terça-feira (24/02), militantes do Taleban anunciaram que prorrogarão indefinidamente o cessar-fogo que deveria expirar nesta quarta-feira no Vale Swat , a fim de possibilitar que haja mais tempo para as negociações de paz com o governo. Mas um morador de Mingora suspeita que o único propósito do Taleban é evitar que as suas tropas sejam desarmadas.
Na verdade, o Paquistão, uma potência nuclear, abriu mão da sua soberania em uma parte importante do país.
O outrora idílico Vale Swat encontra-se em estado de guerra desde 2007. As forças armadas enviaram 12 mil soldados para a região em uma tentativa de conter a influência dos extremistas, que decapitaram 70 policiais, proibiram a educação de garotas e destruíram centenas de escolas no vale.
Os confrontos resultaram em um grande derramamento de sangue, incluindo a morte de pelo menos 1.200 civis e 180 soldados paquistaneses. Mas o resultado dessas operações militares foi fatal para o governo. Atualmente, o Taleban controla mais de 80% da região de Malakand. Há um ano o grupo controlava apenas um punhado de aldeias.
Os civis viram-se imprensados entre os combatentes. "O exército nos ordenou que deixássemos a aldeia antes do combate, mas o Taleban nos obrigou a ficar", relata um agitado proprietário de hotel, falando por telefone de uma vila próxima a Malam Jabba, que no passado foi uma popular estação de esqui. Assim como os 10 mil outros refugiados da região, ele encontrou abrigo temporário entre os parentes, mas pretende deixar a área assim que for possível. Segundo o dono de hotel, uma quantidade cada vez maior de moradores do Vale Swat está se submetendo ao Taleban em um esforço para sobreviver.
Muitos alegam até que as forças armadas pouparam deliberadamente a liderança do Taleban para evitar provocar ainda mais a animosidade do grupo em relação aos próprios militares e ao governo. Outros acreditam que as forças de segurança são simplesmente fracas demais para derrotar os 3.000 extremistas armados. Provavelmente as duas explicações são corretas. Os militantes instalaram o seu regime na região montanhosa após terem sido expulsos do Afeganistão em 2001.
Espionando traidores
Depois que o sol se põe no Vale Swat, pequenos grupos de homens entram na casa de Khalil Mullah. Os visitantes são espiões do Taleban, e eles vieram para informar a Khalil - cujo nome significa "amigo" em árabe - quem desrespeitou as leis de Alá na região que controlam. Eles denunciam quem foi visto dançando com alegria excessiva, raspou a barba, cometeu adultério ou expressou simpatia pelo governo de Islamabad - resumindo, quem é traidor.
Khalil Mullah dá início ao seu programa diário de rádio, na FM 91, uma estação radiofônica do Taleban, por volta das 20h. Os moradores do platô coberto de neve escutam a transmissão religiosa de Khalil para ouvir os nomes que ele lê no final. Atuando simultaneamente como juiz e promotor, ele anuncia os nomes daqueles que terão que responder a um tribunal da lei sharia do Taleban - e os daqueles que já foram sentenciados.
Os corpos desses infelizes moradores podem ser encontrados na manhã seguinte na praça do mercado em Mingora. Os cadáveres ficam dependurados pelas pernas, com as cabeças decepadas e colocadas sobre as solas dos pés, como forma suprema de desonra para os mortos. Uma nota afixada a cada corpo diz: "A mesma pena aguarda aqueles que ousarem remover ou enterrar esses espiões e traidores".
Os extremistas são liderados por Maulana Fazlullah, 33, um auto-proclamado clérigo que já trabalhou como operador de um elevador de estação de esqui. O povo de Malakand chama-o apenas de "o mulá-rádio". Foi Fazlullah que colocou pela primeira vez a rede terrorista nas ondas de rádio.
Nas suas transmissões, ele prometia mais eficiência e justiça para cidadãos desapontados com a corrupção e as letárgicas autoridades paquistanesas. Mas a estação transformou-se rapidamente em uma espécie de governo paralelo. Na transmissão de cada dia, os guerreiros religiosos de Fazlullah decretam novas regras que refletem uma interpretação própria da sharia. As mulheres já estão proibidas de ir aos mercados, sob pena de serem mortas, e as meninas não podem mais frequentar as escolas. Os policiais que obedecerem ordens de Islamabad arriscam-se a terem as orelhas decepadas ou a serem assassinados. Cerca de 800 policiais já desertaram para ingressar no Taleban.
A lista de morte não faz distinção de classes e inclui pessoas de todos os estilos de vida. As vítimas do Taleban incluem barbeiros, professores, líderes tribais, pregadores e clérigos mais liberais que se opõem a Fazlullah.
Negando a realidade
Os políticos em Islamabad há muito se auto-iludem quanto à extensão do poder já obtido pelo Taleban paquistanês. Em uma recente entrevista à rede de televisão norte-americana CBS, Zardari admitiu ter sido iludido quanto à magnitude dos problemas do norte do país. "Todos estavam negando a realidade, afirmando que o Taleban era fraco e que não conquistaria o poder - e que não seria capaz de representar um desafio para nós", disse ele à estação.
A constatação amarga de Zardari é consistente com o quadro que Mike McConnel, ex-diretor da Agência de Segurança Nacional (NSA, agência de inteligência dos Estados Unidos especializada em interceptação de sinais e comunicações em todo o mundo), percebeu quando visitou o Paquistão. Ele reuniu-se diversas vezes com lideranças militares em Islamabad no ano passado. Durante uma dessas reuniões, um general paquistanês de duas estrelas lhe disse porque o exército, que sempre foi o poder político dominante no Paquistão, atende às exigências dos políticos para que combata o Taleban e, ao mesmo tempo, apoia secretamente o grupo.
Os oficiais militares não esperam que os Estados Unidos permaneçam muito tempo no Afeganistão. Eles temem que a Índia ocupe o vácuo de poder que será deixado quando as tropas norte-americanas se retirarem. Por esse motivo, os paquistaneses não estão dispostos a abrir mão dos seus vínculos com a oposição afegã, que é o Taleban. Em um livro recém-lançado sobre os desafios políticos que o presidente Barack Obama herdou, o repórter do "New York Times", David Sanger, cita o general paquistanês de duas estrelas, que afirmou: "Nós temos que apoiar o Taleban".
As forças armadas paquistanesas continuam mais preocupadas com um conflito com a Índia do que com o terror islamita doméstico. Como resultado, elas aceitam a talebanização como um mal necessário, permitindo, por exemplo, mudanças radicais, como o fato de as mulheres não serem mais aceitas como freguesas em restaurantes ou lojas de roupas - até mesmo em Lahore, uma grande cidade liberal, que abriga diversos intelectuais. "A influência dos extremistas está sendo ignorada, e espalha-se como um vírus", observa Gregor Enste, diretor da Fundação Heinrich Boell em Lahore.
Apesar da imposição da lei sharia, muitos cidadãos da cidade de Mingora, no Vale Swat, comemoraram nas ruas e trocaram doces de presente. Após o derramamento de sangue dos últimos meses, eles estavam felizes por ver a paz restaurada na região, sob qualquer circunstância.
O chefe de negociações do Taleban, o islamista Sufi Mohammed, 77, é sogro de Maulana Fazlullah, o novo e brutal governante do Vale Swat. Sufi Mohammed começou agora a viajar pelas aldeias com a sua denominada caravana da paz, para comemorar o triunfo da sharia sobre a lei secular. O governo em Islamabad espera que o sogro um pouco menos radical exerça uma influência moderadora sobre Fazlullah, que é sedento de poder.
Mas não há motivos para se ter muita esperança. Como todos os islamitas, Sufi Mohammed é também um inimigo declarado da democracia, que ele sempre viu como um sistema que "foi imposto pelos infiéis". Durante a sua última peregrinação pelo Vale Swat, ele explicou várias vezes: "O verdadeiro islamismo não permite nem eleições nem democracia".
Zulfiqar Ali, em Peshawar, e Sayed Irfan Raza, em Islamabad, contribuíram para esta reportagem.
- DER SPIEGEL -Tradução: UOL – 25/02/2009
Curvando-se para o Taleban
O Paquistão está capitulando perante o Taleban no pitoresco Vale Swat, onde os islamitas pretendem introduzir a lei sharia. Agora o triunfo dos militantes ameaça encorajar radicais por toda a região.
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2 comentários:
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Eu me envergonho da elite brasileira. Vocês do DEM e da UDR são uma piada pronta. Ainda bem que estão cada vez mais isolados e fracos politicamente. As pessoas racionais, altruÃsta e com vontade de constrir algo verdadeiramente positivo vencerão.
São mensagens que o MOVCC recebe dos petistas e desenganados sobre a CURA.
Eles se acham pessoas "racionais". São os nossos TALEBANs daqui. Comem Seres humanos desossados com farofa, por isto, consideram-se fortes politicamente corretos.
Esse defunto sem vergonha sai das entranhas do inferno e vem arrotar seu bafo de estrume aqui no Blog, torrar nosso sapiquá.
Logo mais teremos a CPI da CAMISINHA, aquela produzida da Reserva de Chico Mendes, que o Lula anda esparramando sobre o Brasil. TEM SAFADEZA NISTO, AH SE TEM.
Me envergonho desses vagabundos, bandidos, que estão FUD**NDO com nosso país.
O Brasil ainda vai se reerguer, se livrar desses parasitas, dessa escória.
AINDA VAMOS TER O ENORME PRAZER DE VÊ-LOS TODOS ATRÁS DAS GRADES. VAGABUNDOS!
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