Obama dá oxigênio a Chávez

ANTONIO CANÕEl País

Por vontade ou por negligência - mais provavelmente pelo segundo motivo -, o governo de Barack Obama lançou um importante balão de oxigênio para Hugo Chávez e condicionou seriamente sua política para a América Latina antes inclusive de tê-la definido.

Na semana passada, em meio ao turbilhão de acontecimentos que são vividos diariamente em Washington, o porta-voz do Departamento de Estado aprovou em termos inequívocos o referendo realizado no domingo anterior na Venezuela. "O referendo ocorreu dentro de um processo totalmente democrático... Foi um processo plenamente consistente com as práticas democráticas", declarou Gordon Duguid.

Diante da insistência de alguns jornalistas sobre se a permanência indefinida de Chávez no poder poderia ser considerada de acordo com as práticas democráticas, o porta-voz disse que não tinha opinião a respeito, mas deu a impressão de não opor demasiada objeção. "Nós, nos EUA, temos limites para os mandatos, mas essa é a nossa prática", declarou.

A prioridade urgente de outros assuntos fez que essa declaração, que representa uma virada de 180 graus na política que os EUA mantinham até o momento em relação à Venezuela, fosse ignorada pela mídia americana. Mas não pelas autoridades venezuelanas, que se vangloriaram de seu enorme sucesso diplomático, nem por alguns colunistas conservadores, que a tomaram como exemplo dos desastres que nos dará a política externa de Obama.

Alguns especialistas em Washington não quiseram no início dar às palavras de Duguid um grande significado, porque as atribuíram à improvisação e à ignorância. Certamente, outros altos funcionários haviam se expressado em particular poucos dias antes em termos muito contundentes contra Chávez. O próprio Obama, durante sua campanha e em suas várias referências à América Latina, deixou clara sua firme oposição ao presidente Chávez.

Mas nem Obama nem qualquer membro do governo falou desde que o porta-voz do Departamento de Estado declarou sua posição sobre o referendo, e hoje deve-se entender, portanto, que essa é a posição oficial do governo americano. Quer dizer, que Obama não questiona de modo algum a legitimidade do regime venezuelano nem de seu dirigente máximo, apesar das denúncias de membros da oposição e de organismos de direitos humanos sobre a intimidação, perseguição e restrição constantes dos espaços democráticos nesse país.

O julgamento seria levemente mais benévolo se essa nova política em relação à Venezuela fosse fruto unicamente da incapacidade e do desinteresse deste governo a reagir a uma crise em uma região que ficou claramente relegada a um segundo plano.

Obama começou sua rodada de visitas internacionais no Canadá, e não no México, como fizeram vários de seus antecessores. O Canadá é o principal parceiro comercial dos EUA, mas o México é uma bomba-relógio de tamanho semelhante ao Irã.

A nova secretária de Estado, Hillary Clinton, estreou em um giro pela Ásia, cuja relevância mundial é evidente, e suas primeiras decisões foram nomear enviados especiais para o Oriente Médio, o Paquistão e o Afeganistão, indicando claramente as preocupações centrais do governo.

Enquanto isso, nem sequer se resolveram as dúvidas sobre quem ficará à frente da política latino-americana no Departamento de Estado. Por enquanto, ficou o que estava, Thomas Shannon, um profissional rigoroso que soube consertar muitos dos erros da política de George W. Bush para a região. Mas parece pouco provável que continue lá depois da cúpula americana de abril, sobre a qual se pode apostar em quantos novos funcionários da Casa Branca sabem sequer o local do evento. Contam-se nos dedos de uma mão, seguramente.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves – UOL-Notícias



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