Investigação mostra que empresas participaram da elaboração de editais para diminuir a concorrência e combinaram lance vencedor
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL
Ao menos cinco grandes obras da Petrobras licitadas no governo Lula foram alvo de acordos e manobras clandestinas de empreiteiras que resultaram num custo adicional de R$ 1,4 bilhão para a estatal.
O superfaturamento foi constatado por peritos da Polícia Federal a partir de documentos apreendidos em cinco operações desde 2008.
Técnicos da PF descobriram que construtoras participaram indiretamente da elaboração dos editais, de maneira a restringir a quantidade de concorrentes, e combinaram previamente o lance vencedor dos certames. Em um dos casos, o acerto incluiu também a divisão "por fora" da execução do projeto e do sobrepreço imposto à petrolífera. Folha Online
Desde o início de março, a Folha publica uma série de reportagens a respeito de "consórcios paralelos" montados por empreiteiras em todo o país para repartir contratos públicos à margem do resultado das licitações. Em volume de recursos, os casos relacionados à Petrobras são, de longe, os maiores até agora identificados. Os valores contratados pela estatal somam R$ 5,88 bilhões.
Referem-se aos seguintes empreendimentos: Unidade de Tratamento de Gás de Caraguatatuba, Unidade de Coque da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), Refinaria do Nordeste, Refinaria do Vale do Paraíba (Revap) e Unidade Termelétrica de Cubatão.
Entre as empresas participantes do conluio, de acordo com os documentos da PF, estão a Camargo Corrêa e a GDK, protagonista de um escândalo envolvendo a Petrobras e o então secretário-geral do PT, Silvio Pereira, em 2005.
Ele recebeu um carro Land Rover, avaliado em R$ 73,5 mil, do dono da GDK. O episódio foi investigado na ocasião pela CPI dos Correios, que considerou a doação "um caso exemplar de tráfico de influência".
A participação da construtora baiana GDK se deu na licitação da unidade de Caraguatatuba (SP). Em uma primeira disputa, realizada em 2006, a GDK havia apresentado a menor proposta, com valor de R$ 988 milhões. Mas ela não foi qualificada. Nenhuma empresa foi, levando a Petrobras a fazer nova concorrência no ano seguinte.
Da segunda vez, a GDK não participou. O consórcio vencedor, composto por Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e IESA, deu um lance de R$ 1,462 bilhão -R$ 474 milhões acima do oferecido pela GDK no ano anterior. Posteriormente, após negociação imposta pela Petrobras, o valor do contrato caiu para R$ 1,395 bilhão.
A empreiteira baiana, contudo, deixou a concorrência apenas oficialmente. Por fora, de acordo com a PF, a GDK levou 20% do empreendimento.
Os peritos da polícia encontraram também, na sede da Camargo, uma proposta individual da empreiteira para a mesma licitação, com valor de R$ 1,263 bilhão -R$ 200 milhões a menos do que o lance vencedor.
Ou seja, quando a GDK se retirou oficialmente, e a Camargo se associou às demais construtoras, a proposta vencedora aumentou consideravelmente. A PF acredita que o valor do lance tenha sido acertado antes da formação do consórcio.Numa análise detalhada do contrato de Caraguatatuba, os peritos identificaram superfaturamento de R$ 351 milhões -33,65% a mais no valor total.
No projeto das unidades da Repar ocorreu algo semelhante. Um consórcio liderado pela Camargo Corrêa, do qual fez parte a Promon, venceu a concorrência com lance de R$ 2,488 bilhões.
Também nesse caso, a Polícia Federal encontrou uma proposta individual da Camargo, com valor de R$ 2,261 bilhões -mais uma vez, com a redução da competição, o lance vencedor aumentou. Além disso, a perícia constatou um superfaturamento na obra no valor de R$ 655 milhões.
Privilégio
Tanto nas unidades de Caraguatatuba quanto na Repar e em outras duas obras da Petrobras (Revap e UTE de Cubatão), os peritos constataram que a CNEC Engenharia, braço da Camargo Corrêa até janeiro deste ano, foi responsável pela elaboração dos projetos básicos dessas obras constantes dos editais das licitações.
Assim, de acordo com os técnicos da polícia, a Camargo Corrêa e seu grupo passaram a ter informações privilegiadas, prejudicando a competitividade dos certames. Na Revap, UTE de Cubatão e na Refinaria do Nordeste, o superfaturamento constatado pelos peritos somou R$ 405 milhões.
O esquema dos "consórcios paralelos" foi identificado pela PF, CGU e TCU em diversas obras importantes do país, como os metrôs de Rio, Brasília, Fortaleza, Salvador e Porto Alegre e a BR-101. As investigações, porém, estão suspensas por determinação do Superior Tribunal de Justiça.
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