É inaceitável que o fisco postergue para depois do pleito as conclusões sobre o vazamento de dados fiscais para confecção de dossiê
O secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, afirmou anteontem, perante senadores da República, que servidores do órgão por ele chefiado acessaram "por cinco ou seis vezes" as declarações de Imposto de Renda do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira. Os acessos, por meio de computadores, exigem o conhecimento de senhas eletrônicas, e teriam sido efetuados de algum ponto fora de Brasília.
No dia 12 de junho, esta Folha revelou que dados fiscais sigilosos do tucano constavam de um dossiê elaborado pelo chamado "grupo de inteligência" da pré-campanha de Dilma Rousseff. Os indícios eram de que o vazamento ocorrera no âmbito da Receita.
No início daquele mês haviam se tornado públicas uma nebulosa coleta de informações, por parte de petistas, que se voltaria até mesmo para atividades de pessoas da família do ex-governador paulista José Serra.
Sob pressão, a candidata e o PT negaram com veemência que algo nesse sentido tivesse partido de suas fileiras, àquela altura já às voltas com uma crise interna. Como de costume, seguiu-se o coro de um séquito de bajuladores e militantes exacerbados, que tratou de atribuir as notícias do "pseudodossiê" a uma "armação da mídia golpista", em conluio com o postulante do PSDB. O objetivo seria atingir o nome ungido pelo mais ativo e poderoso cabo eleitoral do país -o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Não é demais lembrar que pessoas vinculadas ao PT já haviam tentado montar um dossiê para atacar Serra em 2006. Foi o próprio presidente Lula quem batizou aqueles "companheiros" de aloprados. Agora, confirma-se oficialmente a violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge, como já haviam mostrado os documentos obtidos pelo repórter Leonardo Souza, da Folha.
Não são apenas evidências de incompetência e incúria que pesam, mais uma vez, sobre a Receita. As declarações do sr. Cartaxo à Comissão de Constituição e Justiça do Senado, acerca do andamento das apurações, deixaram no ar dúvidas sobre uma indesejável -e, esperemos, inexistente- manipulação política dos prazos com vistas a proteger Dilma Rousseff e o grupo de arapongas.
Diante da gravidade do fato, era de esperar uma ação rápida e eficaz das autoridades para esclarecer o caso. Tratando-se de um delito associado a pessoas a serviço de uma ex-ministra transformada em candidata à sucessão presidencial, não é aceitável que a conclusão do inquérito seja postergada para depois do pleito.
Não há dúvida de que os suspeitos têm direito à ampla defesa e a não ver suas reputações ameaçadas de maneira indevida e leviana. Há no entanto documentação e tempo suficientes para que a investigação produza resultados antes da eleição. Não é um caso trivial. Estão em jogo as próprias garantias que o Estado tem o dever de oferecer -e não sonegar- aos seus cidadãos.
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